Enquanto o mercado financeiro, que é o maior credor da dívida pública, continua a pressionar o governo para que faça um ajustamento fiscal robusto para reduzir a dívida pública, os subsídios estão novamente a aumentar e a pesar significativamente no Orçamento. Esta despesa raramente é atacada e revista, pois houve promessas de vários governos, sem sucesso. E essa conta é cada vez mais alta e, em 2022, ficou mais uma vez acima do patamar de 6% do Produto Interno Bruto (PIB), alcançado entre 2015 e 2016, em plena recessão do governo do ex-presidente Dilma Rousseff (PT).
O mantra dos especialistas em contabilidade pública é que melhorar a qualidade dos gastos é essencial para a retomada do equilíbrio fiscal. Portanto, controlar os gastos com subsídios e rever aqueles que não são essenciais e muito menos proporcionam retorno à atividade econômica deveriam ser o básico para qualquer gestor público. Mas, segundo dados do Painel Orçamentário, do Ministério do Planejamento e Orçamento (MPO), o total dos gastos com subsídios, que incluem renúncias fiscais, ou despesas tributárias, além de isenções financeiras e creditícias — que não aparecem explicitamente no Orçamento —, voltaram a crescer desde 2019 — primeiro ano do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) — e totalizaram quase R$ 650 bilhões em 2023. Esse valor representa um salto de 1.174,5% em 20 anos e 116% desde 2013, quando essa conta totalizou R$ 301 bilhões, ou 5,6% do PIB.
Os dados consolidados para 2024 ainda não estão finalizados. Mas, segundo cálculos do especialista em contas públicas Gabriel Leal de Barros, economista-chefe da ARX Investimentos, o percentual de 6% se repetirá, pelo menos até 2025. E, se considerarmos as projeções para o PIB nominal do Tesouro Nacional, de RR Com US$ 11,6 trilhões em 2024 e R$ 12,5 trilhões em 2025, estamos falando de um volume de gastos de R$ 696 bilhões e R$ 750 bilhões, respectivamente.
Diagnóstico
Os incentivos fiscais estão entre as despesas que mais pesam no Orçamento da União, a par da fatura dos juros da dívida pública e do défice da Segurança Social. De janeiro a novembro, segundo dados do Tesouro, o rombo da Previdência cresceu 7,2% em relação ao mesmo período de 2023, para R$ 307,8 bilhões. Portanto, este défice, que é bastante significativo, representa praticamente metade do total de subsídios pagos em 2023.
O diagnóstico de que é preciso rever os subsídios é conhecido, e no governo Michel Temer (MDB), com a regra do teto, esperava-se que as despesas tributárias fossem reduzidas pela metade ao longo do quadro fiscal, ultrapassando 4% do PIB. para 2% até 2026. Com isso, houve redução dos subsídios até 2018, mas desde 2019, quando a regra do teto começou a ser contornada, essa conta só cresceu. E, se considerarmos a manutenção dessa taxa de 6% para o PIB nominal previsto pelo Tesouro em 2026, de R$ 13,4 trilhões, será possível que essa conta chegue a R$ 804 bilhões. Esse valor se aproxima da fatura de juros nominais, de R$ 918,1 bilhões, equivalente a 7,8% do PIB. Esse indicador contribuiu para que o déficit nominal — que mede a necessidade de financiamento do setor público consolidado (que inclui os governos federal e regionais e os governos estaduais federais) — atingisse a cifra de R$ 1,1 trilhão, ou 9,5% do PIB, no mesmo intervalo. .
