Em meio ao nervosismo do mercado com a política fiscal do governo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se reuniu nesta segunda-feira (11/04) com ministros no Palácio do Planalto para discutir medidas de contenção de despesas obrigatórias. A reunião começou por volta das 15h30 e terminou por volta das 18h45, sem qualquer anúncio oficial.
Houve apenas um comunicado do Tesouro, informando que, na reunião, “foi apresentado e compreendido o quadro fiscal do país, bem como as propostas em discussão”. “Nesta terça-feira (11/05), outros ministérios serão convocados pela Casa Civil para que também opinem e contribuam no âmbito das mesmas informações”, acrescentou a nota.
Inicialmente, a reunião no Planalto contou apenas com a presença de ministros integrantes da Diretoria de Execução Orçamentária (JEO), formada pelo chefe da Fazenda, Fernando Haddad; e as ministras do Planejamento, Simone Tebet; da Administração, Esther Dweck, além do chefe da Casa Civil, Rui Costa.
Posteriormente, os Ministros da Educação, Camilo Santana; Saúde, Nísia Trindade; e Trabalhista, Luiz Marinho. Também integraram o grupo os secretários de Fazenda Dário Durigan e Guilherme Melo, junto com a secretária-executiva da Casa Civil, Miriam Belchior.
Haddad cancelou sua viagem à Europa a pedido de Lula, depois que o dólar disparou na semana passada. A mudança de planos surgiu na sequência da pressão para avançar a proposta de revisão das despesas, que a equipa económica prometeu definir após as eleições autárquicas.
Antes da reunião, o ministro afirmou que as medidas “têm diversas definições muito avançadas” e que o anúncio depende de Lula, mas sinalizou que deve acontecer nos próximos dias. “O presidente passou o fim de semana trabalhando no assunto, pedindo que técnicos viessem a Brasília para apresentar detalhes a ele. Acho que estamos na reta final”, destacou.
A discussão sobre o pacote de corte de gastos já dura há duas semanas. A equipa económica tem estado a analisar o tema mas, até ao momento, as medidas em estudo ainda não foram detalhadas, o que tem gerado nervosismo no mercado financeiro.
“A minha viagem (à Europa) dependia dessa definição, se seria esta semana ou na próxima que os anúncios seriam feitos. Como o presidente pediu para ficar e como as coisas estão muito avançadas do ponto de vista técnico, acredito que estamos prontos para anunciar ainda esta semana”, afirmou Haddad.
Um dos pontos em questão é uma forma de enquadrar determinadas despesas obrigatórias no limite de crescimento dos gastos previsto no marco fiscal, de até 2,5% acima da inflação.
Entre as alternativas estudadas está a criação de mecanismos que acionem cortes automáticos nas despesas obrigatórias caso a receita não atinja determinados valores. Segundo técnicos familiarizados com as discussões, o limite para restrições obrigatórias com gatilhos de contenção seria uma forma de orientar as expectativas dos agentes econômicos.
As despesas obrigatórias representam 92% das despesas primárias. Há uma expectativa sobre os gastos com a Previdência Social, que representam o maior valor de gastos da União. A equipe econômica já afirmou que desta vez o corte de gastos virá por meio da PEC (Proposta de Emenda à Constituição), que depende da aprovação do Congresso.
Ofensiva contra cortes
Na semana passada, os Ministros da Educação e do Trabalho fizeram declarações controversas sobre possíveis cortes nas respectivas pastas. Em meio às discussões, surgiram rumores de que o governo estudava mudanças no seguro-desemprego e na multa de 40% por demissão sem justa causa.
Marinho afirmou não ter sido consultado por outros membros do governo sobre a agenda de revisão de gastos e ameaçou renunciar caso a decisão não contivesse sua participação. As despesas obrigatórias incluem benefícios previdenciários, benefícios assistenciais, folha de pagamento e benefícios como seguro-desemprego. “Se você nunca discutiu isso comigo, essas medidas não existem. Se eu sou o responsável pela questão do trabalho e do emprego (esse debate não existe), a não ser que o governo me demita”, disse aos jornalistas.
Já Santana se posicionou durante a Reunião Global de Educação do G20 —grupo das 19 maiores economias do planeta, mais a União Europeia e a União Africana— dizendo ser “definitivamente contra” um corte de gastos na área .
No caso da educação, os principais programas afetados, no caso da educação, seriam o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) e o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDTC).
Expectativa do mercado
Em meio às discussões governamentais e às vésperas das eleições norte-americanas, o dólar registrou forte desvalorização frente ao real. Ontem, a moeda norte-americana caiu 1,48%, cotada a R$ 5,78. Apesar da tensão em torno do resultado das eleições nos EUA, o mercado interno reagiu positivamente ao anúncio de que o Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, permaneceria no Brasil.
Para Bruno Komura, analista da Ouro Preto Investimentos, é preciso aguardar o resultado das negociações. “É claro que esse sinal (Haddad no Brasil) não é suficiente para mudar o ânimo do mercado, tanto que as condições que vimos hoje são semelhantes às do fechamento da última quinta-feira. Precisamos ver mais medidas do que discursos atualmente, mas o governo parece ter vontade de melhorar a situação”, avalia.
Na opinião do sócio da GWX Investimentos, Ciro de Avelar, a expectativa é que o dólar permaneça no patamar atual, acima de R$ 5,70, durante esta semana, aguardando o resultado das eleições nos EUA, que só poderá ser divulgado na próxima fim de semana.
“Todos ainda estão muito cautelosos para os próximos dias, porque o dólar ainda pode subir muito, dependendo do que acontecer com as eleições americanas. Se o anúncio dos ajustes fiscais não for condizente com a realidade do Brasil, ou com a implementação dos quais esses cortes podem acontecer, veremos também uma fuga de dólares no país”, avalia o especialista.
Ainda segundo o especialista, uma vitória de Kamala Harris pode significar menor probabilidade de valorização do dólar e aumento da inflação nos EUA. “Se Trump for o vencedor, as medidas protecionistas que pretende implementar irão gerar inflação e taxas de juro mais elevadas nos Estados Unidos. Então isso vai acabar desvalorizando o real”, destaca.
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