Não é só no Brasil que o direito ao aborto tem estado sob ataque nas últimas horas.
Na Itália, onde os líderes do G7 se reúnem esta semanaum grupo de países mais ricos, o tema também ganhou destaque.
A declaração final do G7 deste ano, divulgada nesta sexta-feira (14/6), veio sem o termo “aborto”, que constava no comunicado da reunião do grupo no ano passado, no Japão.
Em vez disso, menciona “direitos sexuais e reprodutivos”.
“Comprometemo-nos a continuar a promover a saúde e os direitos sexuais e reprodutivos abrangentes para todos e a promover a saúde materna, neonatal, infantil e adolescente, especialmente para aqueles em circunstâncias vulneráveis”.
A declaração anterior falava do “compromisso total para alcançar direitos sexuais e reprodutivos abrangentes para todos, incluindo a abordagem do acesso ao aborto seguro e legal e aos cuidados pós-aborto”.
Além disso, o termo LGBTQIA+ foi mencionado duas vezes no documento de 2023 e apenas uma vez no texto deste ano.
A imprensa italiana e os meios de comunicação estrangeiros já tinham anunciado que a declaração final do evento organizado pela primeira-ministra italiana Giorgia Meloni – eleita em 2022 numa plataforma de direita radical – ocorreria sem o mandato.
A Itália exigiu a retirada da referência ao “aborto seguro e legal” da declaração final, segundo a Reuters, provocando uma repreensão do presidente francês, Emmanuel Macron.
“Não temos a mesma escolha. A França integrou na sua Constituição o direito das mulheres de fazerem um aborto, a liberdade de fazerem o que quiserem com o seu corpo”, disse Macron a um jornalista italiano, segundo a Reuters.
“A França partilha esta visão de igualdade entre homens e mulheres, mas não é uma visão partilhada por todos em todo o espectro político.”
Meloni acusou Macron de tentar obter ganhos políticos com a situação antes das eleições em França, no final deste mês.
No fim de semana passado, o presidente francês convocou eleições parlamentares antecipadas para o final deste mês, após uma grande vitória do partido da sua rival Marine Le Pen na votação para o Parlamento Europeu.
Mudança na legislação
A declaração do G7 (que inclui Alemanha, Canadá, Estados Unidos, França, Itália, Japão e Reino Unido) não altera as leis dos países – o grupo não tem esse poder.
Mas algumas das suas decisões anteriores tiveram efeitos globais. Um exemplo foi a criação de um fundo global para combater a malária e a SIDA em 2002.
No Brasil, o que está em jogo em relação a esse tema é uma mudança direta na legislação.
Um projeto de lei assinado por 32 deputados quer equiparar qualquer aborto realizado no Brasil após 22 semanas de gravidez ao crime de homicídio.
A regra valeria inclusive para casos em que o procedimento é autorizado pela legislação brasileira, como gravidez resultante de estupro.
Na noite de quarta-feira (6/12), a Câmara aprovou o regime de urgência para tramitação do projeto, após o assunto ser incluído em pauta pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP/AL).
Isso significa que o projeto poderá ser votado diretamente pelo plenário da Câmara, sem necessidade de debates e pareceres em comissões. Com isso, o plenário poderá votar o projeto nos próximos dias.
Atualmente, a legislação brasileira permite o aborto em três situações:
- Quando a gravidez é resultado de estupro;
- Se a gravidez representa risco à vida da mulher;
- Se o feto for anencefálico, condição caracterizada pela ausência do cérebro e da calota craniana.
Direito de interromper a gravidez na Constituição
Em Março, a França foi notícia em todo o mundo quando se tornou o primeiro país do mundo a incluir o direito da mulher ao aborto na Constituição.
A decisão ocorreu durante uma sessão especial no Palácio de Versalhes, convocada pelo presidente Emmanuel Macron.
O aborto era legal em França desde 1975, mas o Presidente Macron comprometeu-se a consagrá-lo na Constituição depois de o Supremo Tribunal dos Estados Unidos ter revertido a decisão. Decisão Roe v.em 2022.
Nos EUA, o aborto foi legalizado nos Estados Unidos após uma decisão histórica em 1973 no caso “Roe x Wade”. No entanto, em 2022, o Supremo Tribunal anulou este direito e devolveu aos Estados o poder de decidir se permite este procedimento.
Em Abril, o Supremo Tribunal do Estado da Florida emitiu duas decisões relacionadas com o aborto com consequências contraditórias.
Primeiro, o tribunal confirmou o direito da Flórida de proibir o aborto, abrindo caminho para que uma lei que proíbe o procedimento após seis semanas de gravidez entre em vigor em 1º de maio.
A proibição quase total impedirá praticamente todo o acesso ao aborto na região sul dos EUA, onde a Flórida tem sido uma espécie de refúgio para quem quer se submeter ao procedimento, rodeada de estados que já implementaram a proibição total ou a partir de seis semanas de gestação.
Na Itália, o aborto é permitido por lei desde 1978, durante os primeiros 90 dias de gravidez.
Mas as tensões em torno da questão aumentaram recentemente. Em Abril, o governo de direita radical de Meloni conseguiu que o Senado aprovasse uma lei que permite aos grupos anti-aborto o acesso às mulheres que consideram interromper a gravidez.
Além disso, apesar da legalidade do procedimento, muitas mulheres têm dificuldade em realizá-lo, pois muitos médicos alegam “objeção de consciência”, algo também definido por lei.
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