Embora o país continue crescendo acima das estimativas, a questão fiscal continua em jogo e o secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, segue otimista. Em entrevista com Correspondênciaele reforça a promessa do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, de que é possível que o país consiga recuperar o grau de investimento até 2026, ao final do terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mesmo com a estabilização da dívida pública bruta cerca de 81% e 82% do Produto Interno Bruto (PIB) até 2028.
Ceron garante ainda que as recomendações da Moody’s serão ouvidas pelo governo e que a meta fiscal não será modificada e não se deve perder a oportunidade de recuperação do grau de investimento. “O país está se esforçando para virar a página de uma década de problemas fiscais e estamos muito perto disso”, afirma.
O secretário ainda admite que está de olho nas oportunidades até mesmo para uma nova emissão de títulos públicos no exterior neste ano, aproveitando a elevação do rating do Brasil pela Moody’s, que está um passo abaixo do selo de bons remuneradores, e o novo ciclo de cortes nas taxas de juros nos Estados Unidos, iniciados no mês passado. “Estamos avaliando e acompanhando o mercado. Poderemos emitir mais algumas emissões este ano. Obviamente vai depender das condições do mercado, se haverá uma boa oportunidade, mas não está descartada uma nova emissão”, afirma Ceron. A última emissão em dólares ocorreu em junho deste ano.
A retomada do presidente Lula nas promessas de isentar do Imposto de Renda quem ganha até R$ 5 mil abalou o mercado, mas mantém o otimismo de Ceron. Ele ainda vê o Brasil como um país “cheio de oportunidades, em um novo patamar de crescimento econômico”. Abaixo estão os principais trechos da entrevista:
O ano está acabando e o governo tenta fechar as contas perseguindo o piso da meta fiscal (de -0,25% do PIB), mas com vários descontos…
Temos três coisas, este ano, lá fora, de créditos extraordinários. Tem uma decisão do TCU (Tribunal de Contas da União), em torno de R$ 1 bilhão, tem R$ 40 bilhões para o Rio Grande do Sul e, agora, tem uma decisão do Judiciário que abriu crédito de R$ 500 milhões para os incêndios. O regulamento estabelece que seja utilizado em determinadas situações, como aconteceu com a pandemia, ou qualquer outro evento de comoção nacional. Em relação à faixa primária, iniciamos o ano com meta zerada, com faixa de 0,25% do PIB, e havia total descrença de que ela seria alcançada. No início do ano, as expectativas do mercado em relação ao déficit primário estavam mais próximas de 1% do PIB e, em março, pensaram que faríamos uma mudança na meta. Evoluímos e aqui estamos. O mercado já entende que vamos atingir o piso da meta e a projeção de déficit está em torno de 0,6% do PIB, e só não vai ficar exatamente no limite da faixa devido aos desastres no Rio Grande do Sul, que está no processo de recuperação com um impacto muito menor do que o anteriormente estimado. Então, o ano está terminando muito bem. E cumprimos o que nos propusemos e o objetivo não foi alterado. Mas ainda existe a preocupação de que, nos próximos anos, a dinâmica dos gastos obrigatórios cresça muito e pressione os gastos discricionários.
Deverá o Tesouro, então, prestar especial atenção ao ritmo de crescimento das despesas obrigatórias?
Ele precisa disso. Temos que compatibilizar a dinâmica dos gastos obrigatórios para que não crie um problema impossível de ser resolvido, em detrimento da compressão dos gastos discricionários, o que poderia criar novamente o caos fiscal no país. O país está a tentar virar a página de uma década de problemas fiscais e estamos muito perto de o fazer. Não há razão para desperdiçarmos esta oportunidade.
Recentemente, a Moody’s elevou a classificação de crédito do Brasil. Quais são os desafios para o país atingir o grau de investimento até ao final do mandato?
Mantiveram uma perspectiva positiva dizendo que concederão grau de investimento dentro de 12 a 18 meses, se conseguirmos provar que iremos, de facto, respeitar as regras do enquadramento, e que as despesas terão uma dinâmica compatível, na qual alcançaremos resultados fiscais prometidos. Não é muito. É um voto de confiança que se transforma em oportunidade, e tenho falado sobre isso. O país está diante de uma grande oportunidade e precisa agir, precisa garantir a dinâmica das despesas obrigatórias. O governo precisa tomar essa decisão firme para garantir que as despesas obrigatórias tenham essa dinâmica, mas a sociedade precisa abraçar esse projeto.
Mas é possível voltar a ter superávit primário sem vincular o salário mínimo aos benefícios previdenciários e continuar com o aumento real do salário mínimo?
Claro. Não existe uma fórmula única para ajustar esta dinâmica. Existem diversas possibilidades, mas não é o que consideramos a melhor jogada. Quem está no mercado entende claramente os benefícios do grau de investimento, mas a sociedade precisa entender o quanto isso beneficia a todos, com mais empregos, mais desenvolvimento, mais renda e menos juros. Esse passo da Moody’s, por exemplo, fez com que o rating de muitas empresas aumentasse automaticamente. A Moody’s foi muito clara e honesta sobre o que é necessário para atingir o grau de investimento. Precisamos, primeiramente, atingir os resultados fiscais que estão contratados, sem alterações na meta, e garantir os ajustes necessários para que a dinâmica das despesas não resulte no descumprimento das regras do quadro fiscal.
A Moody’s foi clara, mas será que o presidente Lula entendeu?
Foi o presidente Lula quem alcançou o grau de investimento para o país.
