Numa era em que a inovação é palavra de ordem em quase todos os setores, a gastronomia enfrenta um dilema peculiar: como inovar respeitando as tradições e agradando paladares de todas as idades? O envelhecimento gastronómico, ou a predisposição para preferências culinárias baseadas exclusivamente em novos menus e/ou estabelecimentos recém-inaugurados, apresenta desafios e oportunidades para chefs e donos de restaurantes.
O choque de gerações
Os restaurantes tradicionais são tesouros culturais, mantendo viva a cultura culinária local. Porém, a chegada de novas gerações, munidas de paladares ávidos por novidades e tendências globais, põe em causa a sobrevivência destes estabelecimentos e até de receitas clássicas. Então, como podemos inovar sem alienar cardápios antigos e cheios de sabores conhecidos? Sem deixar de lado os restaurantes que fazem parte da história da própria cidade?
Inovação na tradição
A chave pode estar na fusão sutil de elementos e em como apresentá-los a clientes novos e antigos. Por exemplo, os chefs de Lisboa estão a reinventar os pratos tradicionais portugueses, incorporando técnicas modernas ou ingredientes invulgares que apelam aos jovens, mas mantêm a essência que os mais velhos apreciam. Resultado disso: a capital portuguesa vem se destacando na gastronomia mundial, inclusive com estrelas Michelin.
Um caso notável é a introdução de espumas e geleias em pratos como o bacalhau à Brás, mantendo o sabor tradicional, mas apresentando-o de uma forma visualmente surpreendente e texturalmente diferente. Essa abordagem não só mantém a receita, mas também cativa os jovens, que buscam experiências gastronômicas instagramáveis.
Educação gastronômica
Outro aspecto importante é a educação gastronómica, que muitas vezes pode passar por um festival, um “menu do dia”. Apresentar uma sugestão de entrada, prato principal e sobremesa pode ser uma oportunidade para apresentar novos pratos, agradar novos clientes e surpreender antigos.
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Participar em eventos gastronómicos é também uma boa oportunidade para contar a sua própria história, o que está por trás da decoração aparentemente “antiga”, “dark”, os conceitos adotados, as técnicas culinárias, os insumos escolhidos para cada prato, evitando também aquelas pequenas lições desagradáveis na hora do jantar, quando o garçom é orientado a falar bem sobre tudo isso. Se há algo simples que as redes sociais podem ajudar um restaurante é mostrar suas referências, sua trajetória, seus motivos.
Tecnologia a favor da tradição
A tecnologia é uma importante aliada. Aplicativos que contam histórias sobre os pratos à medida que são consumidos, ou realidade aumentada que mostra o processo de preparo na mesa do restaurante, podem transformar uma refeição tradicional em uma experiência educativa e divertida para todas as idades. As cozinhas abertas dos novos restaurantes são um modelo que se tornou tendência popular em todo o mundo.
Inovar dentro das tradições não passa apenas por mudar sabores, mas também por adaptar a experiência gastronómica às expectativas de uma nova geração sem perder a essência que conquistou sobre as gerações anteriores. O idadismo gastronómico, portanto, não deve ser visto como uma barreira, mas como uma oportunidade para unir gerações, para compreender que as tradições podem reinventar-se.
As paredes marcadas pela ação do tempo, a equipe que conhece os clientes há décadas, receitas clássicas que ninguém quer sair do cardápio podem ser a badalação do momento para velhos conhecidos. É preciso encontrar uma nova forma de contar a mesma história e ser compreendido por esse novo consumidor. O antigo, suas marcas, histórias, valores, herança, é muito legal. Pense nisso!
Thiago Paes é colunista de Turismo e Gastronomia. Apresentador de TV do canal Travel Box Brazil e está nas redes sociais como @paespelomundo. Imprensa: contato@paespelomundo.com.br
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