O uso excessivo da internet tem despertado preocupação crescente entre especialistas em saúde mental, principalmente pelo impacto que pode ter na vida dos jovens. Um estudo conduzido pela professora Irena Penha Duprat, da Universidade Estadual de Ciências da Saúde de Alagoas (Uncisal), explorou a relação entre o consumo excessivo de plataformas online e a ideação suicida entre estudantes universitários. A pesquisa foi tema da tese de doutorado, defendida este ano na Universidade de São Paulo (USP), sobre saúde mental de estudantes universitários.
A motivação de Irena para iniciar a pesquisa veio da observação de um aumento no número de estudantes que enfrentam transtornos como depressão, ansiedade e, em alguns casos, tentativas de suicídio, entre 2017 e 2018.
“Eu queria entender se o uso excessivo da internet estava influenciando os pensamentos suicidas dos estudantes”, explica. A pesquisa buscou respostas sobre a ligação entre o vício em internet e a frágil saúde mental de muitos jovens.
A pesquisa entrevistou 503 estudantes de seis cursos da área da saúde da Uncisal. Eles responderam a questionários que investigaram tanto o vício em internet quanto a ideação suicida, além de informações sociodemográficas para traçar o perfil dos estudantes. De acordo com o resultado, 51% dos estudantes foram classificados como portadores de algum tipo de dependência de internet, com níveis variando de leve a grave. “Na dependência leve a pessoa ainda pode perceber o excesso e parar de usar, mas nos casos moderados e graves isso não acontece mais. O vício age como qualquer outro: sem limites”, afirma Irena.
Além disso, 12,5% dos entrevistados apresentavam ideação suicida, ou seja, pensamentos sobre tirar a própria vida. Esse número, segundo a pesquisadora, está diretamente relacionado à dependência moderada ou grave de internet. “Os alunos que demonstraram altos níveis de ansiedade ou sintomas depressivos também apresentaram maior frequência de ideação suicida.”
A pesquisa também mostrou que a exposição às redes sociais, como Instagram e Facebook, é particularmente prejudicial à saúde mental das mulheres. Para o Correspondênciao psicólogo Rafael Braga comenta a influência dessas plataformas. “A internet pode afetar a saúde mental dos jovens de diversas maneiras. O uso excessivo pode levar ao isolamento social, agravando sentimentos de solidão e ansiedade. Além disso, a comparação constante com padrões irrealistas nas redes sociais pode desencadear problemas de autoestima e depressão.”
Braga destaca ainda que o cyberbullying é um dos fatores que agrava esta situação. “O cyberbullying é uma realidade, com graves efeitos psicológicos, como aumento do estresse, ansiedade e, em casos extremos, pensamentos suicidas.” Ele explica que as redes sociais, por serem projetadas para proporcionar gratificação instantânea – por meio de curtidas e comentários, por exemplo – podem se tornar altamente viciantes. “Eles ativam os circuitos de dopamina no cérebro, criando um ciclo de recompensas rápidas que leva à busca constante por validação externa”, acrescenta a psicóloga.
Esse ciclo, segundo Braga, gera constante comparação social, em que os jovens se sentem pressionados a atingir padrões irrealistas. Isso afeta diretamente a forma como veem o próprio valor, contribuindo para o aumento de problemas emocionais, como baixa autoestima e depressão.
Apesar do cenário preocupante, especialistas apontam que a internet também pode ser utilizada como ferramenta de prevenção ao suicídio, desde que utilizada de forma responsável e orientada. “A internet, apesar dos riscos, tem um grande potencial como ferramenta de apoio à saúde mental”, reflete Irena. Para ela, as plataformas online podem facilitar o acesso a informações e serviços de saúde, além de permitir que os jovens encontrem apoio emocional em grupos e comunidades virtuais.
Nesse contexto, o ambiente virtual pode servir como espaço de acolhimento e troca de experiências, desde que os jovens sejam orientados a buscar informações em fontes seguras e a praticar o consumo consciente das redes sociais. “A educação digital é essencial para que os jovens aprendam a fazer uso saudável da internet. Isso inclui desde a promoção de práticas como pausas regulares no uso, até o cuidado para não se comparar com padrões inatingíveis nas redes sociais”, sugere Braga.
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