O Comitê de Política Monetária (Copom), do Banco Central, e o Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc), do Banco Central Americano, decidem, nesta quarta-feira (31/7), o futuro de suas taxas de juros. Apelidada de “Super Quarta-feira”, quando coincidem as reuniões das autoridades monetárias, há consenso entre os analistas de mercado de que ambas as decisões serão de manutenção dos juros.
No Copom, a expectativa é que a diretoria opte por manter a taxa básica de juros (Selic) no patamar atual, de 10,50% ao ano. Porém, não está totalmente descartada a possibilidade de o BC subir novamente os juros neste ano. O agravamento da situação fiscal, que continua, é um dos factores que poderá contribuir para esta conta de maior risco de subida das taxas de juro.
No radar dos analistas, ainda está a piora do cenário alternativo para a inflação em 2025, que aumentou inclusive em relação à última reunião do Copom, passando de 3,10% para 3,50%, mesmo com os juros no mesmo patamar. Algumas estimativas de mercado apontam para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) para 2025 acima de 4%.
Embora o cenário externo seja mais favorável que na reunião anterior, o cenário interno é mais incerto. Além da piora da situação fiscal, mesmo com o governo anunciando uma redução de R$ 15 bilhões nas despesas no Orçamento deste ano, a prévia da inflação oficial, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo 15 (IPCA-15) de julho, tem já apresentou aumento de 0,30%, acima do esperado. No acumulado de 12 meses acelerou para 4,45%, próximo ao teto da meta de 4,50%.
Por isso, especialistas consultados pelo Correspondência ressaltam que as atenções do mercado estarão voltadas para o comunicado do Copom, que deverá ser mais duro que os anteriores e poderá sinalizar a condução da política monetária nas próximas reuniões. “Não podemos descartar a possibilidade de o BC aumentar a taxa de juros, pensando que o real ainda pode se desvalorizar frente ao dólar. Principalmente se passar acima de R$ 5,60 e se consolidar nesse patamar, os juros devem subir, sim”, destaca Tatiana Pinheiro , economista-chefe para o Brasil da Galápagos Capital.
Intercâmbio
Segundo o economista, a valorização do dólar está diretamente relacionada à piora da situação fiscal, já que os últimos dados das contas públicas confirmam a previsão do mercado de que o déficit primário do ano ficará acima da meta fiscal de 2024, que prevê um déficit zero com limite de até 0,25% do Produto Interno Bruto (PIB), ou seja, saldo negativo de até R$ 28,8 bilhões.
“O câmbio está intimamente ligado aos anúncios fiscais e o mercado sempre esperou um déficit primário de 0,80% do PIB para este ano, esse é o ponto. Foi difícil para o governo entregar déficit zero desde o início do ano” , destaca Pinheiro, que também prevê uma mudança no comunicado do Copom sobre o cenário de risco, que passará de simétrico para assimétrico, o que poderá confirmar a sinalização de que a janela está aberta para aumento dos juros.
Rodolfo Margato, economista da XP Investimentos, reforça que a assimetria no equilíbrio de riscos deve reduzir qualquer chance de corte nos juros por parte do Banco Central. “Esse equilíbrio de riscos, hoje, é assimétrico e isso é um driver apontando que a inflação deve atingir patamares mais elevados. Não é possível descartar alta da Selic até o final do ano, apesar de não ser nosso cenário base “, explica.
Na avaliação dele, existe esse risco, mas vai depender do comportamento do câmbio, pois o limite para uma discussão mais forte é se o dólar continuar subindo e ficar na casa dos R$ 5,80. “Se o câmbio ficar nesse patamar seria o limite para vermos uma discussão mais forte ou mesmo um sinal de aumento dos juros”, destaca.
Rafael Cardoso, economista-chefe do Banco Daycoval, destaca que, na perspectiva do Banco Central, o cenário futuro é mais adverso e, por isso, também vê uma probabilidade “não desprezível” de que o equilíbrio de riscos seja deslocado para o campo assimétrico, com viés de alta nas taxas de juros.
“Achamos que essa é uma possibilidade que está no radar, e o próprio Banco Central, em comunicado oficial, já deu a entender que isso foi discutido na reunião anterior. reunião da semana”, afirma. Para ele, o Banco Central continuará com uma posição de política monetária mais conservadora, “tentando ancorar as expectativas na meta e cumprir o seu objetivo”.
