Num dia em que o dólar voltou a disparar, chegando a R$ 6,20, o que obrigou o Banco Central (BC) a fazer duas intervenções no mercado de câmbio, a Câmara dos Deputados concluiu a aprovação da reforma tributária e, assim, acalmou o mercado. Nesta terça-feira, foram vendidos US$ 3,29 bilhões em duas operações para conter a cotação da moeda norte-americana e desacelerar a desvalorização do real. Mesmo assim, o dólar fechou em alta de 0,02%, cotado a R$ 6,0956.
Porém, a boa notícia foi que a Câmara concluiu a votação da reforma tributária, aprovada por 324 votos a favor contra 123. Essa decisão reduz as incertezas econômicas, que pareciam uma tempestade perfeita, porque o Senado havia aumentado a carga tributária com novas isenções , e o impasse permanece na votação do pacote fiscal do governo, que ainda corre risco de desidratação.
Em dezembro, sempre há alta sazonal do dólar, devido à remessa de lucros de empresas estrangeiras para o exterior, mas essa tendência foi anabolizada pelo comportamento do governo e do Congresso. A inflação acima da meta, o déficit além do previsto no quadro fiscal e o impasse na aprovação do pacote de cortes de gastos e reforma tributária tiveram forte impacto no mercado. O resto foi devido à especulação financeira.
O projeto aprovado esta terça-feira define as regras de cobrança dos três impostos sobre o consumo criados pela reforma tributária: IBS (Imposto sobre Bens e Serviços), CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços) e Imposto Seletivo. O CBS federal começará a ser cobrado em 2027 e o IBS, com receita compartilhada entre estados, DF e municípios, será cobrado gradativamente a partir de 2029. Junto com o Imposto Seletivo — apelidado de “imposto do pecado” por ser direcionado a produtos nocivos à saúde e ao meio ambiente — CBS e IBS substituem cinco tributos: ICMS, ISS, PIS, Cofins e IPI.
Como os deputados retiraram as alterações feitas pelo Senado, incluindo a exclusão dos refrigerantes do “imposto do pecado” e o desconto para serviços de saneamento, por exemplo, o bloqueio foi restabelecido para evitar que a alíquota geral do IBS e CBS ficasse acima de 26,5% . Com isenções do Senado, chegou a 28%. Em 2031, quando o governo federal e o Comitê Gestor do IBS (estados e municípios) avaliarem a transição para o novo sistema tributário, esse bloqueio será acionado.
A arrecadação do período de transição (2026 a 2030) servirá de base para a tarifa padrão que será cobrada a partir de 2033, quando todo o sistema será implantado. Caso essa alíquota ultrapasse 26,5%, o governo federal deverá enviar ao Congresso um projeto para adequar a tributação a esse patamar.
Pacote de gastos
A aprovação da reforma tributária, ao melhorar o ambiente institucional da economia e, consequentemente, a segurança jurídica, ajudou a conter a alta do dólar, mas também é necessário melhorar as expectativas do mercado com a aprovação dos cortes de gastos enviados pelo governo federal ao Congresso Nacional. Trata-se de uma economia esperada de R$ 70 bilhões nos próximos dois anos e de um total de R$ 375 bilhões até 2030.
Mesmo assim, o governo está a ser fortemente criticado porque o pacote é considerado insuficiente para satisfazer as necessidades fiscais. Porém, com o impasse no pagamento das emendas parlamentares, o mercado mudou o foco das críticas do Executivo para o Congresso. Ruim com o pacote, pior sem ele, esse é o raciocínio. De acordo com o quadro fiscal, o governo tem como meta zerar o défice público nos próximos dois anos — ou seja, gastar o que arrecada em 2024 e 2025. Como não alterou os gastos estruturais, as incertezas continuam.
Previdência social, benefícios reajustados pelo salário mínimo e pisos de investimento em saúde e educação são questões que só serão abordadas no próximo ano. Por isso, muitos investidores ainda não acreditam que as medidas propostas sejam suficientes para conter o aumento da dívida pública no longo prazo. Resultado: o dólar sobe, impacta a inflação (combustíveis, alimentos, remédios etc.), o Banco Central (BC) sobe os juros e o dólar dispara. Para ser travado, esse círculo precisa que o Congresso também faça a sua parte.
Nesta terça-feira, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que liderou a barganha com o governo para custear as emendas da comissão parlamentar (cujos autores não são revelados), sinalizou que pretende votar as medidas ainda esta semana : “Não estou garantindo aprovação ou rejeição. Vamos votar, estamos discutindo, conversando, dialogando, encontrando textos para votar, mas esse é o calendário de votação”, disse.
São duas conversas, uma é a discussão técnica sobre a eficácia das medidas propostas; a outra, negociações de bastidores para liberação das alterações, que não respeitam integralmente as novas regras de transparência e rastreabilidade estabelecidas pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
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