O Brasil bateu o recorde histórico de casos de dengue neste ano – mais de 6,5 milhões de pessoas foram infectadas. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), isso representa 80% dos casos de dengue registrados no mundo. Felizmente, 2024 marcou também o início da vacinação contra a dengue, esperada pela comunidade científica há mais de 15 anos.
O Qdenga, fabricado pela farmacêutica japonesa Takeda, foi aprovado por órgãos reguladores de 24 países, com índice de proteção de 84% contra a doença. Em 2023, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou a vacina para a população de 4 a 59 anos. A vacina é distribuída pelo Sistema Único de Saúde (SUS) para a faixa etária de 10 a 14 anos. Até o momento, 2,2 milhões de crianças e adolescentes foram imunizados com a primeira dose, mas apenas 537 mil retornaram para a segunda, após intervalo de 90 dias entre as aplicações.
O Correspondência conversou com a médica e diretora executiva da Takeda Brasil, Vivian Lee, que falou sobre a situação da dengue no Brasil e de outros imunizantes que estão sendo estudados pela farmacêutica.
Qual é o cenário atual da dengue?
No ano passado, a Ásia foi a região com mais casos de dengue no mundo, mas a OMS, este ano, mostrou que o Brasil é responsável por 80% dos casos de dengue no mundo. São dados muito tristes para o país, tivemos mais de 6,5 milhões de casos e 5.303 mortes. Isso significa que, considerando o mesmo período do ano passado, tivemos um aumento de mais de 40% nos casos e chegamos a cinco vezes o número de mortes em 2023.
A que você atribui esse surto? As pessoas pararam de se preocupar com a dengue?
Em 2021, a população pensava que a dengue não existia mais por causa da Covid. Fizemos a mesma pesquisa com a Ipsos ano passado e já houve uma conscientização maior, com todos esses casos de dengue, e até epidemias em algumas cidades. Agora, 67% da população se lembra da dengue. Mas, existem muitos mitos.
Quais mitos?
Cerca de 42% da população pesquisada disse que a dengue ocorre mais no verão, mas isso não acontece mais. Outros 24% disseram que ocorre mais em populações de baixo nível socioeconômico, mas a dengue é democrática e atinge muitas pessoas. O que temos trabalhado é mostrar o quanto a dengue está presente no país, que pode ter casos graves. Mostre também que, no Brasil, houve uma queda muito grande na cobertura vacinal em todas as vacinas.
Qdenga também tem baixa cobertura?
Aproximadamente apenas 50% das doses entregues pela Takeda foram utilizadas. Das 5,5 milhões de doses entregues, apenas 2,7 milhões foram utilizadas. Em relação às doses administradas, a preocupação é com a segunda dose. Foram 2,2 milhões aplicados na primeira dose e apenas 537 mil na segunda. Não sabemos exatamente quantos deles já completaram os três meses e ainda não retornaram, mas de qualquer forma, o número de segundas doses é bem menor. Ainda este ano, entregaremos mais 600 mil doses de Qdenga, o que completa as 6,6 milhões de doses contratadas com o Ministério da Saúde. No próximo ano, a previsão é que 9 milhões de doses sejam disponibilizadas ao SUS. Nossa prioridade é o mercado público, disponibilizando inclusive vacinas em clínicas privadas.
O primeiro lote de Qdenga foi uma doação ao Ministério da Saúde, e essas doses venceram em julho. O Ministério da Saúde chegou a recomendar que as doses fossem aplicadas em toda a faixa etária permitida para evitar desperdício de vacinas. As doses foram descartadas por não terem sido utilizadas?
Pelo que sabemos, não. Todas as doses foram usadas. Nós monitoramos isso porque, se não foi utilizado, precisamos descartá-lo. Porém, apenas os primeiros expiraram “mais rápido” porque já haviam sido fabricados há algum tempo. A partir de agora, os lotes terão maior prazo de validade.
Há previsão de como será a vacinação contra a dengue no próximo ano? Vai aumentar a faixa etária, por exemplo?
A ministra da Saúde, Nísia Trindade, disse recentemente que vão avaliar, em setembro e outubro, os sorotipos de dengue no Brasil para ver como será a campanha do próximo ano e qual será a faixa etária. No mercado privado, a vacina já pode ser tomada por pessoas de 4 a 59 anos. Mas, no setor público, a faixa etária é definida por onde há maior impacto epidemiológico, maior número de internações e, também, pelo orçamento disponível. Provavelmente ainda não será oferecida a toda a faixa etária permitida pela Anvisa para tomar a vacina.
O cenário da dengue no próximo ano pode ser pior?
Os dados são elevados e a dengue antecipa seu período de pico. Há alguns anos, começava em abril ou maio e agora começava em fevereiro. Especialistas acreditam que novembro deste ano iniciará outro pico de dengue.
A Qdenga é uma das respostas para esta mudança da doença no país?
