Ter níveis mais elevados de inflamação na faixa dos 20 e 30 anos pode levar a problemas de cognição e memória mais tarde na vida, de acordo com um artigo da Universidade da Califórnia em São Francisco, nos Estados Unidos. O estudo, publicado na revista Neurology, avaliou os níveis de proteína C reativa (PCR) no sangue de mais de dois mil voluntários. A PCR é sintetizada pelo fígado e aumenta quando o corpo passa por processos inflamatórios.
Segundo o artigo, existem dois tipos de inflamação. A forma aguda ocorre quando a resposta imunológica do corpo é ativada para combater uma infecção ou lesão. Localizada, dura pouco tempo e é resultado de um sistema imunológico em bom estado. A versão crônica não é considerada saudável, é de baixo grau, mas persiste por meses ou anos. Pode ser causada por doenças autoimunes, como artrite reumatóide, esclerose múltipla, estresse físico ou outros problemas. Os sintomas incluem dor ou rigidez nas articulações, problemas digestivos e fadiga.
“A inflamação na velhice tem sido associada ao risco de demência e aos primeiros sinais de declínio cognitivo, mas sabe-se menos sobre a inflamação em adultos jovens e se pode influenciar a cognição na meia-idade”, destacou o autor numa nota. a líder do estudo, Kristine Yaffe, pesquisadora da Universidade da Califórnia.
Yaffe acrescentou que: “A inflamação consistentemente alta ou moderada que começa no início da idade adulta pode impactar negativamente a capacidade de uma pessoa de planejar, focar e gerenciar múltiplas tarefas, bem como a rapidez com que ela pode processar informações na meia-idade”.
Resultado dos testes
O estudo envolveu 2.364 pessoas, com idades entre 18 e 30 anos no momento do recrutamento inicial, e foram acompanhadas por 18 anos. Os níveis de inflamação foram medidos no início do estudo e mais três vezes ao longo da pesquisa. Os cientistas dividiram os voluntários em três grupos com base nos níveis inflamatórios: consistentemente mais elevados, moderados ou crescentes e estáveis mais baixos. Do total de 911 voluntários, 39% apresentaram inflamação consistentemente maior; 381 pessoas, 16%, estavam no nível moderado ou crescente; e 1.072, 45%, foram colocados na categoria estável mais baixa.
Cinco anos após a última avaliação dos processos inflamatórios, os voluntários participaram de seis testes para examinar as habilidades de pensamento e memória.
Em um exame, que mede a velocidade de processamento e a memória, os participantes receberam uma chave com números e símbolos correspondentes. Eles então desenharam esses símbolos em uma lista separada de números aleatórios o mais rápido possível. Dos classificados no grupo de baixa inflamação, 10% apresentaram desempenho cognitivo ruim, enquanto os do grupo médio e alto tiveram 21% e 19%, respectivamente.
Fábio Leite, psiquiatra do hospital Santa Lúcia, em Brasília, destaca a teoria de que diversas doenças ainda não completamente compreendidas têm origem inflamatória. “Por exemplo, a depressão em si seria um processo inflamatório geral”, pondera. “O que realmente ajuda a evitar esses processos inflamatórios orgânicos é a atividade física, uma boa alimentação e um bom sono”.
A equipe de cientistas também descobriu que as pessoas do grupo moderado tinham duas vezes mais chances de ter um desempenho ruim no teste de velocidade de processamento em comparação com os voluntários com níveis mais baixos de inflamação. Para função executiva, pacientes com quantidades elevadas de proteína C reativa tiveram risco 36% maior de reprovação no exame.
“A inflamação é importante (no processo de) envelhecimento cognitivo e pode começar muito mais cedo do que se pensava anteriormente. Embora os atuais esforços de prevenção se concentrem principalmente nos adultos mais velhos, o nosso estudo fornece evidências da necessidade de também visar a saúde do cérebro na meia-idade”, disse Yaffe.
Renata Figueiredo, presidente da Associação Psiquiátrica de Brasília (APBr), afirma que existem estudos para avaliar o uso de antiinflamatórios na prevenção da demência. “São necessários resultados conclusivos antes de implementações clínicas amplas. Um estilo de vida saudável continua a ser uma abordagem fundamental para prevenir a inflamação crónica e as suas consequências no cérebro. Uma dieta equilibrada, actividade física regular e gestão do stress são essenciais para jovens adultos que visam reduzir o risco de doenças neurodegenerativas”.
Para o líder do estudo, são necessárias mais pesquisas para melhorar a detecção precoce de pacientes com maior risco de mau desempenho cognitivo. Segundo Yaffe, uma limitação do trabalho foi que outras condições associadas a altos níveis de inflamação, como acidente vascular cerebral, hipertensão e diabetes, não foram avaliadas.
Declínio gradual
A inflamação crônica no corpo está associada à obesidade, falta de atividade física, doenças crônicas, estresse e tabagismo. Também está tradicionalmente ligado ao declínio cognitivo em pessoas idosas.
Cuidado com o excesso de peso
“Sabemos que o tecido adiposo secreta diversas substâncias que geram um processo inflamatório, mas esses níveis inflamatórios são muito baixos e não detectáveis em exames laboratoriais, então o processo inflamatório crônico está relacionado à obesidade, não vemos nesses exames. já foi descoberto em pesquisas que a inflamação crônica é um pouco maior nesses pacientes e baixos níveis desse tipo de processo inflamatório podem de fato prejudicar a memória. Alguns estudos mostraram que existe uma relação entre essa condição e a atrofia de certas áreas cerebrais. mudanças de humor, ansiedade e depressão.”
Luciana Barbosa, neurologista do Sírio-Libanês, em Brasília
Declínio gradual
A inflamação crônica no corpo está associada à obesidade, falta de atividade física, doenças crônicas, estresse e tabagismo. Também está tradicionalmente ligado ao declínio cognitivo em pessoas idosas.
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“Sabemos que o tecido adiposo secreta diversas substâncias que geram um processo inflamatório, mas esses níveis inflamatórios são muito baixos e não detectáveis em exames laboratoriais, então o processo inflamatório crônico está relacionado à obesidade, não vemos nesses exames. já foi descoberto em pesquisas que a inflamação crônica é um pouco maior nesses pacientes e baixos níveis desse tipo de processo inflamatório podem de fato prejudicar a memória. Alguns estudos mostraram que existe uma relação entre essa condição e a atrofia de certas áreas cerebrais. mudanças de humor, ansiedade e depressão.”
Luciana Barbosa, neurologista do Sírio-Libanês, em Brasília
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