A indústria ferroviária ampliou o diálogo com o Congresso na semana passada. Um evento no Salão Nobre da Câmara lançou, nesta quarta-feira, a Frente Parlamentar pelo Fortalecimento da Indústria Ferroviária Brasileira. Apoiado por 209 deputados, o grupo quer aumentar a competitividade dos produtos brasileiros, incentivar a troca de trens sucateados e equalizar a carga tributária do segmento com a dos demais modais de transporte.
Representantes do setor destacam que a produção brasileira tem perfeitas condições de suportar a expansão das ferrovias liderada pelo governo federal. Isto inclui tudo, desde comboios de carga a metropolitanos e veículos ligeiros sobre trilhos (VLT), que estão em rápida expansão. No entanto, argumentam que é necessário o apoio das autoridades públicas para garantir a competitividade, uma vez que as indústrias estrangeiras estão a trazer alternativas de qualidade inferior, mas a preços mais baixos.
Um dos objetivos da frente é incluir a indústria ferroviária no Programa Mover, do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Mdic), que concede benefícios fiscais a fabricantes de automóveis que invistam em tecnologias verdes. O setor ainda pede acesso a financiamento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e do Fundo Clima.
A frente é presidida pelo deputado Pedro Uczai (PT-SC), que acredita que a iniciativa facilitará o diálogo entre as empresas e o governo federal. O Executivo estabeleceu como prioridade a expansão da rede ferroviária. O Ministério dos Transportes prepara um plano nacional de R$ 20 bilhões para as ferrovias, mas aguarda o fim das negociações com a Vale e outras empresas que atuam no setor para financiar o aporte.
A previsão é que o anúncio aconteça ainda este ano, mas é preciso chegar a um acordo com a mineradora. A frente declarou apoio à meta lançada pelo ministério de aumentar para 40% a participação das locomotivas no transporte de cargas até 2035, que atualmente é de 27%.
“O transporte ferroviário é um transporte mais barato, mais seguro, ambientalmente sustentável e induz o desenvolvimento por onde passa. Contribui até para outros modais. Essa intermodalidade é essencial em um país continental”, disse Uczai. Na frente também estão Baleia Rossi (MDB-SP), Denise Pessôa (PT-RS) e Nelson Padovani (União-PR), como vice-presidentes.
Pessôa, por sua vez, destacou a importância do setor ferroviário para a Serra Gaúcha, citando empresas como Marcopolo e Randon. Lembrou ainda que há vagões circulando no país com mais de 70 anos, e que a retomada das ferrovias também fortalece o setor produtivo. “A renovação da frota é urgente e precisamos discuti-la”. Padovani também esteve presente. Baleia Rossi, porém, não pôde comparecer e foi representado por Mauro Pereira (MDB-RS).
Segundo o Sindicato Interestadual da Indústria de Materiais e Equipamentos Ferroviários e Rodoviários (Simefre), a troca de vagões e locomotivas com mais de 50 anos pode reduzir o consumo de combustíveis em 58 milhões de toneladas por ano, reduzir as emissões de carbono em 150 mil toneladas e aumentar a produtividade das concessionárias em 30%.
Representantes do setor também estiveram em Brasília para o lançamento da frente, como o vice-presidente da Simefre Massimo Giavina e o presidente da Associação Brasileira da Indústria Ferroviária (Abifer), Vicente Abate.
Competição injusta
Em entrevista ao Correio, Giavina classificou a criação da frente como um “marco” para o setor. Ele espera que os parlamentares possam ajudar a fiscalizar as ações do governo federal e criar leis que beneficiem o setor. “Sempre estivemos envolvidos nas áreas do Executivo e das concessionárias, mas tínhamos esquecido os sectores político e legislativo. É fundamental para nós termos esse apoio”, comentou.
O empresário destacou que o país vive um bom momento, citando a adoção dos VLTs nas grandes cidades. Em junho, por exemplo, o BNDES anunciou a liberação de R$ 27,8 milhões para estudo de viabilidade de implantação do transporte ferroviário em 21 cidades. Em São Paulo, o governo de Tarcísio de Freitas (Republicanos) anunciou uma série de projetos nesse sentido, como veículos leves ligando a capital paulista a Sorocaba, Santos e São José dos Campos.
Há grande preocupação, no entanto, com a compra pelo governo de vagões e locomotivas importados, especialmente da China. Giavina argumentou que a indústria brasileira oferece tecnologia de ponta, mas não consegue competir com os preços chineses. “A cadeia produtiva do Brasil custa mais que a da China, porque lá tem subsídio de 17%, e aqui tem isenção de 20% para importação. Como vou competir com uma diferença de 37%?”, questionou. “O setor ferroviário, em qualquer lugar do mundo, é estratégico para cargas e passageiros. São necessários equipamentos com durabilidade de 30 anos, peças de reposição, manutenção, o que não acontece hoje com a indústria estrangeira. em 10 anos”, acrescentou Giavina.
O presidente do Simefre vê as ferrovias como o caminho para aumentar a competitividade de todos os setores econômicos do Brasil. Como o custo do transporte ferroviário é inferior ao do asfalto – principal meio de transporte de mercadorias no país – os produtos podem chegar aos portos e ser exportados a preços consideravelmente mais baixos. Ele argumentou que a indústria ferroviária nacional tem perfeitas condições de atender à demanda que surgirá com a expansão da malha. “Para frete, temos os vagões mais eficientes do mundo. Somos o único país com locomotivas movidas a bateria. Temos tecnologia para criar vagões e locomotivas de última geração”, disse Giavina.
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