O ultrassom, tradicionalmente utilizado para captar imagens do corpo, poderá ter seu uso ampliado na medicina. Trabalhos recentes mostram que esta tecnologia tem potencial para ser direcionada para tratamentos cerebrais. De acordo com uma publicação liderada pela Universidade de Plymouth, e publicada ontem na revista PLoS Biology, a ferramenta pode mudar a abordagem de diversas condições neurológicas e psiquiátricas.
Segundo o trabalho de revisão, o ultrassom tem sido uma ferramenta essencial na medicina. No entanto, os pesquisadores estão explorando uma nova fronteira: a estimulação ultrassonográfica transcraniana (UST), uma técnica que permite que áreas específicas do cérebro sejam direcionadas de forma não invasiva. Se funcional, a estratégia poderá criar novas possibilidades de tratamento de diversas condições, como dor crônica, alcoolismo, transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) e doença de Parkinson, sem a necessidade de medicamentos ou intervenções cirúrgicas.
Segundo os autores do artigo, Keith Murphy, cofundador da Attune Neurosciences e pesquisador da Universidade de Stanford, Elsa Fouragnan, professora principal do Laboratório de Estimulação Cerebral do Centro de Imagens e Pesquisa Cerebral da Universidade de Plymouth, além de uso terapêutico, a UST também serve como ferramenta diagnóstica. Os cientistas discutiram como essa tecnologia pode ser usada para examinar temporariamente regiões do cérebro antes de iniciar o tratamento, funcionando como uma espécie de “ferramenta de busca e resgate” para identificar as origens dos problemas neurológicos.
Os autores alertam que existem desafios complexos a serem superados antes que a UST possa ser implementada na prática clínica. A diversidade anatômica do cérebro humano torna necessária a adaptação da técnica para melhorar sua eficácia e acessibilidade. Além disso, embora tenham sido feitos avanços no desenvolvimento da tecnologia, a viabilidade económica e a sustentabilidade ainda são preocupações.
Fase de testes
Os cientistas estão atualmente testando um dispositivo UST pequeno e fácil de usar, que permite aos pacientes realizar a terapia em casa após uma avaliação clínica inicial. Keith Murphy enfatizou em comunicado que a portabilidade deste dispositivo é um passo crucial para tornar as terapias cerebrais avançadas acessíveis a todos. “Muitas pessoas enfrentam barreiras financeiras ou restrições de tempo que dificultam a visita às clínicas, e esta nova abordagem pode ajudar a superar estes obstáculos.”
Elsa Fouragnan destacou a importância dos avanços na compreensão do funcionamento do cérebro. Embora a pesquisa tenha evoluído, os tratamentos não acompanharam o ritmo. Ela acredita que a UST pode ser a solução para esta lacuna, apresentando-se como uma ferramenta inovadora para lidar com condições neurológicas e de saúde mental.
Guilherme Rossoni, neurocirurgião especializado no tratamento de doenças do cérebro, coluna e dores crônicas e membro titular da Sociedade Brasileira de Neurocirurgia (SBN), o contínuo desenvolvimento de pesquisas e novas possibilidades desta tecnologia se tornará cada vez mais acessível e eficaz.
“Nos próximos anos, o avanço dos dispositivos e a possibilidade de uso doméstico, por exemplo, podem ampliar o acesso dos pacientes aos tratamentos neurológicos. Além disso, toda e qualquer melhoria na integração com outras tecnologias não só facilita a vida dos profissionais, mas também beneficiar os pacientes, que é o nosso principal objetivo.”
Segundo os autores, a possibilidade de integração do ultrassom focalizado com outras tecnologias emergentes, que permitem a comunicação direta entre o cérebro e dispositivos externos, é um campo promissor a ser explorado. Isto pode não só melhorar a precisão dos tratamentos, mas também expandir as capacidades das tecnologias existentes.
Luciana Barbosa, neurologista e coordenadora de neurologia do Hospital Sírio-Libanês, de Brasília, destaca que o método estimula as especificidades do cérebro por meio de ondas. “Isso pode realmente trazer benefícios ao paciente quando combinado com a reabilitação”. Para o especialista, são necessárias mais pesquisas para que a estimulação ultrassonográfica transcraniana possa ser integrada à prática clínica, apesar do ultrassom já ser considerado uma grande ferramenta na medicina.
“São várias vantagens relacionadas, é um exame que não tem custo alto, é indolor, não invasivo e pode ser realizado à beira do leito do paciente ou no consultório”.
Habilite a tecnologia
“O ultrassom pode facilitar a entrada de medicamentos, como quimioterápicos, em casos de câncer que precisam chegar ao cérebro, pois a passagem desses medicamentos é difícil. evolução da tecnologia nos próximos anos, a ideia é trazer esses avanços para a prática clínica. Esse equipamento é extremamente caro, na casa dos milhões, e ainda de difícil acesso, principalmente nos países em desenvolvimento. tecnologia viável de forma mais acessível Os principais alvos desta pesquisa são atualmente os tremores da doença de Parkinson, a dor e alguns distúrbios psiquiátricos, como a agressão. É sempre possível transformar essas abordagens em tratamentos viáveis.
Antônio Oliveira, neurocirurgião funcional do Hospital Anchieta, em Brasília.
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