O presidente e fundador do Grupo Farroupilha, Inácio Carlos Urban, indiciado por homicídio culposo pela morte do então funcionário e piloto de avião Rodrigo Carlos Pereira, de 39 anos, pede à Justiça pouco mais de R$ 932 mil da viúva a título de danos materiais. O valor seria para cobrir prejuízos decorrentes de danos na aeronave do empresário, que era pilotada por Rodrigo e caiu na pista de pouso da Fazenda São Francisco, em Coromandel, no Alto Paranaíba, em Minas Gerais, em 2020.
Para justificar o pedido de indenização, os advogados do dono do Grupo Farroupilha —conglomerado ligado ao agronegócio com sede em Patos de Minas— alegaram que “ele foi o único culpado pelo acidente fatal que vitimou o trabalhador”. Com isso, pedem o acréscimo de juros de 1% ao mês até a data do efetivo pagamento.
A defesa do empresário encaminhou o pedido ao juiz do Tribunal Único do Trabalho da comarca de Patrocínio em abril de 2022, quando citou o entendimento do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa) da época: “Com base nas provas apresentado, é possível que o piloto tenha planejado incorretamente o combustível necessário para a realização do voo” — opinião que acabou ganhando novos contornos com a acusação de Inácio.
O pedido de defesa do empresário foi apresentado à Justiça em resposta à ação ajuizada no Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (TRT-MG) pela viúva após a morte do marido. Ela pede que a Justiça do Trabalho reconheça que cerca de 80% do salário foi pago ao companheiro sem recolhimento de impostos. Isto tornaria possível obter uma revisão da pensão. Entre outros pontos, a ação visa pagar indenização por danos morais e materiais decorrentes da morte de Rodrigo.
“O grupo empresarial e seu presidente se recusam a reparar os danos decorrentes do acidente que resultou na morte do piloto e, além disso, exigem judicialmente dos dois filhos órfãos e da viúva uma quantia que, em valores atualizados, seria aproximadamente R$ 1,3 milhão”, disse o advogado da família, Rodrigo Marra, em nota enviada ao Estado de Minas. A viúva optou por não dar entrevista.
Dois anos depois de pedir indenização à família da vítima, o empresário acabou indiciado pela Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG) por homicídio culposo. A investigação foi encerrada em 12 de abril deste ano e enviada ao Ministério Público quatro dias depois.
Nesse documento, assinado pelo delegado Leandro Fernandes Araújo, consta que a aeronave, pilotada por Rodrigo no dia do acidente e destinada à atividade aeroagrícola, apresentava defeitos “muito graves”, como, por exemplo, superaquecimento, óleo do motor vazamento, corte de combustível e panes elétricas e termostáticas, que teriam causado a queda do avião.
Além disso, no laudo pericial judicial apresentado nos autos da reclamação trabalhista, o perito concluiu que o piloto não considerou a possibilidade de falha a seco – ou seja, quando o sistema não é capaz de fornecer combustível suficiente para permitir o correto funcionamento do motor . O documento revelou ainda que Rodrigo solicitou combustível mais que suficiente para o avião.
A reportagem entrou em contato com a comunicação do Grupo Farroupilha e com o advogado de Inácio Carlos Urban para saber se o empresário pretende manter o pedido de indenização mesmo após seu indiciamento por homicídio culposo, mas não houve resposta até o momento da publicação.
Acidente dez minutos após a decolagem
Com o objetivo de pulverizar agrotóxicos, Rodrigo Carlos Pereira saiu do aeródromo de Coromandel no dia 7 de fevereiro de 2020 e caiu na cabeceira da pista de pouso da Fazenda São Francisco, próximo a uma plantação de milho, dez minutos após a decolagem.
O acidente aconteceu no primeiro voo após reparos feitos pelo mecânico Rogério Dalla Santa contratado por Inácio. Esse profissional, porém, não possuía a qualificação adequada da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). Dalla também foi acusado de homicídio culposo. Sua defesa não foi localizada pelo EM. O espaço permanece aberto para manifestações.
O piloto, identificado como “experiente” pela Polícia Civil, foi retirado com vida dos destroços, mas morreu a caminho do pronto-socorro municipal. Rodrigo deixou esposa e dois filhos, que, na época do acidente, tinham 3 e 5 anos.
A Polícia Civil afirmou que o empresário descumpriu os cuidados necessários para evitar o acidente de trabalho, “assumindo culpa consciente ao deixar de contratar mecânico habilitado, bem como ao determinar que o piloto de sua aeronave e funcionário continuasse voando em condições precárias de segurança”. Portanto, a instituição policial concluiu que Inácio estava, em tese, explorando irregularmente a atividade aeroagrícola.
Defeitos crônicos em bombas de combustível
Relatório do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa) revelou que os tanques de combustível estavam intactos, mas completamente vazios. Além disso, os “demais componentes do motor não apresentavam combustível residual”. Também ficou claro pelas marcas no solo que a aproximação da aeronave teve um “grande ângulo de descida”.
Defeitos crônicos nas bombas de combustível, bem como a má posição de leitura dos indicadores de nível e sua imprecisão, contribuíram para o atraso na decisão do piloto no momento de emergência, diz trecho da investigação. Segundo o especialista, o mecânico utilizou uma bomba não original, o que “poderia levar à perda ou consumo excessivo de combustível em voo”.
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