Em discurso conjunto em Santiago nesta segunda-feira (5/4) ao lado do presidente do Chile, Gabriel Boric, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva falou brevemente sobre o impasse eleitoral na Venezuela.
“Expor [para Boric] as iniciativas que empreendi com os presidentes Gustavo Petro [Colômbia] e López Obrador [México] em relação ao processo político em Venezuela“, relatou Lula sobre o encontro com Boric no Palácio La Moneda esta manhã.
“O respeito pela tolerância, o respeito pela soberania popular é o que nos move a defender a transparência dos resultados. O compromisso com a paz é o que nos leva a apelar às partes ao diálogo e à promoção do entendimento entre governo e oposição”.
Bórico afirmou que só deverá abordar o assunto na terça-feira (8/6).
A convite do presidente chileno, Lula faz visita oficial ao país nesta segunda e terça-feira.
No início da agenda, pela manhã, Lula foi recebido com cerimônia de oferenda de flores no monumento a Bernardo O’Higgins e depois seguiu ao lado de Boric ao Palácio La Moneda, sede do Executivo chileno.
Os presidentes reuniram-se em privado e depois com ministros dos dois países, passando cerca de três horas no total.
A visita estava marcada para maio mas, com as enchentes no Rio Grande do Sul, foi cancelada e remarcada para agosto.
A reunião bilateral prevê a assinatura de cerca de 20 acordos e memorandos em diversas áreas. Portanto, a delegação que veio com o presidente brasileiro é grande: estão aqui 14 ministros, além do assessor especial da Presidência, Celso Amorim, que esteve na Venezuela na semana passada.
O Brasil continua nas negociações, na tentativa de mediar uma solução para a crise venezuelana, após o anunciado reeleição do presidente Nicolás Maduro sofrer desafios da oposição e de outros países, como Estados Unidos, Argentina e nações da União Europeia.
Segundo diplomata que atua nas negociações ouvido pela BBC News Brasil, o principal foco da diplomacia brasileira é a articulação com a Colômbia e o México para abrir o diálogo entre o governo e a oposição.
Ambos os países têm governos de esquerda que mantêm relações com a Venezuela. Com o Brasil, divulgaram nota nesta sexta-feira (2/8) oferecendo “apoiar os esforços de diálogo e a busca de acordos que beneficiem o povo venezuelano”, mas sem detalhar como isso aconteceria.
A intenção, disse a fonte entrevistada pela BBC News Brasil, é promover um encontro de alto nível entre os chanceleres dessas nações, ou mesmo entre os presidentes. Neste segundo caso, a reunião poderia ser virtual.
A principal dificuldade, porém, é convencer Maduro a participar neste diálogo, reconhece o diplomata. A oposição está mais aberta à negociação.
“É um trabalho longo, não há respostas rápidas”, destaca.
Apesar da resistência de Maduro, o Itamaraty entende que é fundamental manter uma posição equilibrada, para preservar um canal aberto com o governo venezuelano.
Na opinião desta fonte, reconhecer a vitória do candidato da oposição, Edmundo González, como fizeram os Estados Unidos, “não ajuda” a resolver o impasse que se estabeleceu após as eleições realizadas em 28 de julho.
Horas depois do final das eleições, o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) anunciou a vitória de Maduro, mas não publicou os registos eleitorais (resultados por tabela de votação), informação que teria permitido verificar se o balanço geral anunciado estava correto.
Segundo a contagem mais atualizada divulgada pela CNE, com 96,87% dos votos apurados, Maduro teve 51,95% dos votos contra 43,18% de Edmundo González.
A oposição realizou a sua própria contagem, que se basearia nos registos eleitorais recolhidos no encerramento das urnas. Na Venezuela, estes recibos são impressos no final da votação, o que serve para verificar os dados transmitidos à CNE.
Alegando se basear em 24.384 votos, cerca de 81,21% do total de urnas, a oposição afirmou que González venceu com 67% dos votos, contra 30% de Maduro.
No meio desta disputa, o governo brasileiro não reconheceu a vitória de Maduro nem as acusações de fraude da oposição. A postura brasileira tem sido a de exigir a divulgação das atas detalhadas pela CNE, assim como o México e a Colômbia.
O pedido de transparência na votação surgiu primeiro numa nota oficial do Itamaratyno dia seguinte à eleição.
Depois, O presidente Luiz Inácio Lula da Silva também cobrou as informações.
“É normal brigar. Como você resolve essa briga? Apresente a ata”, disse Lula em entrevista exclusiva à TV Centro América, afiliada da TV Globo em Mato Grosso, na semana passada.
A CNE afirma que o atraso na publicação foi causado por ataques de hackers ao seu sistema. No entanto, nenhuma evidência deste suposto ataque foi apresentada até o momento.
‘Sem minutos, o Brasil não reconhecerá Maduro’
Embora países importantes rejeitem a vitória de Maduro, o presidente venezuelano teve a sua reeleição reconhecida pelas grandes potências, como a China e a Rússia, dois fortes aliados do governo venezuelano. O atual presidente também recebeu apoio do Irã, da Turquia e da Bolívia.
Segundo o diplomata ouvido pela BBC News Brasil, não há perspectiva de o Brasil reconhecer a reeleição de Maduro sem apresentar ata e comprovar o resultado.
Na sua avaliação, se não houver mudança nesse cenário e Maduro permanecer no poder, o Brasil deverá manter uma relação pragmática com o governo venezuelano, mesmo sem reconhecer a reeleição, numa relação de “ambiguidade criativa”.
A fonte reconhece que hoje há pouca esperança de que a ata seja divulgada.
“Quanto mais demorar, menos você acha que vão entregar”, resume.
No desenvolvimento mais recente sobre esta questão, Maduro apelou na sexta-feira (2/8) ao Supremo Tribunal de Justiça da Venezuela (TSJ) solicitando uma auditoria para esclarecer “a verdade” sobre a eleição.
A Corte é vista como aliada do atual governo venezuelano, portanto, a oposição vê o apelo de Maduro como uma tentativa de ganhar tempo e receber um selo judicial para sua suposta vitória.
Após o recurso, o TSJ determinou que a CNE enviasse, no prazo de três dias, as atas das mesas eleitorais a nível nacional, a ata da totalização final do processo eleitoral, a ata da proclamação do resultado, além de provas do suposto ataque cibernético ao sistema eleitoral.
Brasil assume oficialmente embaixadas da Argentina e do Peru
A postura equilibrada do Brasil gerou desgaste para Lula, num cenário em que o governo Maduro desperta fortes críticas por parte do eleitorado brasileiro. Esse desgaste foi intensificado nota oficial do PT parabenizando Maduro pela reeleição.
Apesar disso, diplomatas brasileiros têm insistido na importância de manter aberto o canal com o governo venezuelano, para preservar os interesses brasileiros.
“Não é do interesse do Brasil ficar sem representação em Caracas, como aconteceu com a Argentina”, destaca outra fonte do Itamaraty.
Depois que a Venezuela rompeu relações com os governos argentino e peruano, devido aos desafios à vitória anunciada de Maduro, o Brasil assumiu a representação diplomática dos dois países em Caracas.
A decisão foi oficializada nesta segunda-feira (8/5), com comunicado conjunto dos governos do Brasil e da Venezuela.
Com isso, o Brasil assume “a custódia das localidades das Missões Diplomáticas da República Argentina e da República do Peru, incluindo seus bens e arquivos, bem como a representação de seus interesses e dos seus nacionais em território venezuelano”.
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