A descoberta do plano golpista, incluindo os assassinatos do presidente da República, do vice-presidente e de um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), não surpreende os especialistas. O professor e advogado Rodrigo Lentz, do Departamento de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB), e pesquisador do Instituto Tricontinental com foco na área militar, lembra que, logo após a Segunda Guerra Mundial, as Forças Armadas Alemãs aboliram o especial forças que tinham ligações com o nazismo. Já o Brasil não promoveu mudanças nas Forças Armadas quando a ditadura terminou e o regime democrático foi instaurado.
“Infelizmente não estou chocado com todas essas informações. Embora os detalhes me deixem perplexo, o que aconteceu foi óbvio. O Brasil escolheu a impunidade e há um certo culto entre as instituições militares em relação ao que aconteceu em 1964. Para muitos, houve uma ‘democracia’. revolução’ aí”, destacou o professor. “As Forças Armadas têm algo de resistência e estrutura. O que surpreende é que, pela primeira vez, civis, no caso, policiais federais, prenderam militares de alta patente. “
Para Lentz, as mudanças nas Forças Armadas virão porque afetam o Judiciário, mais precisamente o STF, com ameaça de morte a um ministro – Alexandre de Moraes. “Mudanças certamente virão, por isso colocou o STF em situação suscetível”, afirma.
Já para o advogado Leonardo Pinheiro, professor de direito administrativo e constitucional, quaisquer alterações são mais do que necessárias porque a apreensão está presente no país. “Não há como não ter medo de tudo que vem à tona, porque subverte a ordem democrática. Infelizmente, a impressão que se tem é que o ambiente golpista não foi tão distante quanto se imaginava”.
O advogado Francisco Zardo destacou a necessidade de distinguir entre processos em curso: há pedidos de acusação; alegações de ruptura da ordem democrática, com ameaças de golpe de Estado; e funcionários públicos militares e civis envolvidos.
Reiterou que há medidas previstas para punir eventuais condenados, que vão além das penas criminais. Os ativos poderão sofrer processos disciplinares e ser afastados das atividades profissionais, podendo ter seus salários suspensos. Os que estão na reserva ou aposentados podem perder aposentadorias e pensões. “Os órgãos são independentes, mas devem manter a coerência entre si”, afirmou Zardo, referindo-se à autonomia das investigações, mas, ao mesmo tempo, à ligação entre elas.
Reuniões com liderança militar
As investigações da Polícia Federal, focadas no inquérito submetido ontem ao Supremo Tribunal Federal (STF), concluíram que o planejamento da ruptura democrática teve reuniões com lideranças das Forças Armadas, produziu minutas de atas golpistas, planilha com detalhes da atuação e esboço de um “gabinete de crise” que seria instalado após o envenenamento do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a “eliminação” do ministro Alexandre de Moraes por meio de artefato explosivo.
A PF indiciou todos os integrantes de um grupo que havia sido denominado, ao longo da investigação, como Núcleo de Oficiais de Alta Escalão —militares que, “usando-se da alta patente que ocupavam, atuaram para influenciar e incitar o apoio aos demais núcleos de atuação”. através do endosso de ações e medidas a serem adotadas para consumar o golpe de Estado” (leia reportagem na página 4).
O relatório das operações Tempus Veritatis e Contragolpe deverá ser enviado à Procuradoria-Geral da República (PGR) na próxima semana. Em outros casos em que o ex-presidente Jair Bolsonaro já havia sido indiciado, houve ocasiões em que o PGR, Paulo Gonet, solicitou medidas adicionais, informações adicionais e todas as informações coletadas nas operações.
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