Hermeto Pascoal sempre se expressou através da música. A música é a forma como ele mostra o seu mundo aos outros, é a língua que ele fala. Por isso, foi com a música que Hermeto se declarou para Ilza da Silva, com quem esteve casado por 46 anos. Essa homenagem veio por meio do álbum Pra Você, Ilza, lançado esta semana pelo bruxo.
Ilza faleceu em 2000. Desde então, Hermeto tinha um caderno com mais de 190 músicas feitas pensando na sua amada. O processo foi escolher alguns para tirar do papel e colocar no mundo. No total, foram 13 faixas que vão do choro ao frevo. Os dois tiveram seis filhos juntos.
Mesmo 24 anos depois, o músico ainda nutre sentimentos muito fortes pela esposa. Ele entende que ela foi a companheira de uma vida e que um disco como esse é apenas consequência de todo esse tempo. “Com essa parceria, foi muito natural que todas as músicas que fiz fossem uma homenagem a ela”, declara.
Para o CorrespondênciaHermeto Pascoal contou um pouco mais sobre a trajetória do álbum e também contou outras histórias interessantes que fizeram parte da trajetória que fez dele o mago que todos admiram dentro do contexto musical brasileiro.
Entrevista // Hermeto Pascoal
Para você a Ilza tem uma história que vai muito além de um simples lançamento. Como foi o processo de transmitir 46 anos de história e amor pela música?
Conheci a Ilza no Recife por causa do Romualdo Miranda, e depois tivemos uma vida juntos. Tivemos vários filhos, viemos morar em São Paulo, depois no Rio de Janeiro. Com essa parceria foi muito natural que todas as músicas que fiz fossem uma homenagem a ela.
Onde Ilza e sua história com a música se encontram?
Em todos os momentos. Quando morávamos no Jabour, ensaiávamos com o grupo no final dos anos 1970, ela era mãe de todo mundo do grupo também, amiga, e fazia aquela feijoada maravilhosa e todo mundo comia junto. Ela sempre esteve envolvida. Tem muita música em homenagem a Ilza também.
Você já fez um álbum tão pessoal quanto esse? Como é lidar com os sentimentos envolvidos?
Olha, para mim a música é o sentimento. Não há premeditação, a música vai e vem para o mundo. Então é sempre assim. Não é muito diferente do que eu faço, fiz a vida toda.
Estas foram apenas 13 das mais de 190 músicas que escreveu para Ilza. Você acha que conseguiu sintetizar tudo nesse corte? Você pretende lançar outros que ainda não foram lançados?
Essas músicas eu escolhi. Um deles foi o aniversário da Ilza, dia 17 de janeiro, e os outros eu escolhi porque era para haver uma ligação entre eles. A gente tem mais choro, tem outros que são mais frevo, mas sim, esse livro tem que ficar todo gravado. Não sei como, não sei quando, não sei onde, mas as coisas devem acontecer assim. Tem que ser registrado. Meu grupo ou qualquer músico do mundo tem que saber gravar.
Além do aspecto sentimental, que tipo de nova nuance musical o álbum traz?
É um álbum com meu grupo. Como sempre fiz com o grupo, uma gravação bem natural, com arranjos criados na hora e com muitos ritmos universais. Ficou muito bonito.
Quão importante você acha que é continuar lançando novas músicas?
Componho todos os dias, todos os momentos. Mesmo quando não tenho papel na mão, estou compondo, posso estar assobiando, posso estar cantando. Às vezes, quando tenho papel, escrevo a música. Então é natural que eu continue fazendo música. Se meu grupo puder gravar, ótimo. Se outros músicos no mundo pudessem gravar também, seria maravilhoso.
Durante sua carreira você recebeu o apelido de Wizard. Que bruxaria você acredita ter feito nesse disco?
Essa história de bruxo foi um apelido que a jornalista Ana Maria Bahiana me deu. No começo achei estranho, mas depois entendi que era muito elogioso. Tratava-se de fazer algo que ninguém imaginava, algo diferente. Então estou feliz com isso, mas para mim é natural. Tudo isso é muito natural: fazer, gravar com meu grupo, fazer música. Eu diria que é mais da natureza.
Sempre que são apresentados em textos é utilizada a terminologia “lenda”. Você se sente uma lenda? Existe algum fardo em ser considerado um gênio?
Eu não me preocupo com isso. Eu simplesmente gosto de fazer música. Sou músico, nasci músico, e para mim é isso que importa: tocar, compor e estar com essas pessoas maravilhosas que sempre vêm.
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