Apesar das críticas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) do Banco Central e do presidente da instituição, Roberto Campos Neto, o Comitê de Política Monetária (Copom) procurou sinalizar que não há cisão no grupo de nove diretores, por enquanto. Pombos e Falcões — jargão econômico para quem é mais brando com a inflação e quem é mais duro, respectivamente — demonstraram união e decidiram, consensualmente, interromper o ciclo de queda da taxa básica da economia (Selic) iniciado em agosto de 2023. Como Como resultado, as taxas básicas de juros permanecem em 10,50% ao ano, pelo menos nos próximos 45 dias.
Com a decisão, o Brasil se consolida na vice-liderança global em taxas de juros reais (descontada a inflação), atrás apenas da Rússia em um ranking de 40 países listados pela MoneYou.
Durante o dia, o mercado refletiu o clima de tensão criado após as declarações de Lula na terça-feira. O temor era de uma nova divisão entre os cinco diretores indicados pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e os quatro indicados por Lula, como ocorreu na reunião de maio. O dólar permaneceu pressionado, sendo negociado a R$ 5,48 — maior nível desde janeiro de 2023 —, mas encerrou a sessão cotado a R$ 5,44 para venda, alta de 0,14% em relação ao dia anterior. A Bolsa de Valores de São Paulo (B3) registrou alta de 0,53%, fechando aos 120.261 pontos.
A decisão do Copom era esperada pela maioria dos analistas e deve tranquilizar momentaneamente os mercados. “O BC tomou a decisão mais do que acertada, como esperado, apesar dos discursos de Lula na terça-feira. Isso traz um pouco de tranquilidade para os próximos dias, mas agora devolve ao Congresso e ao Executivo a responsabilidade de dar uma resposta. precisamos fornecer uma abordagem minimamente credível para a questão fiscal”, disse Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados. Para ele, a taxa de juro permanecerá elevada por um período prolongado porque o governo, “aparentemente, não entendeu que, sem resolver a questão fiscal de uma forma muito credível, não conseguirá alterar adequadamente a taxa de juro”.
“Serenidade”
No comunicado formal, o Copom informou que optou por unanimidade por interromper o ciclo de queda dos juros porque os cenários global e doméstico são incertos e desafiadores, “exigindo serenidade e moderação na condução da política monetária”, devido, em grande parte, à desancoragem das expectativas de inflação. Apesar de não sinalizar tendência para a próxima reunião, nos dias 30 e 31 de julho, o comitê destacou que a decisão “é compatível com a estratégia de convergência da inflação em torno da meta no horizonte relevante, que inclui o ano de 2025”.
Economistas de dentro e de fora do Brasil concordam que Lula exagerou nas críticas ao BC e a Campos Neto. No entanto, reconhecem o motivo da indignação com o fato de o presidente do BC ter aceitado o convite do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), para um jantar no Palácio dos Bandeirantes, na semana passada. “Foi um grande erro, Campos Neto não precisou ir ao jantar, principalmente agora que a relação entre ele e Lula melhorou. Isso só serviu para criar mais ruído desnecessário sobre a autonomia do Banco Central”, disse um economista estrangeiro que pediu anonimato.
O economista-chefe do Banco BV, Roberto Padovani, destacou que a decisão de encerrar o ciclo de flexibilização dos juros era o que o mercado esperava e, como segundo sinal positivo, foi tomada de forma consensual. “Pelos modelos do Banco Central, mantendo a Selic em 10,5%, mesmo assim não será possível atingir o centro da meta de 3%. Então, a sinalização é conservadora. O comunicado não trouxe mais novidades, então, acho que é uma tentativa do Banco Central de sinalizar compromisso com o centro da meta”, completou.
Caio Megale, economista-chefe da XP Investimentos, também destacou que a declaração reforça o compromisso do BC com o cumprimento da meta de inflação. “O ambiente ficou mais complexo, os fundamentos ligados à inflação deterioraram-se marginalmente desde o último Copom, as projeções de inflação do mercado e do próprio Copom subiram, o que sugere maior cautela por parte do BC. escolheu fazer”, explicou. Ele informou ainda que, após a decisão do Copom, manteve a projeção de que a taxa Selic permanecerá em 10,50% até o final de 2025. “A decisão de hoje foi condizente com o nosso cenário”, acrescentou.
Avaliações
Assim como a presidente do PT, Gleisi Hoffmann (PR), a Confederação Nacional da Indústria e a Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), criticaram a decisão do Copom. Para o deputado petista, “não há justificativa técnica, econômica ou mesmo moral para manter a taxa básica de juros em 10,5%”.
Em nota, o presidente da CNI, Ricardo Alban, classificou a decisão do Copom como “inadequada”, e destacou que a manutenção dos juros no patamar atual imporá restrições adicionais à atividade econômica. Para a Firjan, o fim do ciclo de cortes da Selic, além de prejudicar a recuperação econômica, “limita a expansão dos investimentos no país”.
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