Um dia depois de o Banco Central elevar novamente a taxa básica da economia (Selic) pela primeira vez desde 2022, a Bolsa de Valores de São Paulo (B3) e o dólar recuaram com a expectativa de maiores ganhos na renda fixa.
Depois que o Comitê de Política Monetária (Copom) do BC elevou a Selic de 10,50% para 10,75% ao ano, o Índice Bovespa (IBovespa), principal indicador da B3, encerrou o pregão de ontem com queda de 0,47%, a 133.122 pontos, contra na Bolsa de Valores de Nova York, onde o índice Dow Jones subiu 1,26% após o Federal Reserve (Fed, banco central dos Estados Unidos) cortar os juros básicos em 0,50 ponto, para o patamar de 4,75% a 5% ao ano, refletindo uma política monetária mais branda face aos sinais de desaceleração económica na maior potência do planeta.
O dólar voltou a cair e fechou o dia cotado a R$ 5,42 à venda, o menor patamar do mês e, com isso, o real teve ontem o segundo melhor desempenho entre as principais moedas emergentes e países exportadores de commodities. , perdendo apenas para a moeda australiana. “O câmbio e a Bolsa reagiram conforme o esperado após o Copom, com o real se valorizando pelo diferencial de juros enquanto a Bolsa recuou pela maior atratividade da renda fixa”, explicou Gustavo Cruz, estrategista-chefe da RB Investimentos.
A divergência entre os analistas está no ritmo de subida da Selic na próxima reunião do Copom, em novembro. Para Cruz, o BC deverá acelerar o ritmo de alta da Selic para 0,50 ponto percentual e, em dezembro, o ritmo vai depender de como os mercados se comportarão no final do ano. “Se melhorar, posso pensar em reduzir o ritmo”, explicou ela. Alexandre Espírito Santo, economista da Way Investimentos, é mais conservador e espera mais dois aumentos de 0,25 ponto percentual na taxa Selic até o final do ano.
“Sinceramente, acho que um miniciclo de 0,75 ponto percentual de aumento seria suficiente, mas parece que o mercado comprou a ideia de que é necessário um aperto mais forte e há economistas falando em Selic no final do ciclo de até 12,50% ao ano, mas acho um pouco exagerado. Mas vamos ver os próximos números”, afirmou.
Sergio Goldenstein, estrategista da Warren Rena, por sua vez, continua prevendo três aumentos adicionais de 0,25 ponto percentual na taxa Selic, para 11,50% ao ano até janeiro de 2025. “Mas, reconhecemos que a possibilidade de um ciclo mais intenso, em particularmente, se o desempenho do real não contribuir para o processo de desinflação e se os indicadores de atividade e do mercado de trabalho continuarem a mostrar forte dinamismo”, escreveu, em relatório a clientes. Ele espera, inclusive, que a reação inicial do mercado à decisão e ao comunicado do Copom continue sendo de redução da inclinação da curva de juros e valorização do real.
Na avaliação do economista-chefe do Departamento de Pesquisas Econômicas do Banco Daycoval, Rafael Cardoso, o Banco Central foi bastante duro no comunicado da reunião do Copom, reagindo a fatores externos e internos. Para ele e sua equipe, o conselho deverá aumentar a taxa de aumento para 0,50 ponto percentual nas próximas duas reuniões e depois reduzi-la para 0,25 ponto percentual, quando encerrará o ciclo com a Selic em 12%. “Nossa interpretação é que o BC decidiu assumir o controle de forma mais ativa, assumindo as rédeas da política monetária, sem depender de fatores externos. Internamente, o Banco Central passou a ver o equilíbrio de riscos como assimétrico. reavaliação em torno da actividade económica mais forte do que o esperado”, explicou.
Segundo Paulo Cunha, CEO da iHUB Investimentos, as decisões dos bancos centrais do Brasil e dos Estados Unidos estiveram em linha com as expectativas do mercado, mas seus efeitos ainda serão sentidos nos próximos meses. “Essas magnitudes eram esperadas, principalmente aqui no Brasil, onde o aumento foi moderado. Isso deve continuar favorecendo os ativos de renda fixa e os investimentos vinculados à Selic e cumprindo sua função principal, o controle inflacionário.
Nos EUA, o corte do Fed foi visto como um sinal claro de que a desaceleração econômica é uma preocupação, o que poderia impactar a curva de taxas de juros globalmente”, disse Cunha. “O Banco Central do Brasil adotou uma postura mais dura (‘hawkish’) ao tornar é claro que poderão ocorrer novos aumentos se a inflação persistir. Isto traz previsibilidade e deve continuar a favorecer os investimentos em renda fixa e títulos públicos. A curva de rendimentos poderá cair um pouco no longo prazo, e o mercado cambial também poderá responder positivamente, com o dólar caindo ligeiramente”, acrescentou.
Ajustes
Os investidores precisam agora de ajustar as suas carteiras de acordo com as novas realidades económicas de cada país. No Brasil, o aumento da Selic mantém a atratividade dos investimentos em renda fixa, enquanto, nos EUA, o corte nas taxas de juros pode favorecer ativos de maior risco, como as ações, mas ainda depende da resposta do mercado às novas condições econômicas.
Para o economista Otto Nogami, professor do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper), a decisão do Fed pode ser vista como um reflexo do avanço no combate à inflação e um movimento de equilíbrio dos riscos econômicos. “No Brasil, essa redução poderá trazer alguns impactos positivos, como a valorização do real e um possível alívio na política monetária”, disse.
Nogami disse que a decisão do Copom foi acompanhada de queda da B3 e leve desvalorização do dólar frente ao real. “Esses movimentos refletem a cautela dos investidores diante do novo cenário de aumento dos juros.”
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