Mas ele perdeu quando a presidente Dilma Rousseff estava no poder…
O país perdeu o grau de investimento após a saída de Lula, e ele agora tem a possibilidade concreta de deixar esse legado. Ele voltou a reconstruir o país, do ponto de vista político, para tentar pacificar um pouco o país, e tem a oportunidade de deixar esse legado de recuperação do grau de investimento para a sociedade, para o Estado brasileiro. Todo mundo ganha. E chegamos até aqui, não só por mérito do governo. Houve avanços importantes com o apoio do Congresso e do Judiciário. Foi um pacto em torno da recuperação fiscal e agora precisamos de um novo pacto para grau de investimento. Estamos neste momento para aproveitar uma grande oportunidade que o país não pode desperdiçar. Não é possível pensar em argumento para o país não tomar medidas para recuperar o grau de investimento.
E como seria esse caminho? Primeiro, é necessário registrar novamente o superávit. Seria através da tributação dos super-ricos?
Não creio que seja necessário continuarmos com esse processo de recuperação fiscal que envolve um grande movimento do ponto de vista tributário. Não é sobre isso. O desafio hoje é muito mais colocado pela dinâmica das despesas. A grande preocupação, seja do mercado ou das agências de risco, se deve a esta dinâmica. Precisamos de eliminar este ruído, ou esta preocupação, e como é que isso pode ser feito através da adopção de medidas que mostrem inequivocamente que estas dinâmicas serão sustentáveis e compatíveis ao longo do tempo com as regras do quadro, com o limite de despesas e que as despesas obrigatórias não serão comprima os discricionários até o ponto em que você tenha um colapso. Precisamos de continuar esta agenda de combate à despesa fiscal ineficiente e de alcançar resultados fiscais. Naturalmente, isto reduzirá a incerteza do mercado, que se refletirá nos prémios de risco.
Você disse que a meta deste ano não vai mudar, mas e para o ano que vem, existe possibilidade de mudar?
Nenhum. Pelo contrário, volto à nossa história sobre o grau de investimento, qualquer coisa que dificulte a oportunidade de recuperação do grau de investimento tem que ser combatida. Essa discussão não foi discutida e é incompatível com um país que deseja recuperar o grau de investimento.
O Tesouro lançou este ano uma agenda para títulos sustentáveis. Esperamos novas emissões de títulos verdes?
Emitimos duas emissões de títulos soberanos sustentáveis, ambas bem-sucedidas. Esta agenda de emissão de obrigações sustentáveis está a funcionar bem. O apetite é grande, agora nossa discussão é preparar uma terceira transmissão. Talvez façamos mais emissões este ano, mas não tenho certeza se será sustentável ou tradicional.
E a emissão externa, vocês têm alguma projeção para esse ano? Dado que os EUA podem reduzir as taxas de juro em mais 0,5 pontos percentuais, poderá haver uma janela?
Estamos avaliando e monitorando o mercado. Pode ser que emitimos mais alguns este ano. Obviamente que dependerá das condições de mercado, uma boa oportunidade. Não está descartada uma nova edição até novembro.
E como você vê a trajetória de estabilização da dívida pública?
A nossa última atualização, que contém os dados mais recentes, mostra uma estabilização em 2028. Antes estava no patamar de 79,8% do PIB, e agora subiu para entre 81% e 82% do PIB. É o efeito da política monetária que, em suma, tem as suas razões. Mas haverá condições para que no futuro seja flexibilizado e isso terá um efeito positivo, mas com muita transparência.
E é possível o país recuperar o grau de investimento com uma dívida neste patamar de 80% do PIB?
Sim. Vi algumas avaliações sobre isso e talvez seja falta de conhecimento, mas quais são as metodologias dessas agências de risco em relação a esses pagamentos, em termos de como avaliam o rating. Não olham apenas para as dívidas dos países e para o resultado primário. As agências analisam a actividade económica, a segurança jurídica, as reformas estruturais e o país como um todo…
Mas, quando o Brasil alcançou o grau de investimento em 2008, a dívida pública bruta era de 64% do PIB…
Mas eles não tinham muitos outros benefícios que têm hoje. Novamente, as pessoas olham apenas para um indicador. A agência de risco também analisa a capacidade de pagamento do país. O nosso desafio é sinalizar consistentemente que esta trajetória da dívida se estabilizará em 2028, como prometemos. Assim, não há dificuldade em recuperar o grau de investimento tal como consta de forma absoluta no conjunto de indicadores. Até recentemente, o Brasil tinha, além do aspecto fiscal, um segundo ponto negativo, que era o baixo crescimento econômico, uma baixa capacidade de crescer. Isso foi revertido porque, na verdade, o país vem crescendo de forma consistente e o debate agora é de outra natureza.
O país vem crescendo acima das expectativas, e alguns economistas dizem que isso está relacionado ao impulso fiscal da PEC da Transição 2023, além das reformas dos governos anteriores…
O país tem crescido de forma consistente, em torno de 3% ou mais, durante quatro anos. E, se olharmos para os setores da economia, todos estão cheios de oportunidades pela frente. O país está bem. É difícil dizer que não haverá crescimento acima de 2%, 2,5%. E houve muitas reformas na última década. O que é relevante é que o país está a avançar, fez muitos progressos na reforma laboral, na segurança social, nas reformas fiscais e microeconómicas e nas próprias regulamentações fiscais. Agora, acho que o debate mudou. Houve mudança no PIB potencial, tanto que alguns economistas concordam que é preciso rever os modelos. O país cresce de forma mais consistente, porque está bem e tem muitas oportunidades pela frente.
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