Pouco mais da metade do território de São Paulo, maior cidade da América Latina, com 11,4 milhões de habitantes, são áreas verdes. É o que diz o prefeito da capital paulista, Ricardo Nunes (MDB), repetiu durante sua campanha à reeleição.
“Abri dez parques, aumentei a área de cobertura vegetal de 48 para 54% (…), fiz ações da Secretaria de Mudanças Climáticas, temos nosso Plano Municipal de Clima, fiz 620 mil podas [de árvores]”, afirmou no primeiro debate deste segundo turno, quando brigava com seu adversário, Guilherme Boulos (PSOL), sobre as responsabilidades pela crise no Enel depois do apagão de 11 de outubro.
A presença de remanescentes florestais nos extremos de São Paulo — uma fatia do Parque Estadual da Cantareira ao norte e do Parque Estadual da Serra do Mar ao sul — significa que a cidade possui um percentual relativamente alto de áreas verdes para uma metrópole de suas proporções. Mais uma das muitas peculiaridades da capital paulista, que entre outros apelidos é conhecida como “selva de pedra”. Não há como verificar a veracidade do número repetido pelo prefeito, porém, porque o estudo que o fundamenta ainda não foi divulgado.
Quando anunciado, em junho de 2023que a extensão das áreas verdes da capital atingiu 54%, a Secretaria do Verde e Meio Ambiente (SVMA) afirmou que os dados técnicos do levantamento serão compartilhados “em breve”. Um ano e quatro meses depois, a secretaria informou à BBC News Brasil que os dados deveriam ser publicados até o final de 2024, mas não deu motivos para o atraso.
Segundo a Rede Nossa São Paulo, organização da sociedade civil que publica há dez anos o Mapa da Desigualdade, a cobertura vegetal da cidade representa atualmente 48% do território, abrangendo desde reservas e áreas protegidas até parques, canteiros e gramados. Ou seja, dos cerca de 1.527 km² da capital paulista, 735,99 km² são áreas verdes.
O percentual coincide com a conclusão de estudo divulgado pela SVMA em 2020, resultado de mapeamento detalhado realizado em 2017 com laser LiDAR (Detecção e alcance de luz) baseado em voos em toda a extensão de São Paulo, metodologia com alto grau de confiabilidade, avalia Mayumi Hirye, coordenadora do MapBiomas Urbano e membro do LabQuapá da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP). ).
“Eles fizeram uma interpretação visual dos dados LiDAR com as ortofotos [imagens georreferenciadas sem distorções]é o máximo rigor que podemos ter, porque há pessoas a olhar realmente para as imagens e a interpretar os vários tipos de vegetação”, argumenta.
O sensoriamento LiDAR tem uma resolução muito alta, de 50 cm, o que permite mapear áreas muito pequenas de vegetação. Para efeito de comparação, a resolução da metodologia utilizada pelo MapBiomas, baseada em imagens de satélite, é de 30 metros. A vantagem, neste último caso, é o custo significativamente menor, o que permite o monitoramento contínuo das áreas monitoradas. A série histórica de cobertura e uso da terra do MapBiomas no Brasil vai de 1985 a 2023.
E é com base na tendência sinalizada por essas imagens da cidade de São Paulo – que mostram que a cidade continua crescendo, com perda de vegetação florestal e aumento de áreas impermeáveis - que Hirye olha com ceticismo para a expansão da cobertura vegetal anunciada pela prefeitura, de 48% para 54%, seis pontos percentuais em quatro anos.
“Acho pouco provável que esse aumento tenha existido. Há uma diferença metodológica entre o nosso levantamento e o deles, mas, na tendência, o que vemos é uma pequena diminuição dessa vegetação mais significativa e um pequeno aumento da área urbanizada.”
Por um lado, continua ela, há uma pequena diminuição da vegetação nas bordas da Serra da Cantareira, atravessada em diferentes trechos pelo Rodoanel, e da Serra do Mar, além de um avanço na urbanização sobre áreas de vegetação esparsa , que até então funcionava como uma espécie de pasto.

Distribuição desigual de verde
As áreas verdes de São Paulo estão distribuídas de forma bastante desigual no mapa da cidade. A maior parte deles, na verdade, não está concentrada nas áreas urbanas. Segundo estudo divulgado em 2020 pela SVMA, que mostra cobertura vegetal em 48% do município, a parte rural (31,78% do território) tinha 79,37% de cobertura vegetal, enquanto a parte urbana (68,22% restantes), concentrava apenas 33,65%. A discrepância, segundo o texto, explica “o provável impacto na percepção de alguns moradores de que São Paulo é uma cidade onde predomina o concreto”.
