Os incêndios no Brasil superam as expectativas mais pessimistas. O número de surtos, no mês encerrado ontem, saltou 30% em relação à média do mês, segundo dados do Programa Queimadas (PQueimadas), do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que faz deste mês de setembro o quinto o pior da série histórica, iniciada em 1988. Até domingo, foram registrados 82,1 mil surtos.
O levantamento do Inpe também projeta que 2024 — com 209,2 mil focos de incêndio mapeados — deve terminar com o maior número de focos de incêndio desde 2010, quando foram registrados 319,3 mil focos de incêndio. Em número de incêndios, este ano só fica atrás de 2005 (102,4 mil focos), 2010 (109 mil), 2004 (121,3 mil) e 2007 (141,2 mil).
Como consequência, os biomas brasileiros sofrem com esta “pandemia de fogo”. No período de 1º de janeiro a 29 de setembro deste ano, o Pantanal e a Mata Atlântica apresentaram aumentos percentuais superiores a 100% em relação ao mesmo período do ano passado, segundo dados do instituto.
Com 18.302 queimadas registradas, a Mata Atlântica teve um aumento de 125% em relação a 2023, quando registrou 8.103 queimadas. É o pior número desde 2007, quando o ecossistema atingiu 18.488 surtos. No Pantanal a situação é ainda mais grave. Este ano, o bioma — caracterizado como úmido e carregado hidricamente — apresentou o maior aumento percentual de queimadas da história, de 1.431% em relação a 2023. Foram 773 queimadas de janeiro a setembro do ano passado, enquanto, neste ano, o número supera 11,8 mil surtos.
As regiões mais afetadas pelos incêndios foram aquelas que contêm os biomas mais devastados. De 1º de janeiro a 29 de setembro, o Centro-Oeste registrou 63,8 mil focos de incêndio. Esta foi a região que registou o maior aumento percentual — 243% face ao mesmo período de 2023 (18,5 mil). O estado que mais sofreu com os incêndios foi Mato Grosso, contabilizando 45,7 mil focos. Isso corresponde a 71,7% de toda a região, e um aumento de 219% em relação ao ano passado.
Logo atrás está o Sudeste, ultrapassando 19,7 mil surtos em 2024, um aumento de 197% em relação a 2023. São Paulo, com 7.873 registros, foi o estado que apresentou o maior aumento percentual em relação ao ano anterior: 429%. Minas Gerais, por sua vez, registrou o maior número de focos de incêndio em números absolutos no Sudeste, com 10,1 mil focos, o equivalente a 51,7% do total da Região.
A atuação dos governos federal e estadual no combate às queimadas está “longe de ser suficiente”, segundo a coordenadora de políticas públicas do Observatório do Clima e ex-presidente do Ibama, Suely Araújo. “A Presidência da República poderia estar liderando os governos estaduais, aos quais cabe controlar as autorizações prévias de uso do fogo nas atividades agrícolas, uma das normas mais violadas no país, prevista há 90 anos”, destacou.
Para Araújo, os esforços de prevenção e mitigação de danos precisam ser intensificados em 2025. Ela destaca que o Ministério do Meio Ambiente e Mudanças Climáticas “tem limitações de recursos e de pessoal, mas tem tentado fazer a sua parte”. O ministro da Agricultura, segundo ela, deveria “estar usando a sua liderança para orientar os produtores rurais a não usarem o fogo”, em vez de “focar nas regras europeias que visam garantir a correta origem dos produtos”.
“É preciso intensificar esse esforço, valorizando muito mais a prevenção do que aconteceu e a execução de todo o orçamento disponível, ao longo do ano. Vários outros atores do governo federal deveriam estar atuando com mais vigor”, afirmou.
Princípio da precaução
Em meio a esse cenário, a ministra do Meio Ambiente e Mudanças Climáticas (MMA) Marina Silva afirmou que desde o início de Lula 3 o governo evitou uma situação que poderia ter sido pior em relação às secas e às queimadas. Ela destacou que “o desmatamento estava crescendo, quando o presidente Lula assumiu, em 80%. Não só freamos essa ascendência, como conseguimos empurrá-la para baixo não só na Amazônia, mas agora, no Cerrado, onde o desmatamento está caindo cinco meses antes”.
Com isto, o ministro concluiu que o cenário de incêndio seria “incomparavelmente pior” se houvesse “passagem de gado”. Para ela, a situação atual mostra a necessidade de intensificar esforços para evitar uma situação ainda pior em relação às mudanças climáticas. “Não só na gestão de desastres, mas na gestão de riscos baseada no princípio da precaução”, declarou.
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