Pela previsão do governo no Projeto de Lei Orçamentária Anual (Ploa) deste ano — que ainda precisa ser aprovado pelo Congresso Nacional — só a despesa tributária deverá totalizar R$ 543,7 bilhões, ou seja, 72,5% do total dos subsídios, dado 3,8% acima do R$ Previsão de R$ 523,7 bilhões para 2024. No Ploa de 2025, o maior gasto tributário, de R$ 120,9 bilhões, é destinado ao Simples Nacional e R$ 51,4 bilhões para isenção da cesta básica —quase o dobro do ano passado: R$ 39 bilhões. Outras despesas de destaque nesta rubrica são incentivos fiscais à agricultura e agroindústria (R$ 83,1 bilhões), a entidades sem fins lucrativos, como igrejas (R$ 45,5 bilhões), a deduções do Imposto de Renda (R$ 34,7 bilhões) e à Zona Franca de Manaus. Zona (R$ 29,9 bilhões).
Olhando para o histórico de gastos com subsídios da União, o fim do teto de gastos contribuiu para esse aumento significativo dos subsídios. No governo Michel Temer (MDB), em função da entrada em vigor do teto de gastos — que previa a redução dos subsídios pela metade durante todo o período de vigência da emenda constitucional, que foi derrubada em 2023 e substituída pelo marco fiscal — foi possível observar uma queda tímida, após o pico de 6,7% do PIB em 2015, quando a conta total de subsídios totalizou R$ 399 bilhões. Após o mínimo de R$ 333 bilhões em 2018, o item voltou a crescer no primeiro ano de governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e continuou aumentando no primeiro ano de gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. (Ver tabela)
Os subsídios são uma conta que nenhum governo conseguiu atacar devido a lobbies adversários, principalmente. O MPO tem um grupo de trabalho para analisar os gastos, mas ainda não apresentou um programa consistente. No Ploa deste ano, o ministério prevê uma tímida redução de despesas, porque ataca apenas fraudes na concessão de benefícios. Procurados, o Ministério do Planejamento e o Tesouro Nacional não responderam até o fechamento desta matéria.
Para o economista José Roberto Afonso, professor do Instituto Brasileiro de Educação, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP), o gasto total com subsídios acaba sendo uma estimativa devido aos créditos, que são estimativas e dependem de hipóteses e metodologia adotadas. “Essas projeções são crescentes, mas falta transparência, ou seja, há necessidade de publicar os relatórios de cálculo e explicar melhor as premissas”, afirma Afonso, um dos autores da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
“O crescimento do volume de subsídios fiscais, financeiros e creditícios, tanto em valores nominais como em proporção do PIB, revela que, apesar das medidas específicas para reverter uma ou outra renúncia fiscal, o resultado geral ainda é tímido”, afirma Barros. Ele lembra que, após atingir 4,7% do PIB, ou R$ 439 bilhões em 2020, em plena pandemia de Covid-19, esse gasto expandiu para 6% do PIB em 2023 e esse patamar deve permanecer estável. E acrescenta ainda que houve uma piora significativa de vários indicadores fiscais e a situação se assemelha, “em grande parte”, ao governo Dilma.
“As renúncias fiscais representam cerca de 80% deste volume e, apesar da reforma fiscal sobre o consumo, uma parte notável dos setores que atualmente beneficiam de regimes especiais permanecerão assim após a implementação da reforma”, lamenta Barros. A recente alteração no sistema fiscal criará o Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) mais elevado do mundo, com uma taxa “em torno” dos 28% — devido às isenções fiscais —, acima dos 27% da Hungria, segundo dados da Organização para o Desenvolvimento Económico Cooperação (OCDE).
Dificuldades
Manoel Pires, economista e professor da Universidade de Brasília (UnB) e da Fundação Getulio Vargas (FGV), também reconhece que é preocupante o aumento dessa conta, principalmente das contas de crédito, que voltaram a crescer, mas não com a mesma intensidade como no passado. “Os subsídios ao crédito não são publicitados e, por isso, a importância deste estudo que as pessoas fazem é divulgar esse aspecto fiscal. Mas esta questão dos subsídios, nenhum governo conseguiu abordar adequadamente”, destaca. Ele lembra que o maior volume de subsídios ao crédito ocorre nos empréstimos com juros subsidiados dos bancos públicos e, no passado, os financiamentos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que representavam em média 2% do PIB, chegavam a 4%. do PIB, quando o banco aumentou significativamente a sua carteira, a partir de 2010. “Do ponto de vista fiscal, esta despesa está mais controlada. Chegou a cair para 0,7% do PIB e, atualmente, está numa proporção inferior, 1,1% do PIB. PIB”, ele explica.
