Nesta quarta-feira (14/8), o Congresso Nacional promoveu debate sobre a Lei Maria da Penha e medidas de proteção às mulheres vítimas de violência doméstica. A Comissão Mista de Combate à Violência contra a Mulher recebeu ativistas e representantes do Poder Judiciário e de ministérios para discutir o Projeto de Lei 2.253/23, que propõe alterações no processo de arbitragem de fiança nos crimes abrangidos pela Lei Maria da Penha.
O projeto, de autoria da deputada federal Rosângela Moro (União-SP), sugere que a decisão sobre a concessão de fiança nesses casos seja transferida do delegado para o juiz, com o objetivo de garantir maior segurança jurídica às mulheres. Atualmente, a fiança é arbitrada pelo delegado de polícia nos crimes com pena máxima de quatro anos. “Ao condicionar a fiança à decisão da autoridade judiciária, a lei pode salvaguardar os direitos das mulheres vítimas de violência doméstica, pois uma decisão do juiz proporciona mais segurança jurídica do que a concessão de fiança pela autoridade policial”, argumentou a deputada.
A senadora Zenaide Maia (PSD-RN), conhecida por sua atuação em defesa dos direitos das mulheres, abriu o debate com uma provocação sobre a necessidade de uma educação mais ampla em relação à Lei Maria da Penha. “Por que não incluir a Lei Maria da Penha na grade curricular do ensino fundamental 2 em diante? Conhecimento é poder. Ninguém capacita ninguém sem informações corretas. Não podemos deixar as mulheres pensarem que não têm nada a ver com política. Como não temos nada a ver se é um cargo político que diz o nosso salário, quantas horas vamos trabalhar e com que idade vamos nos aposentar?”, questionou o senador.
No mesmo tom, a senadora Augusta Brito (PT-CE) destacou a necessidade de focar na prevenção da violência contra a mulher, além de punir os agressores. “Na lei não há só punição para o agressor, temos que falar de prevenção, que nos interessa mais do que punir. Para que a violência não continue acontecendo é preciso preveni-la”, afirmou.
Durante o debate, Sandra Lia Barwinski, coordenadora geral de Garantia de Direitos e Acesso à Justiça do Ministério da Mulher, destacou a questão da desinformação e dos desafios culturais que ainda permeiam a sociedade brasileira em relação à Lei Maria da Penha. “Ainda existe uma campanha de desinformação e todo tipo de ataques misóginos dizendo que Maria da Penha não sofreu nenhuma violência. Isto é um reflexo da nossa cultura sexista. Estou preocupado com o rigor excessivo e a punitividade injustificada. Os meios de proteção dos sistemas de justiça não podem ser obstáculos para as mulheres”, declarou Sandra, defendendo a necessidade de melhorar a legislação com foco na proteção real e eficaz das vítimas.
Um ponto levantado pela senadora Jussara Lima (PSD-PI) foi a ausência de homens no debate, o que, segundo ela, é reflexo do distanciamento nas discussões sobre a violência contra a mulher. “Reconheço que nós, mulheres, devemos nos unir cada vez mais, mas os homens deveriam estar aqui para debater conosco esse assunto que é tão urgente e que eles fazem parte. A violência contra as mulheres vem dos nossos parceiros, maridos, pais e irmãos. Esta questão só será resolvida quando todos debatermos este tema. Lá dentro, muitas mulheres nem sabem o que é feminicídio”, destacou Jussara, alertando para a necessidade de um diálogo mais inclusivo e abrangente.
A representante da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Vanessa Ribeiro, apresentou dados sobre a violência doméstica no Brasil e a falta de procura de ajuda pelas vítimas, além de enfatizar a importância de políticas públicas que garantam não só proteção, mas também incentivo para as mulheres procurarem ajuda. “O Judiciário tem tentado reverter esse cenário. Apenas 29% das mulheres que sofreram violência doméstica procuraram órgãos oficiais. 24% relataram apenas para pessoas próximas e 40% não procuraram ajuda de ninguém. Entre as pessoas que não procuraram ajuda de ninguém, 70% explicaram ter medo do agressor. Eles têm medo que o agressor volte para casa”, disse Vanessa.
A mudança na arbitragem de fiança, proposta no Projeto de Lei 2.253/23, foi vista por muitos como um passo necessário, mas o sucesso desta e de outras medidas depende de um esforço conjunto entre o poder público, a sociedade e, principalmente, da mudança cultural para combater o gênero violência baseada.
*Estagiário sob supervisão de Pedro Grigori
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