A afirmação do presidente Donald Trump de que a América Latina depende mais dos Estados Unidos do que o contrário, e a ameaça de taxar 100% os países do Brics caso substituam o dólar como moeda de negócios, deixaram a diplomacia brasileira em alerta. Isso ficou claro no comentário feito ontem pela ministra interina das Relações Exteriores, Embaixadora Maria Laura da Rocha, logo após a confirmação do Embaixador André Corrêa do Lago como presidente da COP 30, em novembro, em Belém.
“O presidente Trump pode dizer o que quiser. Ele é o presidente eleito dos Estados Unidos. E analisaremos cada passo das decisões tomadas pelo novo governo. Acredito que, como somos um povo que tem fé na vida, tudo sempre vai dar certo. Vamos trabalhar e apoiar não as nossas divergências, mas as nossas convergências, que são muitas”, afirmou.
A mensagem de Trump à América Latina foi dada durante a assinatura das primeiras medidas de seu governo diante da imprensa, no Salão Oval da Casa Branca. Ao ser questionado pela jornalista Raquel Krähenbühl, da TV Globo, sobre quando conversaria com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e como via a relação dos EUA com a América Latina e o Brasil, ele foi incisivo:
“Ótimo. Deve ser ótimo. Eles precisam de nós, muito mais do que nós precisamos deles. Nós não precisamos deles, eles precisam de nós. Todos precisam de nós”, disse ele.
Em 2024, os EUA venderam mais ao Brasil do que compraram. Segundo o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Mdic), houve um déficit de US$ 253 milhões na balança comercial com os norte-americanos no período. O país exportou 40,33 mil milhões de dólares e importou 40,58 mil milhões de dólares em bens. No ano passado, os EUA foram o segundo maior parceiro comercial do Brasil.
Na reunião ministerial de segunda-feira, Lula disse que não queria brigar com ninguém —principalmente com os EUA. Em seu perfil no X (antigo Twitter), ele elogiou as relações entre os dois países.
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Ignorância
Roberto Goulart Menezes, professor de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB), considera um sinal de ignorância a afirmação de Trump sobre os EUA não dependerem do Brasil. Ele enfatiza que os norte-americanos estão interessados em conter a influência comercial da China no continente e que dificultar as relações com os países latino-americanos seria um erro estratégico. Para ele, a diplomacia brasileira tem sido cautelosa e deve continuar a fazê-lo.
“Trump tem três grandes temas na política internacional: o primeiro é a guerra na Ucrânia; o segundo é o Médio Oriente; e o terceiro é a China. Então, isto vai consumir muita energia dos Estados Unidos”, disse Menezes.
O professor lembrou que, ainda durante a gestão Trump, o Brasil continuou no acordo do Sistema Geral de Preferências (SGP) com os EUA — que concede benefícios tarifários a países do Hemisfério Sul que exportam para países do Hemisfério Norte.
Menezes, porém, observa que a preocupação do Ministério das Relações Exteriores (MRE) é que Trump inicie o segundo mandato mais experiente e tenha meios para retaliar os adversários. “Este Trump que está chegando conhece a máquina dos EUA. Ele não é o Trump do primeiro mandato, é aquele que sabe onde estão todos os botões e conhece as pessoas que sabem como pressioná-los. Isto é o que preocupa os líderes globais e o governo do Brasil”, afirmou.
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