O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) dará início, nesta sexta-feira (28/6), à audiência de defesa dos policiais militares acusados no caso do massacre de Paraisópolis, que matou nove jovens com idades entre 14 e 23 anos em 2019 25 testemunhas de defesa serão ouvidas no Fórum Criminal Ministro Mário Guimarães, no bairro Barra Funda, em São Paulo, a partir das 10h. A maioria deles está ligada à Polícia Militar de São Paulo (PMESP).
A sessão dará seguimento à 3.ª audiência do processo, realizada no dia 17 de maio — na qual foram ouvidas dez testemunhas — e servirá para decidir se existem provas suficientes de que os arguidos cometeram um crime. Nesse caso, o juiz deve levar o caso a um júri e marcar uma data para o julgamento.
O caso também é investigado na esfera da Justiça Militar, que aguarda a conclusão do processo na Justiça Comum para dar continuidade ao processo dos oficiais. Portanto, caso a audiência de instrução tenha resultado negativo para a prática de crime, o caso só tramitará na esfera militar.
Doze policiais da PM e um ex-oficial foram acusados de envolvimento no massacre. A tenente Aline Ferreira Inácio, o suboficial Leandro Nonato, o sargento João Carlos Messias Miron, o cabo Paulo Roberto do Nascimento Severo, o ex-cabo Luís Henrique dos Santos Quero — expulso da corporação por outros motivos não divulgados —, o cabo Gabriel Luís de Oliveira e os soldados Anderson da Silva Guilherme, Marcelo Viana de Andrade, Mateus Augusto Teixeira, Rodrigo Almeida Silva Lima, José Joaquim Sampaio e Marcos Vinicius Silva Costa são réus por homicídio qualificado. O soldado José Roberto Pereira Pardim é réu acusado da explosão.
O massacre
Ocorrido em 1º de dezembro de 2019, o massacre de Paraisópolis foi um massacre resultante de uma operação da PMESP contra o baile DZ7. Policiais da PM entraram na comunidade, cercaram a área de maior fluxo de pessoas e usaram gás lacrimogêneo e bombas atordoantes. Segundo o Ministério Público, a partir desse momento, a polícia prendeu as vítimas num beco sem saída, o que resultou na morte de oito delas por asfixia e outra por trauma. Nenhum deles era residente local.
Gustavo Xavier, 14 anos, Marcos Paulo Oliveira, 16 anos, Gabriel Rogério de Moraes, 20 anos, Eduardo Silva, 21 anos, Denys Henrique Quirino, 16 anos, Dennys Guilherme dos Santos, 16 anos, Luara Victoria de Oliveira, 18 anos, e Bruno Gabriel dos Santos, de 22 anos, morreu por asfixia, enquanto Mateus dos Santos Costa, de 23 anos, morreu em decorrência de trauma.
Para Maria Cristina Quirino, mãe da vítima Denys Henrique Quirino, a presença de altos funcionários da PM no rol de testemunhas de defesa evidencia a existência de um sistema que não só permite condutas violentas e assassinas de policiais contra a população —especialmente aqueles com menor poder aquisitivo —, mas também protegem esses policiais por causa disso.
“A grande maioria das testemunhas de amanhã são aquelas que agiram em conjunto com os próprios arguidos, ou seja, vão defendê-los, obviamente. São aqueles de alta patente, quem é o inspetor da Polícia Militar na época, é o comandante do 16º Batalhão, é o (policial) que presidiu o IPM (inquérito da Polícia Militar). Foram essas pessoas que legitimaram a ação policial. Portanto está completamente ‘fora de questão’ para nós, cidadãos comuns, que tenham este tipo de defesa. Estou falando minha opinião. Eles tiveram que fazer como nós, conseguir que pessoas civis comuns fossem testemunhas. Como dizem que estão dizendo ‘a verdade’, a sua verdade mentirosa, eles devem provar isso, mas não com a liderança (do PM) em si, certo? Isso seria certo, mas nunca. O sistema não permite”, lamentou.
Os oficiais de alta patente a que Cristina se referiu são os ex-comandantes-gerais da PMESP, Marcelo Vieira Salles, que comandou a área onde está localizado o 16º Batalhão, e Fernando Alencar Medeiros, que foi comandante do 16º Batalhão e do 1º Batalhão de Choque “Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar” (ROTA) —conhecido por ser o líder em mortes em SP. Para o Correspondênciaa Defensoria Pública do estado confirmou a presença de ambos no rol de testemunhas de defesa.
“Essa lógica de que a polícia é proteção, prevenção, é tudo mentira. Isso não existe. Na comunidade, para pessoas negras, pobres e periféricas, isso não existe. Polícia para quem? Ninguém precisa de policiais que matam. Não matam quem tem poder aquisitivo, abaixam a cabeça se tiverem um Porsche, esse tipo de coisa. Lá eles não fazem esse tipo de ação, só fazem onde as pessoas estão em situação de maior vulnerabilidade, que é nas comunidades”, acrescentou Cristina.
Para o Correspondência, o MPESP informou que aguarda a decisão do Tribunal para tomar as medidas cabíveis em relação aos envolvidos que ainda integram a corporação. “As investigações civis e militares do caso foram concluídas e encaminhadas ao Judiciário. Um dos acusados não integra mais a Polícia Militar”, finalizou a nota.
Ó Correspondência tentou entrar em contato com os advogados de defesa dos réus. João Carlos Campanini, que defende Anderson Guilherme, afirmou que a oitiva desta sexta continua com a oitiva das testemunhas de defesa, sem “nada de novo em andamento”.
O advogado Fernando Fabiani Capano, responsável pela defesa dos réus Aline Inácio, Leandro Nonato, João Miron, Paulo Severo, Marcelo Andrade, Mateus Teixeira, Rodrigo Lima e José Sampaio, afirmou que a expectativa é que os depoimentos desta sexta esclareçam a falta de relação causal ligação entre as mortes e a conduta dos policiais.
“Amanhã parece-me que isto vai começar a ser pensado para que não tenhamos sequer a possibilidade de marcar plenário na segunda fase, porque estes polícias, na verdade, não merecem ser processados, tendo em conta a forma como o As pessoas sempre defenderam a ausência de nexo causal entre qualquer tipo de conduta sua e essas mortes inaceitáveis e muito tristes que ocorreram naquela ocasião”, disse.
Os advogados Marcos Manteiga, que defende Marcos Costa, e Ana Maria Monteferrario, que defende Luís Quero e Gabriel Oliveira, não retornaram contato até a publicação desta reportagem. A defesa de José Pardim não foi encontrada para comentar o assunto.
*Estagiário sob supervisão de Pedro Grigori
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