Colocar Ana Gabriela Burlamaqui e Liane Araujo Garcia*— O assédio eleitoral no local de trabalho, tema de crescente importância, ganha relevância em tempos de eleições, quando o empregador ou os seus representantes podem usar a sua hierarquia e poder de gestão para influenciar a orientação política dos seus trabalhadores. A prática envolve a utilização da estrutura societária de forma abusiva, para coagir, intimidar ou obrigar os trabalhadores a apoiar determinado candidato ou partido político, sob ameaça de retaliação ou promessas de benefícios.
De acordo com a Resolução nº 355/2023 do Conselho Superior de Justiça do Trabalho (CSJT), o assédio eleitoral caracteriza-se como qualquer forma de distinção, exclusão ou preferência baseada em convicção ou opinião política no ambiente de trabalho. O ato pode ocorrer durante a admissão, permanência ou durante o exercício de funções laborais.
O assédio pode variar desde coerção e intimidação veladas até ameaças diretas de demissão ou promessas de benefícios para influenciar o voto dos funcionários. O parágrafo único do art. 2º da Resolução destaca ainda que o assédio eleitoral visa manipular a manifestação política dos trabalhadores em favor de interesses partidários.
Segundo o Ministério Público do Trabalho (MPT), mais de 153 reclamações foram registradas desde o início da campanha, em agosto. No mesmo período, em 2022, foram registados 11 casos de coação eleitoral. No entanto, o número total das últimas eleições foi elevado: 3.606 denúncias de assédio de empregadores a empregados.
A Justiça do Trabalho também lançou uma campanha de combate ao assédio eleitoral no trabalho, denominada “Seu voto, sua voz – Assédio eleitoral no trabalho é crime”, promovida pela Justiça do Trabalho (JT) de todo o país. Recentemente, o TRT-10 promoveu ações de combate ao assédio eleitoral no ambiente de trabalho durante as eleições municipais de 2024.
As relações de trabalho naturalmente já são caracterizadas por certo desequilíbrio, derivado do poder diretivo do empregador, o que pode gerar no empregado o chamado medo reverencial. Porém, quando esse poder é exacerbado a ponto de obrigar e obrigar o trabalhador a adotar uma posição política contrária à sua vontade, ocorre o assédio eleitoral.
A liberdade de pensamento, garantida pela Constituição Federal no art. 5º, é um dos pilares da democracia. Esta liberdade inclui a orientação política do trabalhador. Qualquer ato de coação praticado pelo empregador que vise obrigar o empregado a votar de determinada forma viola esse direito fundamental, e, consequentemente, é considerado inconstitucional.
A prática de assédio eleitoral, por ser inconstitucional, está sujeita a sanções administrativas, civis e criminais. Entre as punições previstas estão multas e, em casos mais graves, penas de prisão. Do ponto de vista laboral, o trabalhador também pode requerer a cessação indireta do contrato de trabalho, ou seja, a rutura do vínculo laboral com o empregador, sem prejuízo do direito rescisório, como se tivesse sido despedido sem justa causa. Além disso, o empregador ou o assediador poderá ser condenado a indenizar o trabalhador por danos morais, em razão do sofrimento psíquico e da violação de sua honra e dignidade.
Um exemplo emblemático foi a condenação de uma rede varejista, que obrigou seus funcionários a usar camisetas com propaganda política e a participar de eventos eleitorais da empresa, sob ameaça de demissão. Para evitar o assédio eleitoral, as empresas devem implementar regras internas que coíbam práticas abusivas e realizar treinamentos para conscientizar gestores e colaboradores. A criação de canais de denúncia, como ouvidorias e comissões internas de prevenção (CIPA), também é essencial para promover um ambiente de trabalho saudável.
Caso um trabalhador seja vítima de assédio eleitoral, é fundamental que reúna provas, como mensagens de texto, e-mails ou depoimentos, e denuncie aos órgãos competentes, como o Ministério Público do Trabalho (MPT), a Justiça Eleitoral, classe sindical e até na Justiça do Trabalho. Em muitos casos, estas queixas resultam em condenações significativas, não só a favor do trabalhador individual, mas também em defesa de toda a comunidade.
A liberdade política é um direito inalienável e deve ser protegida em todos os espaços, incluindo o local de trabalho. Empresas que promovem um ambiente saudável e respeitoso, livre de qualquer forma de assédio, tendem a ser mais produtivas e lucrativas, além de cumprirem seu papel social e contribuírem para o fortalecimento da democracia.
Ana Gabriela Burlamaqui, sócia da AC Burlamaqui Consultores. Graduado em Direito pela PUC-RJ em 1994. Especialista em prevenção e gestão de riscos trabalhistas (IBMEC). Diretor da Associação Carioca dos Advogados Trabalhistas entre 2009 e 2015. Assessor da OAB/RJ desde 2022.
*Sócios do escritório AC Burlamaqui Consultores
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