Com a missão de ser embaixadora de Brasília, a marca Verdurão estampa, há mais de vinte anos, a identidade da capital do país, através do olhar de quem realmente conhece as pessoas que aqui vivem. Longe dos estereótipos que rondam a sede dos Três Poderes, a empresa comunica a brasilidade e defende o bioma mais devastado do país usando as roupas como ferramenta política.
A marca nasceu em 2002, para preencher uma lacuna percebida pelos fundadores. O casal roqueiro sentiu falta das camisetas da banda nos shows da cidade. As blusas começaram a fazer sucesso e as duas montaram uma barraca de lona verde nos eventos, que os torcedores marcaram como ponto de encontro e apelidaram carinhosamente de ‘barraca do Verdurão’. Um negócio com crescimento orgânico e espontâneo que, durante a pandemia, foi vendido e mudou de mãos, mudando também o foco da abordagem.
“Hoje nosso tema central é Brasília e o cerrado, porque é o bioma em que estamos inseridos e, por muito tempo, foi negado e ficou em segundo plano, mesmo entre os brasilienses, que não dão a mínima cerrado a importância que tem. . Há algum tempo, quando se falava em natureza, as pessoas pensavam nas florestas Atlântica e Amazônica. Mas aí descobrimos o quão importante é o cerrado. É o berço das águas do Brasil. Vimos que ninguém falava sobre isso, então, entendendo a importância desse bioma, decidimos dar destaque ao cerrado. Tudo é atitude política”, reflete o diretor de criação do Verdurão, Wesley Santos.
A roupa comunica
As roupas são potenciais ferramentas de comunicação e afirmação da identidade individual e coletiva, como explica Karla Beatriz, mestre em design e especialista em moda. “Uma parte da população ainda acredita que a roupa é apenas um tecido que serve de proteção. Não que não seja, afinal essa é uma de suas funções. Mas vestir é algo mais complexo que carrega também o conceito de comunicar a sua identidade e toda a sua cultura, aspectos políticos e intenções. A regionalidade é a concretude de todos esses conceitos, proteção, discurso político, identidade e cultura”, afirma o especialista.
No interior de Rondônia, na cidade de Ji-Paraná, um missionário, candidato e empresário iludido por teimosia imprime em camisas o conhecimento da Amazônia e as referências cafonas. A marca O BotoID – Identidade Beradeira foi criada por Isabele Fernandes Morgado, 36 anos. Formada em direito, desistiu de buscar um cargo público após passar em alguns concursos e não ser convocada. Decidiu então empreender um negócio com a ideia central de trazer a identidade regional para o centro da marca.
A falta de referências formais foi um desafio, mas o conhecimento popular e os processos de comunicação presentes na identidade popular amazônica e beradeira nortearam as estratégias e o design do BotoID. “Rondônia não é Roraima; Quissó Quente; Venha forte, sou do Norte; Telezé; Marrapáiz.” Essas são algumas das estampas presentes nas camisas desenhadas e confeccionadas por Isabele. “Infelizmente nosso frete não ajuda, mas enviamos para fora do estado e já enviamos até para Portugal! Nosso trabalho é um tanto educativo, pois precisamos mostrar o valor intangível que nossos produtos carregam. Boto Id é sobre cultura, identidade, representação e pertencimento! Nossa proposta é dar destaque às pessoas e pessoas que vivem na Amazônia”, afirma Isabele.
“Nosso foco principal não é só o verde da floresta, mas as pessoas que vivem dentro e no entorno da floresta, mostrando suas características, o que falam, o que comem. Então a nossa proposta é levar essa cultura para o mundo e também educar a nossa. Queremos que as pessoas aqui se identifiquem com a marca e que ela se torne referência, pois acreditamos que quem faz a cidade que moramos são as pessoas que moram lá e precisamos investir nas pessoas para que elas possam fazer a diferença e trazer a cultura do norte para o primeiro plano. ”, acrescenta o empresário.
Isabele trabalha sozinha e enfrenta o desafio de coordenar todos os aspectos de um negócio sem nunca ter iniciado um negócio. Assim como o BotoID, grande parte dos empreendimentos varejistas voltados à confecção e venda de roupas são realizados por Microempreendedores Individuais (MEIS). Segundo o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), os MEIS correspondem a 10% desse mercado.
