Há 25 anos, um menino chamou a atenção do mundo ao estrelar, ao lado de Fernanda Montenegro, um filme brasileiro que chegou ao Oscar. Vinícius de Oliveira, então com 13 anos em 1999, deu vida a Josué em Brasil Centralfilme que concorreu ao prêmio de Melhor Filme Estrangeiro e deu à rainha da dramaturgia brasileira a oportunidade de concorrer ao prêmio de Melhor Atriz em Hollywood. Agora, o menino cresceu e, aos 37 anos, atua em produções de streaming como Os Quatro da Candelária e Qualquer diaveja a oportunidade de Eu ainda estou aquidirigido pelo mesmo Walter Salles que revelou estar na disputa pela icônica estatueta.
Confira a conversa do ator com Correspondência.
Entrevista | Vinícius de Oliveira
Você estreou como ator audiovisual em um filme emblemático, Brasil Central. Quais são as lembranças mais memoráveis que você tem desse período?
Minhas lembranças daquela época são muito vívidas. Foram momentos muito incríveis, desde as filmagens no Rio de Janeiro, na Central do Brasil — que é um lugar enorme, com um vai e vem intenso de gente —, até quando viajamos para o Nordeste, com a realidade do final dos anos 90, conhecer novas pessoas e lugares. Nos bastidores adorei estar com a equipe, sempre ajudei no que precisassem. Foi muito curioso e era um universo muito novo para mim. Eu me diverti muito atrás das câmeras, observando todo mundo trabalhando – tenho isso vividamente na minha memória. Foram momentos muito ricos, em que aprendi muito sobre cinema. Minha vontade de dirigir vem daí, de ver o movimento do cenário, de ver o Valter dirigindo…
Agora, 25 anos depois, ainda estou aqui revivendo aquele momento, com a chance de representar o Brasil no Oscar. Como você acha que a injustiça agora pode ser reparada?
Todos torcem pela indicação do filme ao Oscar, assim como pela indicação de Fernanda Torres de melhor atriz. E também fiquei muito animado com a indicação ao Globo de Ouro. Mas, em relação ao Oscar, se o filme ganhar, não creio que seja uma reparação porque se falarmos A vida é belanão é aquele filme que você assiste, você pensa: “Nossa, é duvidoso, por que bateu o nosso filme?”. Claro que existem outras questões que envolvem isso, como a temática que tem certo favoritismo nos Estados Unidos — vocês podem notar, todos os filmes que vão concorrer ao Oscar, principalmente os filmes estrangeiros, que têm a temática do Holocausto, na maioria da vez vencer. Isso porque há muitos judeus em Hollywood e eles são a turma do grande dinheiro, que pode fazer uma campanha muito forte. Mas, sem dúvida, a injustiça foi com Fernanda Montenegro, porque o trabalho dela é excepcional e nem se compara ao que Gwyneth Paltrow fez em Shakespeare apaixonado. Neste lugar, acho que foi injusto. E depois, com a Fernandinha, podemos ver algo de reparação, até porque se ela ganha é também porque fez um trabalho extraordinário e lindo. Assim como o filme, também é incrível e muito comovente.
O cinema brasileiro tem joias que reforçam nossa qualidade também na sétima arte. E você está no elenco de vários filmes premiados, como Linha de passe e boi néon. Você pode comentar?
A qualidade do cinema nacional já existe há muito tempo. Temos uma história muito rica e emblemática com grandes cineastas que deixaram um registro inestimável de suas obras. Hoje em dia estamos reforçando isso. Tivemos um ressurgimento na década de 90, assim como filmes levados para grandes festivais internacionais. Então, acho que a nossa dificuldade com o cinema nacional é manter a força, porque a qualidade já existe. E hoje, especialmente, também estamos saindo do eixo Rio e São Paulo e expandindo para outros lugares, sul, norte e nordeste, que trazem suas culturas ricas e diversas que valorizam ainda mais as histórias cinematográficas. Acho que o desafio é eles verem o cinema nacional como uma potência artística e económica do país. Essa é a nossa luta: garantir que o cinema tenha seu lugar de excelência nas políticas públicas. É inaceitável que mudemos de governo e que as artes fiquem “mancando”. A arte, dentro do país, também tem que ser soberana. Porque senão não teremos a nossa cultura fortalecida. Acho que esse é um dos maiores problemas do cinema nacional. Depois dos anos 90, estávamos indo muito bem. Durante o Governo Temer, o Ministério da Cultura foi extinto, depois com Bolsonaro, sofremos ainda mais. Agora com o novo governo ainda estamos correndo atrás, porque foram anos difíceis para nós. Esperamos que os próximos anos sejam mais potentes de conquistas, descentralização de verbas, com editais mais completos que dialogem com todos os interessados em fazer cinema e assim por diante…
Você está em The Candlemas Four e Any Day, série de streaming que retrata a dura realidade da violência no Rio de Janeiro. Como produções como essa impactam você?
As histórias de ambas as séries me impactam muito porque não posso viver neste mundo e não ser afetado pela tremenda violência que ele nos impõe. E, falando especificamente do Rio de Janeiro, lugar onde nasci e cresci, cresci na Favela da Maré, onde morei até os 12 anos, e também um lugar muito violento. Então, acho que a série destaca a importância de mostrar essa verdade através da arte e levá-la ao maior número de pessoas possível. E servem também como registo disponível, material documental, sobre a realidade do país em que vivemos. Acho fundamental que nos lembremos destas situações, tal como retratadas Os Quatro da Candelária e Qualquer dia – que fala sobre milícias tomando conta do Rio de Janeiro em tão grande escala. Acho que temos que levantar a voz, usar o nosso reconhecimento, como artistas, nos colocarmos diante da sociedade, nos indignarmos com todas as situações de violência.
E trabalhar na TV aberta faz parte dos seus planos? Você pretende fazer mais novelas?
Quero fazer e estou sempre disponível, isso está no meu radar. Não sei exatamente o que os produtores de casting em rede procuram como artistas, mas eu quero e estou aberto a isso.
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