Nizan Guanaes não tem dúvidas ao avaliar a importância de Washington Olivetto para a publicidade brasileira. Segundo ele, o amigo falecido na tarde deste domingo representa para o segmento o que João Gilberto marcou para a música popular brasileira, ou seja, o artista que definiu “o antes e o depois”, uma espécie de “Abraão”, pai de todos os brasileiros anunciantes que vieram depois.
“Ele é praticamente o Abraão, que teve muitos filhos. Então, há variações próprias da época. Mas a boa escola vem dele. Quando dizem que ele foi um dos maiores publicitários brasileiros, não, ele se engana. Ele se engana. foi o maior anunciante brasileiro”, disse emocionado, em conversa exclusiva com o Estadão.
Para Guanaes, Olivetto rompeu com o padrão publicitário que até então era fortemente influenciado pela estética norte-americana no país, incorporando a cultura brasileira em suas peças e levando essa nova linguagem para o mundo inteiro.
Veja abaixo os principais trechos da entrevista.
O que Washington Olivetto representou para a publicidade brasileira? Quão grande é essa perda?
Ele era o João Gilberto, mas feliz (risos). Se você olhar os comerciais anteriores, eles eram muito americanizados, não tão brasileiros. Mas ele vai lá, percebe isso e começa a anunciar com a cara do Brasil. Ele tinha qualidade global, mas tinha cara de brasileiro. Ele dizia o tempo todo que tinha que anunciar para vender, para construir uma marca e criar cultura popular. Esse era o seu tripé. Ele traçou uma nova linha, um novo governante. Tudo que veio depois só existe porque ele falou: galera, é aquieu.
Quando pensamos em Olivetto, vêm à mente os comerciais da Bombril, da Cofap e do primeiro sutiã. O que mais você destacaria como trabalhos notáveis?
Tudo o que ele fez. A obra dele para o Itaú é incrível, “Você pode entrar e a casa é sua”. Depois sai do Itaú e se junta ao casal Unibanco. Depois o cachorrinho Cofap. O tempo todo você vai olhar e é gol, gol, gol. Tudo é maravilhoso. A agência se chamava W Brasil. Pode ter uma empresa americana com EUA no nome, mas ele colocou Brasil, para destacar o nosso país.
Ele tinha essa paixão e amor pelo país.
Sim. Amor pelo país, pela cultura brasileira. Conheci ele em uma gafieira na Bahia. Eu tive muita sorte. Eu e todo mundo que ia ser publicitário, a torcida do Corinthians (não o Flamengo, já que estamos falando dele), queríamos ser o Washington Olivetto. Vou numa gafieira e lá está meu ídolo. Eu era fã e disse que um dia queria trabalhar com ele. Parecia que ele tinha ouvido isso a vida toda. Depois fui para o Rio, saindo de Salvador e depois ganhei o Profissional do Ano da Rede Globo, ganhei tudo. E ele estava no júri. E só ganhei tudo por causa dele. E aí minha vida começou. Fui para São Paulo, mostrei meu trabalho para muita gente, ninguém prestou atenção em mim. E um dia recebi uma ligação, foi ele quem disse: “Aqui é Washington Olivetto, gostaria de trabalhar comigo?” Eu disse, isso deve ser uma brincadeira, mas graças a Deus não foi.
Você disse que ele era um chefe generoso, como ele era?
Muito gentil e generoso. Foi uma alegria trabalhar com ele, mesmo em momentos de tensão. Uma vez foi apresentar uma campanha ao Olavo Setúbal. E o doutor Olavo, muito cortês, perguntou: “Washington, a campanha está boa?” Ele respondeu: se a campanha não tivesse sido boa eu teria vindo de tênis rosa. (risos) Ele era maravilhoso, espirituoso. Ele disse que se algum dia morresse em um acidente de avião, sua lápide diria: “A pior ideia foi a última”. Então ele disse coisas incríveis. Um político que teve um passado um tanto polêmico, tinha um filho que queria ser político. Depois consultaram Washington, que respondeu: “Enquanto o slogan for: Ele veio para retribuir” (risos). Esse era o seu espírito. Ele era uma pessoa leve. Ele foi o maior de todos nós.
E quem são os herdeiros desta escola de criação?
Todos nós. Ele é praticamente Abraham, que teve vários filhos. Depois, há variações adequadas à época. Mas a boa escola vem dele. Quando dizem que ele foi um dos maiores publicitários brasileiros, não, estão enganados. Ele foi o maior publicitário brasileiro. Por que fazer o que ele fez, na hora em que fez? e uma vida coerente. Consagrado. Global. Ele morou em Londres e foi um ícone da McCann Global.
Como foi seu processo de criação?
Parecia um arrependido, foi o download mais rápido, funcionou na velocidade 5G, nunca vi nada igual. Em dois minutos, o que você estava tentando há horas dar à luz, ele sentava e resolvia.
E nunca parou, sempre um projeto novo.
Eu tinha uma coluna na Globo, estava fazendo um podcast. Uma cultura enorme, senso de estética, ele sabia de tudo. Foi único.
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