A Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam) promove neste domingo a segunda edição do Exame Nacional do Poder Judiciário (Enam). No total, foram inscritos 33.147 candidatos ao uso da toga, sendo 5.516 negros, 1.254 pessoas com deficiência e 33 indígenas. O processo, agora sob o comando do ministro Benedito Gonçalves, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que assumiu a direção-geral da Enfam em setembro, vem com algumas melhorias, mas mantém o propósito: selecionar os aptos para a carreira no judiciário.
Juiz de carreira, aprovado em concurso público há 36 anos, Benedito Gonçalves foi desembargador do Tribunal Regional Federal (TRF) da 2ª Região e, desde 2008, é ministro do STJ. Com esse perfil, o juiz analisa que a carreira exige conhecimento técnico e, sobretudo, imparcialidade e conhecimento jurídico, muito equilíbrio, sensibilidade e comprometimento com a Justiça. O Enam avalia a capacidade dos candidatos em lidar com essas questões. “A ética e a integridade são essenciais, assim como a paciência e a serenidade no trato de casos complexos. Um bom juiz também deve ter firme capacidade de decisão e estar constantemente atualizado diante das mudanças na lei”, afirma.
Quais informações podem ser retiradas da primeira prova do Enam sobre a qualificação dos candidatos?
Podemos olhar para os resultados e ser simplistas. Dizendo que apenas 22,8% das pessoas cadastradas eram qualificadas. Porém, acho que essa média não deve ser o mais importante quando se pensa no Enam. Há dados mais interessantes a serem analisados, por exemplo, que das 7.301 pessoas habilitadas na primeira edição, 2.047 são negras. Ou que os estados com maior número de pessoas qualificadas, proporcionalmente, eram Tocantins, Mato Grosso e Distrito Federal. É uma primeira fase, uma etapa que precisa ser superada para que as pessoas possam participar dos exames judiciais, mas é suficiente para refletir uma mudança.
A primeira edição indicou algo para melhorar a segunda etapa?
Acho que enquanto estivermos fazendo alguma coisa, sempre teremos ajustes a fazer. Será sempre assim. Uma das coisas que foi melhorada para a segunda etapa foi a questão da heteroidentificação. Além de ter estabelecido um fluxo para os procedimentos a serem adotados pelos tribunais, a Enfam se preocupou em realizar treinamentos específicos sobre o tema. A Escola criou um curso específico para profissionais do Judiciário e membros de comissões de heteroidentificação, do qual participaram mais de 120 pessoas.
O que esperar desta segunda edição?
A expectativa é a melhor possível. Quando a Resolução nº. Foi lançada a Portaria 531 do Conselho Nacional de Justiça, que criou o Enam e determinou que o Enfam regulamentasse e organizasse o Exame, o prazo para a primeira edição era muito curto. Algo em torno de seis meses. E tanto as comissões quanto a equipe da Enfam, então sob a direção do ministro Mauro Campbell Marques, fizeram disso um sucesso. Ou seja, tecnicamente estamos ainda mais preparados e prontos para o desafio de organizar um exame nacional das proporções e da importância do Enam. Além disso, também estou muito entusiasmado em ver no Enam o início de uma mudança no Judiciário, com uma verdadeira renovação do Judiciário.
O número de assinantes aumentou?
Nas duas edições tivemos mais de 30 mil. Nesta segunda-feira, tivemos 33.147 pessoas cadastradas, dentre estas, 5.516 eram negras, 33 indígenas e 1.254 pessoas com deficiência. Os números são menores que os da primeira edição e acho que isso reforça o cumprimento de um dos principais objetivos do Exame, que é procurar realmente quem está habilitado para a magistratura e não quem se dedica apenas a fazer o exame sem realmente tendo afinidade com a função que irão desempenhar.
Existem mudanças?
Nesta segunda edição, o Exame mantém o formato e as características que visam não só uniformizar os conhecimentos técnicos que os juízes necessitam ter nos principais ramos do direito, mas também avaliar as suas noções humanísticas. Claro que isso é responsabilidade do Enam e não se pode deixar de lembrar que se trata de uma primeira etapa, quando os candidatos estão habilitados para realizar as provas. Existe a liberdade de cada tribunal, que será responsável por fazer suas demandas nos seus respectivos concursos para juízes em suas respectivas regiões.
Você acredita que o Enam realmente valoriza a vocação dos candidatos como é o propósito? Por que?
Eu penso que sim. Como falei anteriormente, trazer noções de direitos humanos e do lado humanístico para a avaliação, indo além do conhecimento técnico que se aprende durante a faculdade de Direito e durante o estudo para as provas, já demonstra que o Enam busca outro caminho.
Qual é o maior benefício do Enam?
Ser um evento unificado, que acontece em todos os lugares de um país de dimensão continental como o Brasil, é sem dúvida um diferencial. Colocar em pé de igualdade todos aqueles que querem concorrer a um cargo no Judiciário é um dos grandes benefícios do Exame da Magistratura e da sociedade brasileira. Lidamos diariamente com pessoas que buscam seus direitos, algumas em situações extremas de suas vidas, e são muitas realidades, muitas características específicas, regionais, sociais, de gênero, de raça. Isso torna a representação em tribunal um ponto importante. E o Enam é um passo nessa direção.
Como juiz, você considera que julgar, escolher entre dois lados, é uma atividade difícil?
Certamente, julgar é uma atividade extremamente difícil. A complexidade da tomada de decisões judiciais não se limita à escolha entre dois lados, mas envolve a responsabilidade de analisar os factos, interpretar a legislação, pesar os princípios e garantir que a justiça seja feita em cada caso específico. A função exige, além de imparcialidade e conhecimento jurídico, muito equilíbrio, sensibilidade e comprometimento com a justiça. Cada caso traz nuances específicas, fatos complexos e implicações que afetam diretamente a vida das pessoas envolvidas. Decidir entre duas partes exige uma análise minuciosa das provas, dos argumentos apresentados e da legislação aplicável, buscando sempre a real verdade e equidade. Além disso, é necessário estar consciente dos impactos das decisões tomadas, garantindo que estas contribuem para a manutenção do Estado de direito e para a promoção dos direitos fundamentais.
Quais são, na sua opinião, os principais atributos de um bom juiz?
Na minha opinião, os principais atributos de um bom juiz são, em primeiro lugar, a imparcialidade, para julgar de forma neutra e justa, e o conhecimento jurídico aprofundado, sempre atualizado. Além disso, é essencial a capacidade de ouvir e compreender as partes com empatia, bem como ter sensibilidade social, considerando o impacto das decisões na vida das pessoas. Ética e integridade são essenciais, assim como paciência e serenidade ao lidar com casos complexos. Um bom juiz também deve ter firme capacidade de decisão e estar constantemente atualizado diante das mudanças na lei.
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