Já virou piada no mercado financeiro. Basta o presidente Luiz Inácio Lula da Silva abrir a boca e o real perde valor em relação ao dólar. Ontem não foi diferente, embora houvesse um ingrediente adicional para que o câmbio ficasse mais desvalorizado, o final do mês, quando os exportadores precisam fechar contratos com clientes internacionais, segundo especialistas.
O dólar abriu o pregão com leve queda de 0,25%, mas mudou de sinal logo após entrevista de Lula à rádio O Tempo, em que voltou a criticar o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. “Isso vai melhorar quando eu puder nomear o presidente do Banco Central, e construiremos uma nova filosofia”, disse Lula, sinalizando que pretende interferir na autoridade monetária, que agora tem autonomia política, mas não financeira, do governo. O chefe do Executivo continuou a dar sinais contraditórios sobre o seu compromisso em fazer um ajuste fiscal, porque retomou o seu discurso contra a dissociação do rendimento real do salário mínimo às pensões, algo que tem preocupado os analistas com o aumento da Segurança Social. lacuna nos próximos anos.
“Lula voltou a dizer que não aceita a dissociação dos gastos previdenciários, mas a Previdência responde por mais da metade das despesas primárias da União”, alertou o ex-ministro da Fazenda Maílson da Nóbrega, sócio da Tendências Consultoria. Para ele, esses ataques ao BC são um tiro no pé do presidente e só ajudam a enfraquecer o real frente ao dólar. “Lula só perdeu dinheiro com isso e está apostando na bobagem que o mercado está apostando contra o país”, disse.
Não surpreendentemente, o dólar subiu e registou um dos melhores retornos do mês. A moeda norte-americana encerrou o dia com alta de 1,47%, cotada a R$ 5,58 — maior patamar desde 10 de janeiro de 2022, quando foi vendida a R$ 5,67. O Índice DXY, que mede o desempenho do dólar em relação a uma cesta de diversas moedas, fechou ontem com variação praticamente nula, após atingir recorde de dois meses no dia anterior.
O ex-ministro lembrou que Lula ainda errou ao citar as empresas que fizeram hedge (proteção) contra o câmbio durante a crise financeira global, como Sadia e Aracruz porque apostavam contra o real em 2008. “Naquela época, foi o contrário, essas empresas apostaram no real e tiveram prejuízos bilionários”, corrigiu.
(foto: arte)
Para Bruno Komura, analista da Ouro Preto Investimentos, as declarações de Lula aumentam a desconfiança, que já é elevada, segundo ele, no cenário local, especialmente pelas incertezas em relação à questão fiscal. “A situação não parece estar a estabilizar. Por enquanto ainda podemos observar algum agravamento, mas penso que chegaremos a uma situação que se tornará insustentável”, disse o especialista. O professor de economia da Universidade de Brasília (UnB), César Bergo, destaca que os três principais fatores que causam turbulência no atual cenário macroeconômico são as políticas restritivas nos Estados Unidos, somadas às incertezas quanto ao ambiente político local, além à questão dos gastos excessivos e ao que ele chama de “gestão complicada” da mesa de câmbio do Banco Central. “Não estamos vendo intervenções dele em questões mais especulativas. Isso afeta também, porque quando o Banco Central não age o dólar sobe”, destacou.
Bolsa em vermelho
O Índice Bovespa (IBovespa), principal indicador da Bolsa de Valores de São Paulo (B3), caiu 0,3%, aos 123.906 pontos, mas acumulou alta de 1,48% no mês de junho. Desde janeiro, a Bolsa ainda permanece no vermelho, registrando queda de 7,66%. A queda das ações dos grandes bancos influenciou o desempenho negativo da Bolsa, com as ações do Bradesco caindo 0,32%, e as do Itaú Unibanco, 0,09%. As do Banco do Brasil, que operaram no negativo durante a maior parte do dia, fecharam com leve alta de 0,04%. Outra ação que pesou no Ibovespa foi a da Embraer, que caiu 5,42% ao final do pregão.
Segundo dados levantados por Einar Rivero, da Elos Ayta Consultoria, o dólar registrou o segundo melhor desempenho no mês, atrás apenas do índice de empresas estrangeiras negociadas no país, o BDRX, que valorizou 12,79% no mês, enquanto o o dólar Ptax acumulou alta de 6,05% no mesmo período. Na ponta das perdas, o Bitcoin liderou, com queda de 5,39%. Nos últimos 12 meses, a criptomoeda registrou ganhos de 130,10% e o IBovespa, de apenas 4,93%. “De janeiro a junho, o melhor investimento também é o Bitcoin, com valorização de 63,26%, seguido pelo índice BDRs, com ganhos de 41,07%, e pelo dólar Ptax, que teve o terceiro melhor desempenho, com valorização de 14,82%” , destacou Rivero.
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