Os empregos no setor têxtil vêm crescendo no país e tiveram saldo de 17 mil vagas formais no primeiro trimestre do ano, segundo dados do CAGED. No entanto, empresários do sector afirmam que a indústria do vestuário tem enfrentado dificuldades devido à falta de tributação das empresas estrangeiras de comércio electrónico.
O segmento busca, em conjunto com o Congresso e o governo, um ambiente de negócios mais favorável, com menores encargos e igualdade tributária entre empresas brasileiras e internacionais.
A Associação Brasileira da Indústria Têxtil (ABIT) afirma que há mais de 200 anos as confecções produzem roupas para brasileiros de todas as classes sociais e com preços compatíveis. E atualmente atende 80% do mercado nacional. A Associação afirma que a falta de equidade prejudica o mercado nacional e pode impactar diretamente na criação de empregos. “Não queremos que os sites sejam sobrecarregados. Nosso propósito prioritário é reduzir a carga tributária para todos. Mas, se a indústria e o varejo nacionais não tiverem seus impostos reduzidos, a isenção para plataformas internacionais não pode continuar, pois não podemos nos dar ao luxo de pagar tanto enquanto os estrangeiros se beneficiam de um privilégio fiscal generoso. Também usamos o comércio eletrônico no Brasil, mas não temos isenção de impostos federais. Igualdade de condições é crucial! Associação da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit).
A Confederação Nacional do Comércio (CNC) aponta que em 2023 a importação de vestuário isento de impostos aumentou 407% e mais de metade das peças tem origem na China. Alinhado ao entendimento da ABIT, o CNC também busca equilíbrio e simetria para garantir que as empresas brasileiras possam competir em igualdade de condições com as empresas internacionais. “Dar aos empresários chineses um nível de competitividade que os empresários brasileiros não têm ameaça a capacidade deles de gerar empregos aqui no país”, comenta o economista-chefe da CNC, Felipe Tavares.
Empreender é resistir
Diante do desafio, ela reflete o aprendizado que aprendeu nos três primeiros anos de marca e vislumbra expansão. “Entrei neste mundo sem saber muito de nada. Comecei como a maioria dos brasileiros: suposições. Mas eu estudei. Aprendi muito com a pré-incubação e aceleração da Secretaria de Desenvolvimento Econômico de Rondônia (Sedec), com a semente empresarial. Foi uma virada de chave. Também fiz vários cursos do Sebrae, principalmente online. Fiz marketing digital e fluxo de caixa, e também fiz sobre organização financeira, via WhatsApp. Gosto da praticidade e acessibilidade desses modelos de cursos, pois possuem uma linguagem de fácil compreensão e são muito diretos”, afirmou.
Wesley Souza, Diretor de Criação do Verdurão, afirma que, após ter uma carreira de sucesso no mesmo cargo em grandes agências de publicidade e dirigir inúmeras produções audiovisuais, enfrentar os desafios do mundo do empreendedorismo foi uma aventura surpreendente. “Quando me deparei com a questão do empreendedorismo e de fazer moda, foi uma coisa muito legal, porque, de certa forma, sempre toquei de alguma forma a vida das pessoas. Mas quando entrei neste mundo do empreendedorismo foi algo novo. Estamos fazendo coisas malucas e coisas diferentes. Então, ser empreendedor se transformou nessa grande aventura e tenho aprendido a cada momento”, afirma.
Tanto para Wesley, do Verdurão, quanto para Isabele, do BotoID, o empreendedorismo é uma forma de resistir e fortalecer a regionalidade. Eles descobriram que a moda era uma ferramenta para mostrar o conhecimento local e discutir as necessidades diárias do seu povo. “A moda fala do indivíduo e para o indivíduo. A ideia de usar a roupa como forma de expressar a sua identidade é indissociável. Mesmo quando o desejo é negar os propósitos da moda. A moda e suas escolhas são formas de pertencimento”, reflete a especialista em moda Karla Beatriz.
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