O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Flávio Dino determinou, nesta sexta-feira (23/12), a suspensão do pagamento de R$ 4,2 bilhões em emendas parlamentares e determinou que a Polícia Federal abra inquérito para apurar a liberação desses recursos. A decisão responde a ação apresentada pelo PSol, que apontou irregularidades na destinação de emendas de comissão — modalidade de repasse não obrigatória —, de autoria de cada comissão temática do Senado Federal e da Câmara dos Deputados, com recursos financeiros do orçamento público e direcionado aos estados e municípios.
O PSol destacou que parte dos recursos foi direcionada ao estado de Alagoas, reduto político do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), o que seria ilegal no entendimento do partido. Por meio da Casa Civil da Presidência da República, o governo federal não identificou irregularidades e autorizou os repasses.
Flávio Dino determinou que a Câmara publicasse, no prazo de cinco dias, as atas das reuniões da comissão que aprovaram as alterações. Os documentos deverão ser encaminhados à Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República, chefiada pelo ministro Alexandre Padilha. O pagamento só será liberado após análise da ata, caso atendam aos critérios de transparência e rastreabilidade definidos pelo STF.
“Noto possível perpetuação da ocultação do(s) parlamentar(es) ‘solicitante(s)’ de ‘emendas de comissão’ (RP 8), através do ‘patrocínio’ das emendas por líderes partidários que assinaram o ofício enviado ao Poder Executivo Este facto indicia uma violação da decisão deste Tribunal, de Dezembro de 2022, no sentido de que é apresentada ‘informação completa, precisa, clara e sincera’ sobre o processo orçamental”, explicou o ministro, no seu despacho.
“A decisão do Supremo Tribunal Federal indica que as alterações terão que passar por deliberação das comissões com registro em ata, o que não aconteceu”, corroborou o deputado federal, Gláuber Braga (PSol-RJ).
Orçamento 2025
Em agosto de 2024, Dino já havia suspendido os pagamentos por falta de transparência. No início de dezembro, após pressão dos parlamentares, autorizou a retomada parcial dos repasses, com cobranças de maior clareza na destinação dos recursos. No último dia 10, o governo federal publicou uma portaria interministerial que flexibilizou os critérios impostos pela Corte.
Na decisão de ontem, porém, o ministro alertou que, sem corrigir os problemas, o governo não poderá divulgar as alterações parlamentares ao Orçamento do próximo ano, que só serão votadas após o recesso parlamentar, a partir de fevereiro de 2025.
“Além das determinações acima emanadas, concordo que o Poder Executivo só poderá executar as alterações parlamentares relativas ao ano de 2025 com a conclusão de todas as medidas corretivas já ordenadas, notadamente os ajustes no Portal da Transparência e no Transferegov. br, com o registro de todas as informações a serem prestadas pelos órgãos do Poder Legislativo e do Poder Executivo”, destacou o juiz na decisão.
Favorecendo
Segundo a deputada federal Sâmia Bomfim (PSol-SP), a decisão do STF foi necessária. “Fica evidente que Arthur Lira infringe a lei quando, num golpe de caneta com outros dirigentes, destina mais de R$ 4 bilhões sem que a sociedade saiba o destino”, disse ao Correio.
O parlamentar critica a falta de obediência a critérios técnicos. “Houve, evidentemente, um favoritismo do estado do presidente da Câmara, e isso não obedece a nenhum critério técnico. Não observa quais são as reais necessidades, as prioridades, e não corresponde a uma uniformidade do diferentes regiões ou estados brasileiros”, enfatizou. Segundo o deputado, Arthur Lira “obedece apenas à vontade e ao desejo de favorecer sua base eleitoral”.
Quanto à decisão favorável de Dino ao pedido do partido, ela afirma ter sentimento de dever cumprido. “Desde o início do orçamento secreto, ainda no governo Bolsonaro, entramos com uma ação no STF. Na época, a ministra Rosa Weber acolheu a nossa representação e ordenou que esse esquema fosse interrompido. Infelizmente, Arthur Lira manobrou para que o esquema a irregularidade no Orçamento continuou”, disse Bomfim.
O relator do projeto de Lei Orçamentária Anual (LOA) 2025, senador Ângelo Coronel (PSD-BA), disse estar surpreso com a determinação. Ele afirma que a ação “prejudica o Parlamento”, afeta a relação entre os Poderes e pode atrasar a votação da peça para além de fevereiro.
O deputado José Nelto (União-GO), por sua vez, disse estar indignado com a decisão de Dino. Ele espera uma reação da Câmara, inicialmente recorrendo da decisão, mas espera também uma reação política. “Haverá reação porque as emendas são constitucionais. Ninguém aceitará perder recursos respaldados pela Constituição brasileira. Se o Congresso baixar a cabeça, o Supremo vai começar a legislar também”, afirma.
A decisão de Dino atinge um grupo de 17 líderes das bancadas da Câmara, que apresentaram carta na qual patrocinam R$ 4,2 bilhões em indicações para emendas em comissões. Porém, a combinação não atende aos requisitos de transparência exigidos pelo STF, mas garantiria R$ 50,5 bilhões em recursos sob responsabilidade dos parlamentares no Orçamento de 2025.
“Vamos votar tudo sem qualquer tensão, e que a independência dos Poderes não volte a cair neste fogo cruzado”, afirma o relator do Orçamento. Para ele, a decisão é redundante, porque o projeto de lei complementar aprovado pelo Congresso Nacional já prevê transparência e rastreabilidade.
O Correspondência Ele procurou a Presidência da Câmara dos Deputados para falar sobre o assunto, mas foi informado que Arthur Lira não comentaria a decisão de Flávio Dino. (Com agências)
*Estagiário sob supervisão de Vinicius Doria
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