Na avaliação de Pires, se o governo conseguir implementar o controle do crescimento das despesas, será possível observar um desempenho fiscal um pouco melhor do que o esperado pelo mercado. Ele reconhece também que, com o pacote fiscal, a situação melhorou um pouco com a imposição de um limite ao aumento real do salário mínimo, em linha com o quadro fiscal, de 2,5% acima da inflação. “Isso é positivo e, portanto, o estado efetivo das contas públicas é melhor do que quando não havia pacote. A questão principal, porém, é a expectativa para a dívida pública, que continua muito ruim. apresentou o pacote fiscal, reconhece que os desafios permanecem e que o que motivou as autoridades a fazerem o primeiro ajuste fiscal deve continuar para o processo de pactuação das contas públicas”, argumenta. Para Pires, diferentemente do mercado financeiro, ele não acredita que o governo esteja entregando a mercadoria, principalmente o ministro da Fazenda, Fernando Haddad. “Este ano, o governo precisará fazer novas contingências de despesas para conseguir cumprir a meta fiscal, como foi o caso em 2024”, afirma. O especialista em contas públicas reconhece ainda que, com a restrição orçamentária dos primeiros meses até a aprovação do Ploa na volta dos trabalhos — já que o governo só poderá gastar 1/12 do comprometimento previsto do Ploa até a aprovação do Orçamento, provavelmente, em abril, a tendência é que o resultado primário deste ano “poderia ser um pouco melhor” que as projeções iniciais.
Dívida crescente
Pelos cálculos de Felipe Salto, economista-chefe da Warren Investimentos, à medida que a inflação oficial ultrapassou o teto da meta em 2024, a nova trajetória dos juros é de alta, com indicação de que a taxa básica da economia (Selic), atualmente em 12,25% por ano, atingindo 14,25% em Março, pelo que isto “torna ainda mais difícil a estabilização da dívida pública”.
Apesar de acreditar que o governo conseguirá cumprir a meta fiscal deste ano, entregando um défice primário dentro do limite de 0,25% do PIB, ainda prevê saldos negativos nas contas de 2025 e 2026, de 0,6% e 0,8% do PIB. PIB, respectivamente. “A dívida bruta aumenta continuamente, a taxas decrescentes, atingindo 96,4% do PIB em 2034. As projeções, portanto, reforçam a necessidade de um esforço fiscal estrutural para garantir um desempenho económico positivo sustentado”, alerta.
Segundo dados do Banco Central, em novembro, a dívida pública bruta bateu novo recorde de valor, totalizando R$ 9,091 trilhões, equivalente a 77,7% do PIB — 0,1 ponto percentual menor que a taxa de outubro, quando totalizou R$ 9,032 trilhões.
A especialista em contas públicas Selene Peres Nunes, uma das autoras da LRF, avalia que os tropeços do governo com o anúncio do pacote fiscal e, mais recentemente, com a revogação da medida de fiscalização da Receita Federal nas operações via Pix, mostra que este governo não tem uma postura firme e, como resultado, há uma desconfiança crescente no mercado. Ela lembra que mesmo as projeções recentes do Tesouro confirmam uma deterioração nas contas públicas, mesmo com expectativas de aumento de receitas, mas sem reduções de despesas, e que não suportam uma previsão de superávit primário até 2026. “O país tem sido registrando déficit desde 2014 e o governo precisará rever a relação entre o Executivo e o Legislativo para administrar essa situação”, aconselha o economista.
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