O música Milhões de anos atrásda cantora britânica Adele, deveria desaparecer, pelo menos temporariamente, do serviços de streaming como Spotify, Deezer e YouTube.
Depois do compositor Toninho Geraes acusar o artista de plágio, apontando a semelhança da música com Mulheresque foi escrita por ele e ficou famosa na voz de Martinho da Vila, uma decisão liminar do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) determinou que fosse retirada de plataformas ao redor do mundo.
Em caso de descumprimento, o desembargador Victor Agustín Cunha Jaccoud Diz Torres estipulou multa diária de R$ 50 mil, que entra em vigor a partir do momento em que as plataformas são formalmente notificadas pela Justiça.
Não há um prazo específico para que isso aconteça, o que explica por que a música continua disponível em playlists de streaming.
A medida tem alcance global, afirmam as advogadas Carolina Bassin e Maria Clara Fraga, especialistas em direitos autorais. Isso porque o Brasil, juntamente com outros 180 países, é signatário da Convenção de Berna, que há mais de um século reconhece a proteção dos direitos autorais de obras artísticas.
O acordo foi assinado inicialmente por dez países em 1886 na cidade suíça de Berna e, desde então, foi revisado e adotado por novos membros.
A iniciativa de proteger as obras artísticas a nível internacional surgiu na altura sob o incentivo de autores como o escritor francês Victor Hugo, autor de Os Miseráveisse O Corcunda de Notre-Dame.
Com a legislação de direitos de autor anteriormente restrita aos limites de cada país, os seus livros eram protegidos na sua França natal, mas podiam ser reproduzidos no Reino Unido, por exemplo, sem as mesmas salvaguardas.
No caso da ordem de retirada de músicas do streaming, como a decisão é liminar, ela também pode ser revertida, caso a parte processada – Adele, o produtor Greg Kurstin e as gravadoras Sony, Universal e Beggars – entre com recurso e esta for concedido, por exemplo, ou se decidir fazer um acordo com o autor da ação de plágio, Toninho Geraes.
Enquanto isso, o processo de plágio continua e, segundo especialistas em direitos autorais, deve durar muito tempo, como geralmente acontece em ações desse tipo. Isso porque há uma série de requisitos para comprovar o plágio na Justiça. Deve ficar claro, por exemplo, que o suposto autor do plágio já teria tido acesso ao conteúdo e o replicado intencionalmente, sem dar o devido crédito.
É por isso que, acrescentam, os custos da perícia neste tipo de ações são significativamente elevados e a razão pela qual muitas delas terminam num acordo entre as partes.
Um caso nesse sentido que ganhou bastante visibilidade no Brasil foi a briga judicial entre os cantores Jorge Ben Jor e Rod Stewart na década de 1970. A cantora brasileira processou a cantora britânica, alegando que Você acha que eu sou sexy foi plágio Taj Mahal.
Depois que a história ganhou exposição, Stewart fez um acordo com Jorge Ben. Ele admitiu ter ouvido Taj Mahal num carnaval do Rio de Janeiro e resolvi copiá-la pensando que ninguém iria notar, pois era uma música brasileira.
Produtor fã de música brasileira
A liminar completa, à qual a BBC News Brasil teve acesso, contém alguns argumentos de Toninho Geraes, representado pelo advogado Fredímio Trotta.
Entre os elementos apresentados como indícios de plágio estão um relatório de avaliação das duas partituras e a análise técnica das ondas sonoras (formas de onda) de ambas as melodias, que, segundo a decisão, apresentam “simetria indisfarçável”.
O argumento afirma ainda que o produtor Greg Kurstin é “estudioso e fã da música brasileira”. Ele menciona que fez um curso específico de música popular brasileira durante a faculdade e ressalta que “tem o hábito de compartilhar vídeos de música brasileira no Twitter, sendo a última postagem até um samba composto e interpretado por Paulinho da Viola”.
A decisão detalha que, antes de entrar com a ação no Rio, ainda em 2021, Toninho Geraes enviou notificações extrajudiciais à artista, ao seu produtor e às gravadoras buscando um acordo.
A Sony, segundo o texto, respondeu isentando-se de responsabilidade. A Universal, por sua vez, não reconheceu o plágio e apresentou parecer assinado por um músico apoiando sua posição.
Adele, o produtor Greg Kurstin e a gravadora Beggars não responderam à notificação extrajudicial.
O compositor entrou com a ação em fevereiro de 2024 pedindo, entre outras exigências, que o plágio fosse reconhecido e que lhe fosse atribuída a coautoria da música, para que a partir de então recebesse royalties sobre ela.
Na sexta-feira (20/12), ele participou de audiência de conciliação no TJ-RJ com representantes da Universal Music Publishing Brasil, editora de Adele no Brasil. Segundo o jornal O Globo, a reunião terminou sem acordo. A Universal não teria se aberto a reconhecer o plágio e não teria feito proposta a Toninho, que teria passado mal e tido uma crise de choro.
Adele, que até o momento não se manifestou sobre o caso, recentemente entrou em licença sabática e disse que ficará afastada dos palcos por um longo período.
A uma fã brasileira que subiu ao palco em um de seus últimos shows, a cantora afirmou que há 13 anos tentava incluir o Brasil em suas turnês, mas nunca havia conseguido por questões logísticas.
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