O Supremo Tribunal Federal (STF) retomará os trabalhos em agosto com uma lista de processos importantes na área do direito do trabalho que podem intensificar o embate entre Judiciário e Legislativo devido à intervenção de ministros em temas que o Congresso trata de omissão.
Um dos processos que devem ser instaurados é a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO 73), que aponta a demora do Congresso Nacional em regulamentar o dispositivo da Constituição Federal que confere aos trabalhadores urbanos e rurais o direito social à proteção em decorrência de automação. A ação foi distribuída ao ministro Luís Roberto Barroso, presidente do STF.
Na ação, movida pelo então procurador-geral da República, Augusto Aras, aponta-se que, decorridos mais de 30 anos da promulgação da Constituição Federal, nenhuma lei federal que regulamente o artigo 7º, inciso XXVII, do texto constitucional foi ainda não foi publicado. , apesar de terem sido apresentadas diversas propostas legislativas sobre o tema. Diante disso, ele pede ao Supremo que declare inconstitucional a omissão do Legislativo e estabeleça um prazo razoável para que este edite uma norma federal sobre o assunto. O julgamento está previsto para começar em 21 de agosto.
Segundo o advogado Felipe Fernandes Pinheiro, doutorando e mestre em direito do trabalho, pesquisas apontam o potencial devastador para os trabalhadores da Indústria 4.0. Segundo estudos do Fundo Monetário Internacional (FMI), o processo de automação, especialmente por meio da implementação de inteligência artificial generativa, impactará cerca de 40% dos empregos em todo o mundo e terá dois efeitos imediatos: aumento da produtividade e ampliação das desigualdades sociais. “O tema é relevante o suficiente para abranger com urgência qualquer movimento do Legislativo”, acredita. “O Estado, seja pelo seu papel ontológico de garante do bem-estar social, seja pelo seu expresso dever constitucional de proteger as relações de trabalho contra a automação, não pode fugir à sua responsabilidade de conciliar os interesses do capital e do trabalho e estabelecer condições de vida dignas para os trabalhadores. trabalhadores e condições de vida prósperas para os empresários”, acrescenta.
Felipe Pinheiro ressalta que a omissão legislativa em matéria trabalhista não é novidade. “A mais emblemática delas refere-se à comumente criticada multa de 40% do FGTS, cujo percentual original de 10% previsto na Lei nº 5.107/66 que a introduziu foi aumentado quatro vezes pelo artigo 10, inciso I, da Lei das Disposições Transitórias Constitucional até a promulgação de lei complementar que trata da proteção contra demissão arbitrária prevista no artigo 7º, inciso I da Constituição Federal. Por se tratar de dispositivo constitucional ‘transitório’, surpreende que ainda rege as relações de trabalho no Brasil.” , explica.
O STF também deve retomar o julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI) 5.826, 5.829 e 6.154, que questionam dispositivos da reforma trabalhista (Lei 13.467/2017) que criou o contrato de trabalho intermitente. O ministro Edson Fachin propôs declarar a norma inconstitucional. Segundo ele, a imprevisibilidade nesse tipo de relação de trabalho deixa o trabalhador em situação de fragilidade e vulnerabilidade social. A ministra Rosa Weber o acompanhou com ressalvas. O julgamento estava sendo realizado em plenário virtual, mas foi transferido para o plenário, graças a um importante pedido do ministro André Mendonça.
A reforma trabalhista regulamentou, na Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), o contrato de trabalho intermitente. Este tipo de prestação de serviços, com relação de subordinação, alterna períodos de prestação de serviços e inatividade, que podem ser determinados em horas, dias ou meses. A regra vale para todas as atividades, exceto para os aeronautas, que são regidos por legislação própria.
A ADI 5826 foi protocolada pela Federação Nacional dos Empregados nos Postos de Combustíveis e Derivados de Petróleo (Fenepospetro); ADI 5829, da Federação Nacional dos Trabalhadores nas Empresas de Telecomunicações e Operadoras de Central Telefônica (Fenattel); e a ADI 6154 foi apresentada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores Industriais (CNTI). As entidades sustentam, entre outros pontos, que o contrato intermitente torna o vínculo empregatício mais precário e funciona como desculpa para o pagamento de salários inferiores ao mínimo garantido constitucionalmente.
Para a Advocacia-Geral da República (AGU), o trabalho intermitente não buscou aumentar o nível de emprego em detrimento dos direitos dos trabalhadores que têm emprego. Falando no processo, em 2020, o então procurador-geral da República, José Levi, sustentou que, em vez de precarizar as relações de trabalho, a norma buscou legalizar uma alternativa ao trabalho informal e possibilitou retirar mais de 500 mil pessoas da informalidade desde entrou em vigor. A Procuradoria-Geral da República (PGR) também se manifestou pela constitucionalidade da norma.
Pedro Maciel, advogado trabalhista sócio da Advocacia Maciel, mestre em Direito das Relações Sociais e do Trabalho, argumenta que o trabalho intermitente, desde a sua inclusão com a reforma trabalhista, tem sido alvo de inúmeras críticas da doutrina e da jurisprudência. “Muitos, inclusive os autores das ADIs em questão, lutam pela sua declaração de inconstitucionalidade. Meu ponto de vista se alinha com o da AGU, de que, na realidade, o objetivo do trabalho intermitente nunca foi criar novos empregos, mas sim regularizar uma situação que já existe há algum tempo no nosso país”, afirma.
Mas defende que o contrato de trabalho intermitente não deve, na sua opinião, ser julgado inconstitucional. “O objetivo desse tipo de contrato não é ser a única fonte de renda de um indivíduo, mas sim uma alternativa. Foram criados direitos para os trabalhadores que sempre trabalharam no famoso ‘gig’. tipo de contrato o contrato não deve ser julgado inconstitucional O resultado do julgamento ainda é incerto. Porém, quem defende a inconstitucionalidade do contrato o reconhece como se fosse uma fonte única de renda, que, a meu ver, nunca foi sua. objetivo”, avalia.
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