A votação no Conselho de Ética da Câmara foi esmagadora: aprovou por 15 votos a um a recomendação de cassação do mandato do deputado Chiquinho Brazão (sem partido-RJ), réu acusado de ser um dos mandantes do assassinato da vereadora Marielle Franco ( PSol). Jack Rocha (PT-ES), relator do caso, recomendou a perda do mandato de Brazão por conduta incompatível com o decoro parlamentar. Segundo o deputado, há provas “robustas” de que cometeu “graves irregularidades no exercício do seu mandato” e que a conclusão da Polícia Federal e da Procuradoria-Geral da República (PGR) de que Brazão é um dos líderes da execução de Marielle.
A defesa do deputado ainda poderá recorrer à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, onde a correlação de forças é majoritariamente conservadora, mas é pouco provável que o parlamentar também seja poupado lá. Não é a tradição da CCJ. O deputado Gutemberg Reis (MDB-RJ) foi o único voto contrário ao impeachment. O deputado Paulo Magalhães (PSD-BA) se absteve. O impeachment dependerá do apoio de pelo menos 257 dos 513 deputados.
Gutemberg Reis tem seus motivos para votar contra o impeachment: além de aliado político do Brazão, ele é citado na investigação sobre a morte do advogado Rodrigo Marinho Crespo e é investigado por envolvimento na fraude nas carteiras de vacinação de Bolsonaro. Brazão nega envolvimento no atentado que matou o vereador e motorista Anderson Gomes em 2018. Ele afirma ainda que Marielle era sua amiga, no período em que ambos foram vereadores na capital fluminense.
O Conselho de Ética abriu processo contra Chiquinho Brazão em abril, após o parlamentar ter sido preso pela PF por suposto envolvimento no crime. Chiquinho e seu irmão, o conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro Domingos Brazão, segundo a PF, foram quem ordenaram a execução de Marielle. Presos desde março, os dois são réus no Supremo Tribunal Federal (STF) por homicídio qualificado e tentativa de homicídio.
Segundo a PGR, conforme relatado ao STF, a morte de Marielle foi ordenada pelos irmãos em resposta às ações do PSol e do vereador contra um esquema de loteamento em áreas de milícias na Zona Oeste do Rio. A defesa de Chiquinho Brazão tem cinco dias para recorrer à Comissão de Constituição e Justiça, que é o terreno mais favorável para o parlamentar evitar o impeachment. A CCJ apenas avalia se o Comitê de Ética observou os ritos normativos e a Constituição, ou seja, o devido processo legal.
Sem depoimentos
O advogado Cleber Lopes, que representa Brazão, afirma que a defesa foi prejudicada ao longo do processo no Conselho de Ética pela falta de depoimentos de testemunhas e que não houve quebra de decoro, porque os fatos ocorreram antes do parlamentar assumir seu mandato no Câmara. Marielle foi assassinada em 2018, só em 2019 Brazão se tornou deputado federal. Um dos milicianos da Zona Oeste do Rio, Brazão foi expulso do União Brasil e já foi detido pelos colegas da Câmara.
O Conselho de Ética já aprovou 23 recomendações de perda de mandato, apenas oito foram acatadas pelo plenário da Câmara. Outros 10 acabaram rejeitados. Porém, Brazão está na mesma situação de outros políticos acusados de homicídio, cujos mandatos foram cassados pela Câmara. Com o agravante de ser contra um parlamentar, como aconteceu com o ex-deputado federal Talvane Albuquerque, por ordenar um massacre que matou quatro pessoas para matar a deputada federal Ceci Cunha (PSDB) e tomar sua cadeira, após ter perdido a eleição em 1998.
O crime ocorreu em Maceió e ficou conhecido como massacre da Gruta. Talvane foi julgado e condenado em 2012, por júri popular, a 103 anos e quatro meses de prisão. Em maio de 2021, a Sexta Turma do STJ (Superior Tribunal de Justiça) reduziu sua pena para 92 anos, nove meses e 27 dias. Talvane ocupou o cargo de deputado federal entre 1995 e 1997, como suplente nomeado. Nas eleições de 1998, concorreu novamente, mas foi apenas o primeiro suplente. Com a morte de Ceci, ele acabou empossado em 1999, mas foi cassado pelos pares.
Outro caso famoso é o de Hildebrando Pascoal, condenado a mais de 80 anos de prisão por homicídios, tráfico de drogas e crimes eleitorais e financeiros. Foi deputado estadual pelo Acre entre 1995 e 1999. Em 1998, foi eleito deputado federal, mas ficou menos de um ano no cargo, devido a denúncias investigadas pela CPI do Narcotráfico. Em setembro de 1999, seu mandato foi cassado por quebra de decoro parlamentar. Ele ficou famoso por ordenar que os corpos das vítimas fossem desmembrados com uma serra elétrica e escondidos.
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