Quando começa mais um dia de trabalho, Paulo Renato Barbosa, 29 anos, sabe que encontrará novas detalhes da tragédia causada pelas inundações no Rio Grande do Sul nas últimas semanas.
Há pouco mais de um mês, ele trabalha como agente de limpeza pública em Canoas (RS), na Região Metropolitana de Porto Alegreuma cidade duramente atingida por enchentes no estado.
Com equipamentos como luvas e botas, ele percorre com uma equipe os bairros mais afetados para ajudar na limpeza de uma cidade que tinha áreas totalmente cobertas pela água, principalmente os bairros mais pobres.
“Quando ajudo as pessoas a retirar restos de coisas que foram destruídas em suas casas, confesso que dói muito. Olhar tudo isso é desesperador”, diz à BBC News Brasil.
O trabalho de limpeza de Canoas tem sido árduo. Segundo a prefeitura, são 120 pessoas trabalhando na limpeza das ruas da cidade de quase 348 mil habitantes, dados do Censo 2022 do IBGE.
Segundo a prefeitura, são 120 motoristas na operação de limpeza. 40 operadores de retroescavadeira, 30 auxiliares e 10 monitores.
Paulo, que estava desempregado e foi contratado por terceiros para fazer limpeza, começa o dia de trabalho logo pela manhã. Ao longo do dia, ele acompanha a rotina de inúmeras pessoas que foram gravemente atingidas pelas enchentes.
Depois que a água baixou, muitas conquistas materiais de uma vida viraram entulhos que precisaram ser removidos e levados para um aterro em Gravataí (RS).
Na grande maioria desses casos, os moradores nem tiveram tempo de recolher muitos de seus pertences, deixaram tudo para trás quando o nível das águas começou a subir na cidade após rompimento de diques na madrugada do dia 4 de maio.
Paulo, que mora com os pais em Canoas, não teve a casa atingida pela água e a família não sofreu prejuízos financeiros. “Mas quase todo mundo que conheço foi realmente afetado por tudo isso”, diz ele.
Foram 173 mortes e ainda há 38 desaparecidos em todo o Rio Grande do Sul, segundo boletim mais recente da Defesa Civil do Estado. Canoas registrou 31 mortes, o maior número do Estado, seguida por Roca Sales (13 mortes) e Cruzeiro do Sul (12).
De lembranças a eletrodomésticos
“É um trabalho cansativo, é uma longa jornada”, diz Paulo.
Entre os itens recolhidos durante a limpeza, alguns são os que mais chamam a atenção do varredor, como as fotografias de família.
“Essas fotos me emocionam muito, porque tenho fotos da minha infância e dos meus pais estão vivos. Mas vi muitas fotos de casamentos e outras comemorações importantes de parentes que talvez não estejam vivos. Talvez essas sejam as poucas lembranças do pai ou da mãe de alguém”, diz ela.
“Infelizmente não posso parar para procurar quem são as fotos ou levá-las para casa, porque são muitas, pois passamos por diversas ruas ao longo do dia”, explica.
A grande maioria dos itens arrecadados pelo grupo, segundo Paulo, são móveis e eletrodomésticos. “Há muitas coisas danificadas, como um sofá e muitos móveis. Também encontramos muitos computadores e televisões danificados.”
“Muitas das coisas que recolhemos ficam na frente das casas atingidas, mas às vezes precisamos entrar nas casas para retirar coisas, principalmente quando são mais pesadas”, afirma.
Ele diz que se sente frustrado ao ver famílias que perderam tudo o que tinham e agora não sabem o que fazer.
O medo de voltar para casa
O agente de limpeza pública afirma que é possível ver o cansaço no rosto das pessoas da região. “Todo mundo quer que as coisas voltem a ser como eram antes, mas ainda há muito entulho nas ruas e há muito trabalho a ser feito.”
Muitos moradores, segundo Paulo, não querem voltar para suas casas. “Eles não têm mais nada, perderam tudo, então acabam preferindo ficar no abrigo.”
“O abrigo acabou se tornando o único lugar onde eles tinham comida e onde podiam deitar, com colchão ou algo assim. Se voltarem para casa, não terão mais nem geladeira nem fogão”, diz ela.
Ainda há registros de chuva na cidade, apesar do nível das águas ter caído em todo o estado.
“Ainda chove aqui, o que dificulta o trabalho de limpeza. E isso assusta as pessoas, que têm medo de voltar atrás e ver tudo acontecer de novo, pois não é a primeira vez que acontecem enchentes aqui em menos de um ano”, afirma.
O futuro incerto
Em meio às dificuldades, Paulo diz que a solidariedade ajudou a aliviar o trabalho duro.
“As pessoas aqui eram mais fechadas, mas depois de tudo isto parece que o clima mudou, as pessoas estão mais abertas e solidárias.”
“As pessoas estão mais preocupadas com os outros, fomos mais individualistas, mas somos mais solidários. Mesmo aqueles que perderam tudo estão tentando ajudar. Quem realmente está fazendo a diferença são as pessoas. Uma frase que dizemos todos os dias é que agora ‘é o povo, pelo povo’”, afirma.
Moradores da região atingida pelas enchentes exigem limpeza mais rápida e pedem a contratação de mais pessoas para trabalhar na operação.
“Muitos moradores acabam ajudando, pegando pás com a gente, porque as pessoas querem ver logo mudanças na cidade”, comenta.
A Prefeitura de Canoas afirma que continuará com os trabalhos de limpeza nos bairros em etapas, dependendo das áreas onde a água recuou completamente. A operação de limpeza tem valor máximo de R$ 91 milhões, que poderá ser utilizado caso seja necessário, recursos obtidos por meio de repasses do governo federal.
Não há um cronograma exato para quando todas as ruas serão completamente limpas.
O que resta para Paulo é o árduo trabalho diário e a incerteza sobre o futuro de Canoas, cidade onde mora há dois anos.
“Não vejo muita coisa boa pela frente, vai ser muito difícil para todo o estado se reerguer”, afirma.
Assim que possível, ele planeja sair do estado. “Eu já estava planejando fazer isso, mas tudo o que aconteceu foi suficiente”, diz.
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