Reitor do Poder Judiciário Federal de Maringá, interior do Paraná, o desembargador José Jácomo Gimenes tem perfil discreto, mas opinião firme sobre a estrutura do Poder Judiciário e sua cúpula, o Supremo Tribunal Federal. Alvo de uma ordem do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, que ordenou ‘medidas cabíveis’ em relação à sua conduta ao condenar a União a indenizar um ex-deputado estadual por ‘erro processual’ do ministro, Jácomo Gimenes já criticou, em outra ocasião, o que chamou de “extravagante concentração de poder” do STF.
A avaliação de Jácomo Gimenes sobre o STF consta de artigo de sua autoria publicado na edição de junho e julho de 2022 da Revista Bonijuris. Título: “A cúpula do Judiciário é ineficiente, não olhe para cima”.
O veículo é publicado pela Bonijuris, que possui publicações voltadas à área jurídica.
No texto, Jácomo Gimenes diz que o Brasil tem um “sistema judiciário simbiótico e distorcido”. Critica o facto de o Supremo funcionar “como se fosse uma quarta instância, atolado em processos”, “causando insegurança jurídica, pela falta de jurisprudência nacional firme e tempestiva”.
Na ocasião, o juiz federal comentou entrevista com um constitucionalista norte-americano. Jácomo Gimenes se opôs à formatação da liderança do Judiciário, que, na sua avaliação, “não funciona como deveria”.
Em um trecho, o juiz evocou o filme “Don’t Look Up” – sobre um meteoro que acaba destruindo o planeta – para indicar que “os atores inseridos no espaço de conforto do sistema não querem mudanças”.
“Não olhe para cima, finja que não vê o megaproblema, os danos contínuos à sociedade são irrelevantes, o sofrimento do povo brasileiro é irrelevante”, escreveu.
O juiz apontou o extenso acervo processual do STF e indicou que isso “inviabiliza a eficiência do Tribunal”. Destacou o “caos de incertezas e atrasos em questões fundamentais para o país”.
“Acontece que, com uma Constituição ampla, regulando quase todos os aspectos da vida nacional e um sistema de recursos abundante e altamente permissivo, temos o nosso Supremo Tribunal a funcionar como se fosse uma quarta instância, atolado num atraso de quase 60 mil processos. “, avaliou.
No texto, Jácomo Gimenes também abordou a rotina da Corte, “concedendo liminares provisórias monocráticas com validade duradoura, pedidos de ‘vista’ ilimitados, atrasando em anos os julgamentos do colegiado, bloqueando o funcionamento do sistema judiciário e causando insegurança jurídica, por falta de jurisprudência nacional firme e oportuna”,
“É ridícula a quantidade de competência processual do STF”, registrou. “Em 2020, recebeu 74 mil processos (um absurdo quando comparado aos seus congêneres), valor incompatível para um tribunal de 11 ministros. do Judiciário e gera um defeito estrutural ruinoso, bom para quem quer fugir da justiça e para quem lucra com a ineficiência sistêmica.”
Jácomo Gimenes sugeriu “compartilhamento de poder” no artigo. “A divisão do poder, mesmo quando a experiência diz que deve ser feito, é sempre uma luta. Quem o tem não quer perder. É atual a história de que a retirada do poder do Supremo Tribunal Federal para a criação do Superior Tribunal de Justiça no Constituição de 1988 foi uma entrega de fórceps, mesmo assim foi uma concessão parcial ineficaz, apenas para questões de direito comum, mantendo um fluxo surpreendente de recursos em questões constitucionais para o STF, gerando esse caos de indefinição e demora em questões fundamentais para o país “, detalhou.
“Temos um Poder Judiciário amplo, composto por tribunais comuns e especializados, federais e estaduais, baseados em quatro instâncias (tribunal local, tribunais regionais, tribunais nacionais e STF), que pode ser aprimorado facilmente, sem perda de qualidade, bastando transferir competência disposição constitucional dos tribunais nacionais, assegurando que os processos subjetivos sejam concluídos em terceira instância, no máximo, como ocorre na maioria das democracias, liberando suficientemente o nosso tribunal supremo para julgar rapidamente questões nacionais importantes”, sugeriu no texto publicado na Revista Bonijuris, Edição de junho e julho de 2022.
Ele enfatizou. “Até quando os intervenientes do sistema judicial, beneficiários do lento e burocratizado Judiciário, manterão esta extravagante concentração de poder no Supremo Tribunal, em claro detrimento da nação?”, questionou.
“Como vão responder à história por essa distorção injustificável? Onde está a opinião pública da grande maioria dos operadores jurídicos que querem um Judiciário eficiente e justo? Juristas, parlamentares e operadores jurídicos precisam falar sobre isso.”
Sentença de Jácomo Gimenes
No último dia 28 de maio, Jácomo Gimenes condenou ação movida pelo ex-deputado estadual do Paraná Homero Marchese (Novo) e condenou a União a pagar indenização de R$ 20 mil ao político.
O juiz atribuiu ‘erro processual’ ao ministro Alexandre de Moraes, que não incluiu expressamente a plataforma Instagram em decisão que desbloqueou perfis do ex-deputado no âmbito do inquérito das fake news no STF.
Na sentença em que impôs indenização de R$ 20 mil à União, Jácomo Gimenes apontou a ‘demora no desbloqueio’ do Instagram de Homero Marchese.
O desbloqueio da conta do Instagram do ex-parlamentar só ocorreu em maio de 2023, quase seis meses após a ordem de Moraes. Na sentença, o juiz federal apontou demora ‘excessiva’ na “complementação da decisão omitida”, já que a defesa de Marchese questionou “imediatamente” o fato de o Instagram do então deputado não ter sido desbloqueado.
Pivô do imbróglio, os perfis de Marchese nas redes sociais foram bloqueados por Moraes em novembro de 2022. Um mês depois, o ministro divulgou as contas do então deputado no X e no Facebook, mas não mencionou o Instagram.
A Procuradoria-Geral da República recorreu da condenação, por meio de denúncia apresentada diretamente à Procuradoria de Moraes. A AGU alegou que as “críticas e divergências” em decisão judicial de primeiro grau “interferem diretamente” na condução do inquérito das fake news, “desafiando as competências” do STF.
Nesta quarta-feira, 27, o ministro revogou a sentença de Jácomo Gimenes e enviou despacho ao Conselho Nacional de Justiça para ‘medidas’ em relação à conduta do juiz federal.
Na avaliação de Moraes, a decisão de Jácomo Gimenes ‘contestou’ a competência do STF e a “forma de conduzir” a investigação, o que teria sido prejudicado. “É impensável afirmar que uma decisão proferida em Tribunal Especial possa julgar a forma de conduta e a legitimidade de atos judiciais praticados em um processo que tramita neste Supremo Tribunal Federal”, atacou o ministro.
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