A cobertura vegetal na capital paulista não é apenas baixa, mas extremamente mal distribuída. Em 46 dos 96 bairros da cidade, a área verde é inferior a 20%, segundo o Mapa da Desigualdade, da Rede Nossa São Paulo. Essa assimetria tem uma série de consequências negativas para a cidade e impacta tudo, desde a sensação de bem-estar dos moradores de São Paulo até a resiliência da cidade a eventos climáticos extremos.
A arborização esfria ilhas de calor, fenômeno que eleva a temperatura em áreas urbanizadas, e funciona como uma espécie de esponja para a água da chuva. Nesse sentido, São Paulo tem um grave problema de falta de vegetação ao longo dos cursos dos rios, o que aumenta a probabilidade de inundações durante as tempestades. “Se o fundo do vale for impermeável, a água que chega lá sobe rápido, porque não tem para onde ir. Quando tem vegetação, funciona como uma espécie de esponja, a água é absorvida”, diz Hirye, do MapBiomas.
“Não basta ter apenas uma percentagem de vegetação, temos que distribuir isso de forma mais inteligente pela cidade, para que essa vegetação possa realmente cumprir o seu papel em termos de microclima, de absorção de água e até da questão de ser capaz de reter alguma coisa. do material particulado que circula na cidade”, acrescenta o especialista.
Pode parecer contraintuitivo, mas o aumento da arborização também reduziria o número de quedas de árvores durante as tempestades, acrescenta Marcos Buckeridge, professor do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (USP) e estudioso de arborização urbana. “Em uma tempestade, o vento se dissipa nas copas das árvores. Quanto mais árvores, menor a probabilidade de elas caírem, porque elas protegem umas às outras”, diz Buckeridge, que é um dos colaboradores do estudo. Plano Municipal de Arborização Urbana Paulistana.

Florestas e árvores em São Paulo
Ambos os especialistas concordam que as áreas florestais remanescentes nos extremos de São Paulo são muito importantes do ponto de vista da mitigação climática, já que são conhecidas as ações para reduzir os efeitos das mudanças climáticas.
Essas áreas verdes retiram grande quantidade de dióxido de carbono da atmosfera e produzem grande volume de vapor d’água, o que tem a capacidade de tornar o ar da cidade mais fresco, úmido e menos poluído, afirma Buckeridge.
“Manter as florestas periurbanas é superimportante. São uma vantagem que a Região Metropolitana de São Paulo tem em relação a outras cidades do mundo. Los Angeles, por exemplo, fica em uma região muito seca”, afirma o professor da USP.
Em relação à arborização, acrescenta, é necessário aumentar a cobertura vegetal nas regiões da cidade onde ela é escassa, como na zona leste, e melhorar a gestão onde tem maior penetração, como na zona oeste. Nesse sentido, a prioridade deve ser podar melhor as árvores e monitorá-las para evitar que danifiquem a fiação elétrica.
A avaliação ecoa a afirmação do botânico Ricardo Cardim deu BBC News Brasil logo após o apagão de outubro, quando a queda de árvores foi responsabilizada pela crise por diversas vozes, da Enel ao ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira. “O problema é a falta de manutenção, de cuidado. As árvores caem porque estão doentes, porque estão sofrendo, independentemente de um evento climático”, afirmou.
Esse é um dos temas ao qual o grupo de pesquisa de Buckeridge tem se dedicado, desenvolvendo softwares que possam auxiliar nessas tarefas com o auxílio da inteligência artificial. Um dos projetos mais avançados é um ultrassom capaz de medir a saúde das raízes.
O professor faz parte de um grupo de cientistas que há anos colabora com a prefeitura de São Paulo e desenvolve um trabalho que, na sua opinião, é positivo e não foi “atrapalhado” pela política. “São Paulo tem uma força científica razoável para trabalhar com arborização.”
O que Nunes e Boulos propõem
As propostas de Ricardo Nunes (MDB) e Guilherme Boulos (PSOL) para a gestão verde e construção de resiliência climática na cidade são, em geral, semelhantes.
O plano de governo do atual prefeito prevê a criação de novos parques, a revitalização dos existentes e a ampliação da arborização, a criação de áreas verdes estratégicas para enfrentar as ondas de calor e a proteção e recuperação de áreas de bacias hidrográficas.
A do candidato do PSOLpor sua vez, prevê obras de drenagem de cheias que combinem infraestruturas tradicionais com outras “verdes”, com a ampliação de áreas permeáveis, a criação de corredores verdes, especialmente em ilhas de calor, e um programa de recuperação de áreas de bacias hidrográficas.
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