Segundo estimativas do economista-chefe do Banco Fator, José Francisco Lima Gonçalves, a taxa Selic não mudará de patamar até o primeiro trimestre de 2025, quando haverá três novos diretores no BC, incluindo o substituto do atual presidente, Roberto Campos Neto. “Depois depende das expectativas de inflação para 2026”, afirma.
“As condições gerais consideradas pelo Copom pouco mudaram desde a reunião de junho. O ambiente externo não piorou, embora continue incerto. os núcleos não ajudam muito. As expectativas, porém, continuam ancoradas e mais desancoradas em relação a junho”, acrescenta.
Paradoxalmente, Gonçalves pensa que “o Comité consegue ver uma situação melhor na área fiscal”. “Sabe-se que, via expectativas, a trajetória fiscal é crítica para as projeções de inflação e que isso se explica como uma visão unânime no Comitê. Por outro lado, o debate sobre o equilíbrio de riscos parece inevitável. Já houve debate sobre esse equilíbrio Considerando a ambiguidade dos dados recentes, o debate continuará a ser para um viés negativo, ou seja, mais risco de inflação”, explica. Ele lembra ainda que os juros futuros de um ano já estão 90 pontos-base acima da taxa Selic.
Dívida pública
Eduardo Velho, economista-chefe da JF Trust Gestora de Recursos, relata que existe uma correlação direta entre o aumento da dívida pública e a valorização do dólar. “A meta fiscal já foi perdida desde o início, portanto, como sabemos que o déficit vai ser maior, isso impacta a dívida pública e, portanto, o dólar continua valorizado. não há fluxo de entrada de capital, porque não há concessão e nem IPO em bolsa”, explica.
Pelos cálculos de Velho, o governo precisará reverter o buraco fiscal para um superávit primário (poupança para pagar os juros da dívida pública) de 2% do PIB para que a trajetória da dívida pública bruta comece a se estabilizar. “Nos últimos meses, a situação fiscal piorou e a arrecadação, mesmo tendo aumentado, não é suficiente para cobrir o aumento das despesas. Para piorar, o governo só quer aumentar a tributação, o que não adianta. tentar aumentar a alíquota, a arrecadação deverá cair, porque aumenta a sonegação”, acrescenta Velho.
“A inflação vem sinalizando pressão cambial e reajustes de combustíveis desde junho, dificultando que a inflação deste ano fique abaixo de 4%. Estamos projetando 4,2% e, no ano que vem, há grandes chances de a inflação ficar acima de 4%, já que bem”, destaca Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados.
Ele também não descarta a possibilidade de aumento da taxa Selic em reuniões futuras. “Será difícil o câmbio ficar abaixo de R$ 5,40 nos próximos meses, portanto, teremos um cenário de pressão cambial de forma mais permanente e será difícil repassar isso cada vez mais para os preços. veremos se a pressão do segundo semestre vai contaminar a inflação do ano que vem e fazer com que ela se afaste da meta, aí sim, haverá o risco do BC ter que subir a taxa de juros”, explica.
Novo quadro
Segundo ele, se o estresse entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o Banco Central aumentar, o risco de um cenário adverso tende a aumentar, principalmente se ele escolher diretores com perfil mais complicado. “O Banco Central ainda trará muita instabilidade no segundo semestre. O governo ainda não entendeu que o culpado pela permanência dos juros elevados não é o Banco Central, mas sim o Executivo e o Congresso, porque a política fiscal é pouco equilibrado. Infelizmente, há uma chance de vermos um cenário onde os juros poderão subir daqui para frente”, destaca.
Os analistas também destacam atenção ao comunicado do Fomc, que também deve estar no radar do Copom. Há expectativa de que o Banco Central Norte-Americano finalmente confirme as apostas de que o início do ciclo de corte dos juros, atualmente na faixa de 5,25% e 5,50% ao ano, poderá ser antecipado de dezembro para setembro.
Tatiana Pinheiro, de Galápagos, lembra que o mercado previa o início dos cortes de juros nos EUA, em dezembro, e que esse ciclo de flexibilização monetária poderia ser antecipado. Ainda assim, o cenário não deverá ser tão positivo para os países emergentes, como o Brasil. “O fluxo de capitais tende a se tornar mais criterioso e cada país emergente terá suas dificuldades com esse cenário de juros nos EUA ainda elevados por um período mais longo”, alerta.
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