Um caso que tramita na Justiça desde 2012 pode chegar ao fim nesta quinta-feira (12/12). A ação envolve a disputa por uma herança de R$ 100 milhões no Rio Grande do Sul. A história começa em 1942, na cidade de Carazinho, na Paraíba. De acordo com o extinto jornal NotíciasNa cidade trabalhava o médico Décio Henrique Zago, cujo consultório ficava no mesmo endereço onde ele também morava na época. A governanta Elvira dos Santos era a responsável pela limpeza e organização da casa e do escritório.
Segundo a ação, Elvira, então solteira, começou a ter relações sexuais com o médico. Em poucos meses, ela engravidou. Porém, na época existia uma cultura machista de repressão às mulheres solteiras que engravidavam.
Elvira decidiu então ir para o campo e refugiar-se durante a gravidez na casa da avó, que era parteira. Meses depois deu à luz José Decarli dos Santos. José, segundo a ação, passou a infância e a adolescência sem saber quem era seu pai. Porém, já adulto, sofreu um acidente e foi parar no hospital da cidade em estado grave, recebendo cuidados precários e passando a viver da renda concedida pela Previdência Social.
Vendo aquela situação, o médico que atendeu José resolveu contar-lhe que ele era filho de Décio Zago, que já possuía uma grande fortuna para os padrões da época. O profissional disse a José que ele não precisava “estar em situação de penúria, tendo em vista que seu pai era uma pessoa economicamente abastada”. O médico então entrou em contato com Décio Henrique, que autorizou a realização de todos os procedimentos necessários para salvar a vida do suposto filho.
Em 1979, José procurou Henrique Zago e perguntou se ele era de fato seu pai. Zago permaneceu em silêncio e não negou nem confirmou a história. Hoje, 80 anos depois, faleceram José Decarli e Henrique Zago. Porém, os filhos de José lutam na Justiça pelo reconhecimento da paternidade. Um teste HLA, técnica que antecedeu o teste de DNA, foi realizado na década de 80, com autorização de Henrique, mas teve resultado inconclusivo.
Netos e filhos envolvidos na ação
Luis Martinho, 50 anos, é engenheiro agrônomo e carrega na memória as buscas incansáveis do pai, José Carli, pelo reconhecimento da paternidade. Desde criança, Luiz acompanhou os esforços do pai, que lutou por algo que nunca aconteceu em sua vida: a justiça. Hoje, ao dar continuidade ao processo, Luiz deixa claro que o objetivo vai além de qualquer questão financeira. “Mas, para mim, não haverá mais justiça, porque o principal interessado, que era meu pai, não está mais aqui conosco. Porém, seria algo importante para pelo menos honrar a sua memória”, declara.
Para Luis, a importância de levar esse processo adiante está na correção de erros que não podem mais ser revertidos, mas que podem prevenir injustiças futuras. “Se conseguirmos corrigir algo daqui para frente, em outros processos e para outras pessoas, acredito que isso poderá deixar um legado significativo. Tornar este mundo um lugar um pouco melhor e mais justo para os outros será, sem dúvida, uma grande vitória para honrar a memória do meu pai”, acrescenta.
Foram realizados dois testes de DNA, com resultado negativo para paternidade. Porém, segundo as denúncias apresentadas no processo, os exames apresentam diferenças técnicas e uma das amostras, da viúva de Henrique Zago, foi coletada em casa, sem que um representante de José Decarli acompanhasse o exame. Além disso, um dos exames teria indicado que uma das filhas de Zago não é da mesma linhagem genética das irmãs, ou seja, como se não fosse da mesma família —o que reforça o risco de inconsistência nos resultados.
A audiência desta quinta acontecerá na 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul e o Tribunal decidirá se aceita ou não o pedido para a realização de novo exame de DNA. Como o réu da ação já faleceu, assim como um dos autores, o exame deverá ser realizado nos filhos, primos e demais parentes próximos de Henrique Zago. A amostra genética de José Decarli ainda está preservada e poderá ser utilizada em um novo teste, com padrões científicos mais rigorosos. Procurada, a defesa de Henrique Zago não retornou mensagens e ligações. A defesa dos filhos de José Decarli afirmou que o processo segue sigiloso e que aguardam a sentença que será dada pela Justiça.
Entre os objetos de herança, que podem ultrapassar a marca de R$ 100 milhões, estão imóveis, fazendas, veículos e a Agropecuária Zago – empresa de cultivo de plantas e cultivos com sede em Santa Cruz do Sul – RS.
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