Com mais horas de trabalho, a renda dos trabalhadores de aplicativos está diminuindo. É o que aponta o estudo Plataformização e Trabalho Precário de Motoristas e Entregadores no Brasil, realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
Cerca de um milhão de motoristas trabalhavam de forma independente no transporte de passageiros em 2022, quando o rendimento médio era de R$ 2,4 mil, ante ganho de R$ 3,1 mil registrado pelos cerca de 400 mil ocupados na atividade entre 2012 e 2015. No caso dos entregadores vinculados a plataformas, o rendimento caiu de R$ 2.250 em 2015 para R$ 1.650 em 2021, durante a pandemia de Covid-19.
A queda na remuneração refletiu o aumento de trabalhadores na atividade. No mesmo período, o número de brasileiros empregados nesta atividade saltou de 56 mil para 366 mil.
Os dados levam em conta a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad), que no ano passado traçou um retrato inédito dos trabalhadores que prestam serviços via aplicativo. Para o pesquisador Sandro Sacchet, o crescimento da chamada “plataformização” do trabalho tem levado à precariedade da rotina dos motoristas de transporte de passageiros e entregadores.
“A pesquisa mostra que houve um aumento da jornada de trabalho, chegando a ultrapassar as 60 horas, o que vai contra toda a tendência do mercado de trabalho, que era de redução de jornadas mais longas”, notou Sacchet. Em termos de horas trabalhadas, a jornada de trabalho dos motoristas autônomos é muito superior à média dos trabalhadores autônomos no país. Em 2022, enquanto 27,3% dos motoristas trabalhavam entre 49 e 60 horas semanais, na média geral dos trabalhadores independentes esse percentual era de 13,7%.
O percentual de motoristas que trabalhavam mais de 60 horas semanais, por sua vez, era quase três vezes superior à média dos autônomos: 9,6% contra 3,3%. Entre os entregadores, saltou de 2,6% em 2012 para 8,6% em 2022, aqueles que trabalhavam mais de 60 horas semanais.
Pensão
O estudo mostrou que o número de motoristas que mantêm pagamentos da Segurança Social despencou, contrariando também a tendência de outros segmentos de trabalho. Em 2015, 47,8% contribuíam para o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), percentual que caiu para apenas 24,8% em 2022.
Segundo Sacchet, a expansão dos trabalhadores através de plataformas representa um processo de trabalho precário com menores rendimentos, menores contribuições para a segurança social e maiores jornadas de trabalho.
“Antes, mesmo dos motociclistas que trabalhavam com encomendas e entregas, cerca de 40% ainda eram formais. No caso dos motociclistas do setor de Comércio e Alimentação, a proporção de trabalhadores formais era alta. queda na formalização, mostrando que a concorrência da ‘plataformização’ acabou dificultando”, avaliou.
Regulamento
O projeto de lei que regulamenta o trabalho dos motoristas de aplicativos está preso na Câmara dos Deputados. A proposta, fruto de um grupo de trabalho criado pelo governo, é alvo de críticas de associações comerciais e virou motivo de polarização entre os sindicatos.
Pelo menos três pontos da regulamentação causaram desconforto aos trabalhadores: a jornada de trabalho, o salário mínimo pago por hora e a Previdência Social. A Federação Brasileira dos Motoristas de Aplicativos (Fembrapp) afirmou que o modelo sugerido pelo governo “pode incentivar jornadas excessivas de trabalho”.
O argumento da federação é que os profissionais podem trabalhar 12 horas em cada empresa, enquanto a limitação da carga reduziria a margem para quem precisa trabalhar mais. Na visão dos críticos da proposta, a contribuição previdenciária também é prejudicial porque reduz o rendimento líquido dos motoristas. O projeto prevê que, além dos 7,5% pagos pelos trabalhadores, outros 20% ficarão a cargo das empresas.
Para o Correspondência, o motorista Wallisson Rodrigues, 32 anos, criador da página Uberizando DF, disse que sentiu a diferença salarial, que vem diminuindo. “Acho que os valores pagos também diminuíram com as negociações regulatórias. Agora, pelo menos, todas as partes estão conversando. No início a proposta levava em conta apenas os sindicatos e plataformas do grupo de trabalho, hoje há mais diálogo com os impulsionadores da construção de regulamentos”, afirmou.
Você gostou do artigo? Escolha como acompanhar as principais notícias do Correio:
Dê sua opinião! O Correio tem espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores através do e-mail sredat.df@dabr.com.br