O ex-presidente JairBolsonaro é um das 37 pessoas indiciadas pela Polícia Federal (PF) pelos crimes de golpe de Estado, abolição violenta do Estado Democrático de Direito e organização criminosa.
Além do ex-presidente, a lista inclui ex-ministros, militares e aliados de Bolsonaro, como os generais Augusto Heleno e Braga Netto.
O inquérito da Polícia Federal foi analisado pelo ministro Alexandre de Moraes, que retirou o sigilo do caso e encaminhou o relatório à Procuradoria-Geral da República nesta terça-feira (26/11).
Apesar do seu peso e impacto político, a acusação não é uma condenação nem significa que a pessoa investigada será automaticamente levada a julgamento.
Serve para apoiar o trabalho do Ministério Público (no caso, a Procuradoria-Geral da República), que decidirá sobre a continuidade do processo.
Esta nem é a primeira vez que a PF indicia Bolsonaro. Ele já foi apontado pela polícia como autor de crimes em duas investigações policiais: o caso das joias sauditas e a fraude do cartão de vacinação. Sua defesa nega que ele tenha cometido qualquer crime.
O indiciamento também não significa que a pessoa será presa: a pena só será cumprida ao final de um processo, caso haja condenação e tenham sido esgotadas todas as possibilidades de recurso.
Só existe a possibilidade de uma pessoa ser presa mais cedo se for flagrada em flagrante ou se o Tribunal entender que representa perigo imediato para a sociedade ou pode dificultar o andamento do processo. Até o momento, não houve mandado de prisão contra nenhum dos acusados.
Bolsonaro falou sobre o assunto pela primeira vez nesta terça-feira.
“Nunca discuti um golpe com ninguém”, disse ele. “Se alguém viesse falar comigo sobre um golpe, eu perguntaria: “E o dia seguinte? Como nos posicionamos diante do mundo?”, disse Bolsonaro
Mas o que significa a acusação e o encaminhamento para a PGR e o que acontece agora?
Trajetória definida
O indiciamento é um ato formal da polícia que ocorre quando acredita haver provas suficientes de que o investigado cometeu um crime. O processo segue então uma trajetória bem definida, que passa por diferentes esferas do sistema de Justiça.
No caso em questão, a Polícia Federal concluiu o inquérito que apura a existência de tentativa de golpe de Estado no final de 2022, após Bolsonaro perder as eleições, e concluiu que há indícios de que as 37 pessoas – incluindo o ex-presidente – foram os autores destes três crimes.
Embora seja o primeiro passo para a abertura de um processo criminal em tribunal para que o arguido possa defender-se e ser julgado, a acusação não significa necessariamente que a pessoa será processada: são necessárias outras etapas para que isso aconteça.
Assim como nos outros dois casos, o indiciamento relativo à tentativa de golpe de Estado significa que a PF entregou
as suas conclusões ao Ministério Público (MP), órgão responsável por dar os próximos passos.
Como o caso tramita no Supremo Tribunal Federal, a Justiça precisava autorizar a investigação para seguir para a próxima etapa, e quem o recebeu foi a Procuradoria-Geral da República, órgão que comanda o Ministério Público.
Reclamação em tribunal
Após qualquer indiciamento policial, o Ministério Público (no caso, a PGR) recebe o inquérito policial e pode seguir um de três caminhos:
- O órgão pode entender que não houve crime ou que o autor indicado pela polícia não é correto e arquivar o caso;
- Você pode entender que há indícios de crime, mas que são necessárias mais provas e pedir mais informações à polícia;
- Ou você pode concluir que existem provas suficientes e apresentar uma queixa contra o acusado em tribunal.
No caso em questão, caso decida apresentar denúncia à Justiça, a PGR denunciará Bolsonaro e os outros 36 réus ao Supremo Tribunal Federal – que pode aceitar ou não a denúncia.
Se a denúncia for aceita, o STF iniciará então um processo criminal contra os acusados, que se tornarão formalmente réus no processo.
A partir deste momento, os arguidos têm o direito de acesso às provas e têm a oportunidade de apresentar a sua defesa ao Tribunal.
O processo segue então o rito normal de um processo criminal, com uma diferença: as instâncias envolvidas.
Normalmente em um processo criminal, o réu, se condenado, tem direito de recorrer à segunda instância da Justiça, ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e, em alguns casos, ao STF.
Porém, o caso em questão já tramitaria diretamente no STF e, embora os réus possam apresentar recursos e decisões recursais, não há possibilidade de recurso para um tribunal superior, pois o STF já é a instância máxima da Justiça brasileira.
Embora Bolsonaro não tenha mais foro privilegiado após deixar o cargo de presidente, a investigação da PF precisou ser autorizada pelo STF por estar relacionada a outras investigações que já existem com aprovação do STF.
O relator do caso no Supremo, ministro Alexandre de Moraes, toma as decisões referentes à investigação, mas se de fato for aberto um processo criminal, os acusados serão julgados por uma coletividade de ministros.
Crimes e prisão
Dois dos crimes pelos quais Bolsonaro e seus aliados são acusados foram previstos para 2021.
Este ano, a Lei de Segurança Nacional, criada durante a ditadura, foi revogada e o Código Penal foi alterado para conter novas descrições de crimes contra o Estado Democrático de Direito, ou seja, um Estado onde o povo escolhe seus líderes e que é governado por regras e leis que todos precisam seguir.
Os crimes de Abolição Violenta do Estado Democrático de Direito e Golpe de Estado são bastante semelhantes, explica o advogado Acácio Miranda da Silva Filho, mestre em direito penal internacional pela Universidade de Granada (Espanha).
Enquanto a Abolição Violenta do Estado Democrático visa impedir o livre exercício de qualquer um dos poderes (Executivo, Judiciário, Legislativo) que compõem o Estado; Um golpe de estado é uma tentativa de derrubar um governo democraticamente constituído.
Como ambos são crimes recentes, não há jurisprudência sobre eles, ou seja, não há decisões anteriores sobre eles que possam embasar a Justiça no caso, afirma Miranda da Silva.
Porém, segundo o advogado, é possível entender que ambos são crimes subsidiários, ou seja, que se ambos fossem cometidos, o mais grave (golpe de estado) “absorveria” o menos grave (abolição do Estado). ) – ou seja, a pessoa só responderia pelo mais grave.
É como quando alguém esfaqueia outra pessoa com a intenção de matá-la. Tecnicamente, foram cometidos dois crimes: lesão corporal e tentativa de homicídio. Como o homicídio é o mais grave, o réu é apenas responsável por ele.
Neste caso, Bolsonaro e seus aliados foram indiciados por três crimes. Se condenados, poderão receber sentenças:
- Entre 4 e 8 anos pelo crime de Abolição Violenta do Estado Democrático de Direito; além da pena correspondente à violência utilizada;
- Entre 5 e 10 anos pelo crime de Organização Criminosa;
- Entre 3 e 10 anos pelo crime de Golpe de Estado
Se condenados, os réus só iniciam o cumprimento da pena após o trânsito em julgado do processo, ou seja, encerrada a possibilidade de recurso.
Contudo, qualquer um deles poderá ser preso preventivamente, a pedido do MP, caso o Tribunal entenda que apresentam perigo imediato à sociedade ou podem dificultar o andamento do processo.
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