Por trás de cada entrega de lanches ou compras existe risco de morte. A grande maioria dos pedidos de entrega atravessa a cidade nas costas de motoboys e motogirls, os trabalhadores do trânsito mais vulneráveis. Eles dividem espaço com veículos que pesam toneladas e trafegam em alta velocidade, com pouca proteção além dos capacetes. Outro problema é a falta de apoio. Raramente obtêm apoio financeiro após um acidente em que têm de passar meses ou mesmo anos afastados do trabalho.
Para quem anda de moto, seja para trabalho ou transporte pessoal, o primeiro semestre traz dados preocupantes. Segundo levantamento feito pelo Correio no sistema DataSus, do Ministério da Saúde, houve um aumento de 14% no número de motociclistas internados no Sistema Único de Saúde (SUS) nos primeiros quatro meses de 2024, em comparação com o mesmo período de 2023. 50.248 internações, ante 44.050 em janeiro, fevereiro, março e abril de 2023.
No total, no ano passado, 141.890 motociclistas foram internados no SUS, uma média de 289 por dia. Considerando apenas o Distrito Federal, foram 771 internações até abril, ante 591 no mesmo período do ano passado —um aumento de 30%. Em 2023, o total foi de 2.087 internações.
Ainda não foram divulgadas informações sobre as mortes de motociclistas no ano passado. Em 2022, ocorreram 12.058 mortes. Ou seja, todos os dias morriam, em média, 33 motoristas nas ruas e rodovias do país. Muitos deles trabalhavam como entregadores ou mototaxistas. Cada número corresponde a uma família, que perdeu pai, mãe, filho e, muitas vezes, a renda principal da casa.
Além da perda inestimável de vidas, é importante considerar o impacto dos acidentes nos cofres públicos. A negligência com o trânsito, principalmente, custa caro. Cada internação em 2023 custou em média R$ 1.561,31, com gasto total de R$ 221,5 milhões no ano. Até abril, foram gastos R$ 80,5 milhões, segundo o Ministério da Saúde. Este valor corresponde apenas ao tratamento das vítimas.
Faltam dados e estudos actualizados sobre o impacto total no tesouro, incluindo a Segurança Social, os seguros e o custo para a produtividade do país. As estimativas mais recentes foram publicadas em 2020. Segundo levantamento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), divulgado em junho daquele ano, o Brasil perde anualmente um total de R$ 50 bilhões com colisões.
Segundo o instituto, um único acidente nas rodovias federais custa ao país R$ 261.689, podendo chegar a R$ 664.821 quando há óbito. Em um ano, o valor total foi estimado em R$ 12,8 bilhões. Nas rodovias estaduais e municipais, o custo chega a R$ 30 bilhões. Nas cidades, fica entre R$ 10 bilhões e R$ 12 bilhões. Os pesquisadores explicam que os números são apenas estimativas e provavelmente estão subestimados, pois levam em conta quanto uma pessoa que se aposentou por invalidez ou morte deixa de produzir para o país.
Outros dados ajudam a ilustrar a fragilidade das motocicletas. Segundo relatório do DPVAT, seguro de proteção às vítimas de acidentes de trânsito, os motociclistas foram responsáveis por 79% dos pedidos de indenização em 2020 —ano em que a contribuição deixou de ser obrigatória e foi divulgado o último levantamento. Foram pagas 245.551 indenizações aos motociclistas no período, das quais 52.768 cobriram despesas médicas, 175.371 por invalidez permanente e 17.412 por morte. O DPVAT, que substituirá o modelo antigo, começará a ser cobrado no próximo ano.
Procurada pelo Correio para comentar o aumento das internações, a Secretaria Nacional de Trânsito (Senatran), vinculada ao Ministério dos Transportes, disse não ter porta-voz disponível para discutir o assunto.
Fora de circulação
Existe uma frase entre os motociclistas que resume a exposição do motorista em caso de acidente: “você é o para-choque da moto”. Embora os motoristas de automóveis sejam protegidos por gaiolas de metal e passem ilesos por muitas colisões, os motoristas correm risco em qualquer acidente. Mesmo uma pequena quantidade de óleo ou areia na estrada pode causar um acidente.
Segundo o ortopedista Julian Machado, membro da Sociedade Brasileira de Trauma Ortopédico (SBTO), as lesões mais comuns ocorrem na cabeça, coluna e membros inferiores. Os membros superiores também podem ser afetados, dependendo do mecanismo da queda. Fraturas são comuns. Ele ressalta que mesmo lesões que não coloquem em risco a vida do motociclista podem tirá-lo do trabalho, talvez, por anos.
“É muito comum vermos fraturas de tíbia, fêmur, calcanhar, patela. São lesões relativamente menos graves, mas que podem levar à incapacidade para o trabalho entre seis meses e alguns anos”, disse o médico. Ele aponta o aumento do número de motocicletas nas ruas e de trabalhadores informais como um dos motivos do aumento das internações. No caso dos motoboys, Julian Machado destaca ainda que a maioria é atendida pelo SUS, pois não tem acesso à rede privada
“Comentamos até que as fraturas de tíbia, as mais comuns entre os motoboys, são institucionais. Só se vê no SUS, não em hospitais privados”, destacou. Sobre o aumento das internações, Machado afirma que as melhores opções de tratamento atualmente são as cirúrgicas, o que também ajuda a explicar as internações. “Então, isso também aumenta a resolução dos casos e reduz o tempo de incapacidade”, disse. Mas o aumento do número de motocicletas nas ruas é o principal fator.
Aos motoristas, o ortopedista orienta o uso do máximo de equipamentos de segurança possíveis para evitar lesões, além de respeitar as leis de trânsito e reduzir a velocidade. Cuidados maiores devem ser tomados com quem anda de motocicletas de grande cilindrada, com mais potência. Além do capacete obrigatório, leggings, calças, botas, coletes, luvas, jaquetas reforçadas podem reduzir lesões.
No entanto, a maioria das pessoas que dependem de motocicletas para transporte e trabalho não pode pagar uma proteção de maior qualidade, que às vezes pode ser mais cara do que as motocicletas mais simples. A verdadeira solução é mudar seu hábito de trânsito.
Morador de Brasília, Julian Machado destaca que percebeu na prática a eficácia das mais famosas políticas implementadas até então. “Peguei dois acontecimentos importantes: a lei que obrigava as pessoas a parar nas faixas de pedestres (em 1997) e deu multas mais duras, o que trouxe diminuição no número de acidentes, e a Lei Seca (em 2008). porta do pronto-socorro, posso contar por que vivi isso. O problema do brasileiro é que ele acaba se acostumando com as coisas, relaxando, e o número de acidentes aumenta gradativamente”, destacou o médico.
» Leia amanhã histórias sobre motociclistas baseados em aplicativos que sofreram acidentes enquanto trabalhavam.
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