O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, em entrevista à TV norte-americana CNBCnesta terça-feira (22/10), reforçou a importância da autonomia da autoridade monetária, chegou a criticar líderes que tentam minar a independência dos bancos centrais e voltou a defender o compromisso com o equilíbrio fiscal.
“Meu entendimento é que o banco central autônomo é muito importante para os governos, porque, no final das contas, quando as pessoas têm a expectativa de que você tenha o seu ciclo de política monetária separado do ciclo político, você tem mais credibilidade. Quando você tem mais credibilidade, você tem menos prêmio de risco na sua curva de taxas de juros e tem menos risco associado ao país. E quando temos isso, todas as outras políticas funcionam melhor”, explicou. “Ao minar a autonomia dos bancos centrais, o que muitos líderes estão a fazer é criar problemas para os seus próprios governos”, alertou.
Campos Neto lembrou que, em 2022, a taxa básica da economia (Selic) passou de 2% ao ano para 13,75% ao ano, em pleno ano eleitoral, devido à autonomia do Banco Central. “Foi o maior aumento nas taxas de juros da história dos mercados emergentes. E isso só foi possível porque tínhamos autonomia e isso foi muito bom para o país na altura”, afirmou.
Na avaliação de Campos Neto, as críticas aos bancos centrais, que prejudicam a independência dessas instituições, estão relacionadas a períodos de inflação muito baixa com taxas de juros muito baixas e que agora entraram em um novo ciclo de inflação mais alta, e, por isso, muitos os bancos centrais tiveram que agir. E, neste momento, o Banco Central do Brasil voltou a aumentar as taxas de juros, enquanto o Federal Reserve (Fed, banco central dos Estados Unidos) começou a cortar a taxa básica.
“Estamos em um ciclo diferente. O Brasil foi o primeiro a aumentar os juros, mas também foi o primeiro a cortar”, destacou Campos Neto. E uma coisa que, segundo ele, preocupa os mercados emergentes é que há uma expectativa de inflação mais alta nos EUA e, por conta disso, é provável que os juros não consigam cair tanto quanto poderiam. “E se for esse o caso, tem implicações para os países dos mercados emergentes”, acrescentou.
Em relação ao Brasil, o presidente do BC brasileiro lembrou que a atividade econômica é bastante resiliente e tem surpreendido. Além disso, o mercado de trabalho continua muito apertado e, devido a esse cenário, o BC passou a apertar a política monetária.
“Começamos a ver um hiato de produção positivo e também uma inflação esperada. Ambas as projeções de inflação, a inflação esperada começaram a ficar sem ancoragem. Então achamos que é apropriado, neste momento, começar a abordar esta questão. É muito importante comunicar às pessoas que levamos a sério o alcance da meta (de inflação), porque o Brasil tem uma memória muito elevada de inflação”, explicou, destacando que o Banco Central segue firme no compromisso de entregar o Programa de Consumo Amplo. Índice de Preços (IPCA) dentro da meta de 3% ao ano, enquanto as projeções do mercado já apontam o indicador no limite superior de 4,5%.
Segundo o presidente do Banco Central do Brasil, em diferentes ciclos, o país conseguiu trabalhar ao longo do tempo e, atualmente, o mercado está muito volátil devido à expectativa de recessão nos Estados Unidos, que, na sua avaliação, deveria não será muito forte e, portanto, a maior economia do planeta deverá ter um processo de desaceleração mais brando. “Achamos que o caso mais provável é uma aterragem suave (na economia dos EUA). Mas eu diria que o cenário de pouso difícil diminuiu a probabilidade e o cenário de não pouso aumentou”, afirmou.
Campos Neto também reforçou sua preocupação com as questões fiscais, não apenas no Brasil, e reforçou a importância de melhorar as contas públicas para que as taxas de juros também voltem a cair. Lembrou que, depois da pandemia de covid-19, quando os governos sincronizaram as políticas fiscais e monetárias e gastaram 20% do Produto Interno Bruto (PIB), no caso dos países desenvolvidos, e 10% do PIB, no caso das economias emergentes para estimular as respectivas economias e, como consequência, houve um aumento da dívida geral.
“Depois houve coordenação em muitos países diferentes com políticas monetárias e políticas fiscais. Essa coordenação foi muito boa e funcionou muito bem. E agora, saindo da pandemia, o que estamos vendo é que a política monetária está tentando fazer o trabalho, mas a política fiscal ainda é expansionista em muitos lugares”, explicou. “E o problema é que a dívida mundial cresceu muito. E, portanto, temos uma dívida maior e um custo de serviço da dívida maior, então isso em algum momento precisa ser resolvido”, explicou.
Na visão de Campos Neto, a questão fiscal é um problema para vários países. “Acho que a questão tributária é uma questão global. Em primeiro lugar, penso que as economias avançadas também aumentaram bastante a sua dívida. No caso do Brasil, o fiscal é mais um problema e quando você olha para o passado no Brasil, toda vez que o banco central no Brasil conseguiu reduzir as taxas de forma estruturada, isso foi associado a algum tipo de choque positivo na frente. fiscal”, destacou.
Para ele, em relação ao Brasil é muito difícil imaginar uma situação, daqui para frente, em que o país consiga conviver com juros muito mais baixos do que hoje. “A menos que sejamos alguns, seremos capazes de, de alguma forma, produzir um choque positivo no lado fiscal. O que eu acho que é o fator mais importante”, frisou.
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