Por Vinícius Maluly—
Amostra Hiromi Nagakura à Amazônia com Ailton Krenak Está em cartaz no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) desde 11 de junho e termina em 18 de agosto. Composto por fotografias do japonês Hiromi Nagakura e curadoria de Ailton Krenak e Angela Pappiani, traz uma coleção de fotografias realizadas em diversas viagens de ambos pela Amazônia na década de 1990, com foco em sete povos indígenas: os Yawanawá, os Ashaninka, os Yanomami, os Huni Kuin, os Kricatijê, os Gavião da Montanha e os A ‘uwê Uptabi – Xavante. As fotografias retratam as vivências e o cotidiano das pessoas, destacando a alegria, as tradições, a beleza, a sabedoria e suas características mais marcantes. Nas palavras de Krenak, uma beleza “que se destaca”.
Tomando emprestada a expressão do cineasta Sílvio Tendler, que fez o documentário Encontro com Milton Santos — O mundo global visto daqui, em 2006, acreditamos que a exposição hoje presente no CCBB retrata um Brasil “visto daqui” — ainda que através de lentes japonesas. A exposição, ao passar pelos sete povos, instrui o visitante a descobrir o seu próprio país através de um conjunto bem definido e coeso de fotografias e peças produzidas pelos próprios retratados. Uma experiência visual, tátil e auditiva, com acessibilidade através de descrições audiovisuais. A certa altura, as imagens e os artefatos se confundem, pois todos representam um Brasil que, nos grandes centros, muitas vezes se perde ou é esquecido. Um Brasil que celebra a vida e não a morte. Um Brasil que celebra a diversidade e não o esquecimento. Um Brasil que celebra a unidade e não a divisão.
Krenak afirma que hoje não seria possível fazer tais fotografias, considerando que elas antecedem a “ocupação violenta da área de mineração” e os “projetos de infraestrutura do próprio governo brasileiro”, como a hidrelétrica de Belo Monte. Há uma felicidade e uma expressão de amor nas fotografias que teriam se perdido desde então. Contudo, citemos o próprio escritor que, recentemente, em Futuro Ancestral, afirma que, “se há um futuro a ser considerado, esse futuro é ancestral, porque já esteve aqui” (2022). Esse Brasil, que já estava aqui nos tempos de Nagakuraé presente e é futuro — e é, necessariamente, ancestral, pois já existia na década de 1990 e continuará a sê-lo, mesmo que já não estejamos aqui.
O visitante se deparará com um lindo mosaico, cheio de vida e riquezas no coração da vida brasileira que é a Amazônia. Lembrará, junto aos Yawanawá, no Acre, nossa essência ritualística; com os Ashaninka, entre o Acre e o Peru, resistência e autonomia; com os Yanomami, no extremo Norte, sobrevivência e resiliência; com os Huni Kuin, na fronteira com o Peru, a identidade de quem é “real”; com os Kricatijé, no Maranhão, “bravura e doçura”; com Gavião da Montanha, memória e inspiração; com os Xavante, no Mato Grosso, a força da perseverança. Tudo entrelaçado pelo que significa ser brasileiro: resistir, sim, mas sem perder o encanto. Este é o poder revelado pelas fotografias de Nagakura.P
Por fim, o visitante é convidado a deixar-se levar por um mapa síntese, criado por Gustavo Caboco, denominado Território Imemorial ou Hiromi Nagakura à Amazônia com Ailton Krenak, 2023. O mapa não localiza apenas as pessoas retratadas no âmbito do Estado nacional brasileiro. O mapa expõe as contradições que compõem o nosso país, retratando, de forma intensa e delicada, a dialética entre a natureza e a sua destruição. As árvores e o gado. Peixe e mineração. Os rios e a Usina Tucuruí. Símbolos de um Brasil “visto daqui”. A posição do mapa, ao final da exposição, não poderia ser melhor, tendo em vista que propõe uma conexão construtiva das experiências cultivadas por trabalhos anteriores, instigando e embelezando, sem a falsa pretensão cartográfica de precisão, mas com o verdadeiro essência da espacialização.
Convidamos aqueles que ainda não tiveram oportunidade de visitar a exposição a fazê-lo nas próximas semanas. Em tempos agitados, acabamos esquecendo quem realmente somos. Um Brasil da década de 1990 ainda muito atual, que é essencialmente formado por povos originários, colocados cada vez mais às margens e fronteiras da suposta “civilização”. Porém, resistem e exaltam o que significa ser verdadeiramente brasileiro – sábio, ancestral e esperançoso.
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