Estamos muito orgulhosos de ter incorporado a vacina. O Brasil é o primeiro país do mundo a incorporar a vacina contra a dengue em um sistema público de saúde. Recentemente, a OMS incluiu a Qdenga como vacina pré-qualificada, ou seja, pode ser adquirida por organizações, como a Organização das Nações Unidas (ONU), para realizar vacinação em larga escala em diversas regiões. Após 15 anos, trouxemos uma vacina quadrivalente (previne os quatro sorotipos da doença) que demonstrou alta eficácia e segurança.
Qdenga requer duas doses para atingir a eficácia máxima. Alguns especialistas afirmam que as vacinas de duas doses têm maior probabilidade de ter menor cobertura, devido à necessidade de as pessoas regressarem aos centros de saúde. Já foi estudada a possibilidade desta vacina ser de dose única?
Fizemos estudos com uma dose e duas doses e o que observamos, no nosso estudo de quatro anos e meio, foi que um mês após a primeira dose já se observava uma boa eficácia, cerca de 80% de redução nos casos de dengue. Porém, houve pessoas que não ficaram protegidas ao longo do tempo, por isso viu-se que era necessária a aplicação da segunda dose três meses depois. Isso já foi avaliado antes e vimos que para o Qdenga o melhor caminho é com duas doses.
E será necessária uma dose de reforço nos próximos anos?
Cerca de 20 mil crianças e adolescentes participaram do estudo do Qdenga ao longo de 4 anos e meio. Em alguns deles, foi aplicada uma terceira dose de reforço para verificar se aumenta a eficácia. Esta parte do estudo ainda está em andamento. Devemos saber o resultado do reforço em 2026. As pessoas também perguntam se o Qdenga não funciona para outros arbovírus, como zika e chikungunya, mas não é proteção cruzada.
A produção da Qdenga atualmente é suficiente para atender os brasileiros?
Atualmente temos uma fábrica na Alemanha, que produz Qdenga para o mundo, e estamos construindo outra para entregar no próximo ano. Em fevereiro deste ano, a Takeda assinou contrato com a empresa indiana Biological e foram fabricadas 50 milhões de doses de Qdenga por ano para os países mais endêmicos do mundo. O Brasil é sempre prioridade, principalmente porque tem 80% dos casos do mundo. Tudo isto é um plano estratégico para que, até 2030, possamos fornecer 100 milhões de doses de Qdenga por ano. Aqui no Brasil também estamos abertos à transferência de tecnologia, continuamos as negociações com a Fiocruz e o Ministério da Saúde.
E como estão essas negociações de parceria?
Em junho, saiu a Lei de Parceria para o Desenvolvimento Produtivo (PDP) que estabeleceu o prazo até 26 de setembro para que Fiocruz, Butantan e outras instituições com transferência de tecnologia e projetos de produção local apresentem seus projetos. A Fiocruz tem muitos projetos e já anunciou que não deverá haver tempo para apresentar a parceria com a Takeda até o final deste mês. Então, eles estão pegando os dados da Takeda e planejando o projeto. A transferência de tecnologia é um contrato de 10 anos, como mostra a experiência com a Hemobras (empresa estatal de insumos farmacêuticos inaugurada este ano).
A que você atribui a baixa vacinação contra a dengue?
É muito crítico, porque o Brasil foi referência mundial com o Programa Nacional de Imunizações (PNI). Desde 2016, observamos uma queda na cobertura vacinal e, quando a Covid chegou, o movimento antivacina e de fake news aumentou muito. O Brasil é o segundo no mundo a usar WhatsApp e tecnologia. Nós, especialistas, entendemos que a principal causa da baixa cobertura vacinal vem da desinformação e dos mitos que mencionei sobre classes e regiões socioeconômicas baixas do país.
Como a Takeda agiu para combater essa desinformação?
Temos muito trabalho a fazer junto à mídia para corrigir a desinformação sobre Qdenga e também sobre a vacinação. Criamos o site Conheça Dengue para conscientizar sobre a doença e a responsabilidade de todos em preveni-la, além de falar sobre a vacina. Junto com a arte, estamos fazendo uma exposição itinerante chamada Sem Sombra de Dengue, que chegará a Brasília no dia 20. São obras de arte que mostram que a dengue parece invisível, mas está lá. O primeiro local de exposição foi na Japan House, em São Paulo, e foi um sucesso. Começamos lá porque é onde está a Takeda Brasil. Depois fomos para Dourados, no Mato Grosso do Sul, porque é a cidade que está participando de um estudo de caso da Qdenga. A população do município foi a primeira a tomar a vacina e tem sido monitorada para verificar sua eficácia ao longo dos anos. Agora, chega a Brasília, que é a cidade brasileira com maior concentração de casos de dengue. Neste momento, são mais de 9.700 casos por 100 mil habitantes. Depois, a exposição segue para Salvador, na Bahia, que foi o local do Nordeste que registrou epidemia da doença este ano.
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