Seis pessoas testaram positivo para HIV após receberem transplantes de órgãos no estado do Rio de Janeiro, por meio do Sistema Único de Saúde (SUS). O erro teria sido cometido pelo PCS Lab Saleme, cujos testes não detectaram infecção pelo vírus nos órgãos transplantados. O laboratório foi contratado por meio de licitação da Fundação Saúde, que faz parte da estrutura da Secretaria de Estado de Saúde do Rio de Janeiro (SES-RJ). A ministra da Saúde, Nísia Trindade, ordenou auditoria na filial carioca do Sistema Nacional de Transplantes (SNT).
A situação veio à tona ontem, em reportagem da rádio Band News FM. Mas as infecções foram descobertas em 10 de setembro, quando um dos pacientes transplantados foi internado num hospital após apresentar sintomas neurológicos relacionados ao HIV – e testou positivo. Ele não tinha o vírus antes de receber um novo coração no final de janeiro.
Uma investigação conjunta da Polícia Civil do Rio de Janeiro e do Ministério da Saúde constatou que dois exames realizados pelo PCS Lab Saleme não indicaram o vírus. O laboratório teve o contrato mais recente com a SES-RJ, no valor de R$ 11 milhões, assinado em dezembro de 2023. Porém, a empresa já presta serviços à Secretaria de Saúde desde 2022 —no total, já foram repassados cerca de R$ 20 milhões desde então para a empresa de análises clínicas.
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), por meio da Vigilância Sanitária local, fechou ontem o PCS Lab Saleme, até que as investigações sejam concluídas. Com isso, todos os exames passarão a ser realizados no Hemorio, por meio de provas da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Por recomendação do Ministério, todos os exames realizados pelo laboratório serão refeitos.
A 5ª Promotoria de Justiça de Proteção à Saúde Coletiva da Capital, do Ministério Público do Rio de Janeiro (MP-RJ), abriu inquérito civil para apurar irregularidades no programa de transplantes no estado. O Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio de Janeiro (Cremerj) abriu inquérito para apurar as denúncias.
“A situação é gravíssima”, disse Walter Palis, presidente da entidade, em nota.
Em nota, a SES-RJ informou que o caso é inadmissível e que criou uma comissão multidisciplinar para acolher os pacientes afetados. “O laboratório privado, contratado por meio de licitação da Fundação Saúde para atender o programa de transplantes, teve seu atendimento suspenso logo após o conhecimento do caso e foi fechado temporariamente. A Secretaria está realizando uma triagem com a reavaliação de todas as amostras de sangue armazenadas dos doadores, a partir de dezembro de 2023, data da contratação do laboratório O serviço de transplantes no Estado do Rio sempre realizou um excelente trabalho e, desde 2006, salvou a vida de mais de 16 mil pessoas”, afirma o ministério.
Nísia, por sua vez, emitiu uma nota para acalmar a população, garantindo que o sistema de transplantes do SUS é seguro e que se trata de um episódio isolado. “Daremos total assistência a essas pessoas e seus familiares. Aqui, além da solidariedade, quero reforçar o compromisso do Ministério em garantir a segurança, a eficácia e a qualidade que são marcas indiscutíveis do Sistema Nacional de Transplantes do Brasil”, afirmou o ministro, em um vídeo postado nas redes sociais.
Em comunicado, o Ministério da Saúde reforçou que o SNT é “reconhecido como um dos mais transparentes, seguros e consolidados do mundo”. “Existem normas rígidas que visam proteger tanto os doadores quanto os receptores, garantindo que os transplantes realizados no país mantenham um alto nível de confiabilidade”.
Parentesco
O PCS Lab Saleme tem sede em Nova Iguaçu, município da Baixada Fluminense, e é copropriedade de Matheus Sales Teixeira Bandoli Vieira, primo do ex-secretário de Saúde do Rio de Janeiro Doutor Luizinho, que é líder do PP na Câmara dos Deputados. Em nota, o parlamentar disse que “lamenta profundamente o ocorrido” e que quer “punição exemplar para os responsáveis”.
Luizinho também negou ter fechado qualquer contrato com laboratórios durante sua gestão na SES-RJ. “É muito triste, como um dos maiores defensores dos transplantes no país — minha vida pública é marcada pelo aumento do número de transplantes no Estado —, ver casos graves como este. Espero punição para os responsáveis, independentemente de quem sejam”, diz a nota do deputado.
Enquanto isso, a irmã do parlamentar, Débora Lúcia Teixeira, trabalha na Fundação Saúde, órgão do governo do Rio de Janeiro que celebra contratos com prestadores de serviços da SES-RJ.
Também em nota, o PCS Lab Saleme afirmou que abriu investigação interna para apurar quem foi o responsável pelo caso envolvendo diagnóstico de HIV em pacientes transplantados. Segundo o laboratório, esse episódio é “inédito na história da empresa, que atua no mercado desde 1969”.
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