Os vírus se destacam pela grande capacidade de evolução e adaptação. Estas características levam ao esforço contínuo para que a vacina contra a gripe seja administrada anualmente. Todos os anos, novas cepas de patógenos surgem e são capazes de superar a imunidade que o corpo desenvolve após infecções ou vacinações anteriores. Agora, os cientistas descobriram que a chave para a capacidade humana de enfrentar infecções de gripe leves ou mais graves parece estar relacionada com a abundância de um receptor específico, presente em algumas células do sistema imunológico, o CD209, e um tipo de açúcar, o ácido siálico. .
A pesquisa publicada na revista Immunology e liderada pela Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, mostra como a composição dos anticorpos pode influenciar na gravidade da doença. Em experimentos com ratos, a equipe conseguiu demonstrar uma forma de evitar sintomas graves de gripe, independentemente da cepa do vírus. Segundo os cientistas, esta descoberta pode ser crucial para controlar futuros surtos de gripe e até de outras doenças infecciosas.
O trabalho também pode ajudar a explicar por que os idosos são mais vulneráveis a formas graves de gripe e outras doenças. Taia Wang, professora associada de doenças infecciosas e microbiologia na Stanford Medicine e autora sênior do estudo, enfatizou que “a gripe continua a ser um risco incrivelmente perigoso para a saúde global”, citando a pandemia de gripe de 1918, que matou 50 milhões de pessoas. e infectou um quinto da população mundial.
No centro da pesquisa está o receptor CD209, encontrado nas células do sistema imunológico, que desempenha um papel antiinflamatório durante uma infecção por gripe. A equipe de Wang conseguiu manipular a composição dos anticorpos para ativar essa estrutura, limitando a resposta inflamatória que muitas vezes piora os danos pulmonares. Embora o vírus continuasse a se multiplicar no órgão, a técnica reduziu o risco de lesões graves.
Segundo o trabalho, a redução da gravidade da doença não esteve relacionada à eliminação do vírus, mas sim à modulação da resposta inflamatória. Em casos de infecção grave, é a inflamação descontrolada que causa problemas significativos nos pulmões, e não a replicação do vírus. A descoberta de que o anticorpo pode controlar a inflamação sem afetar diretamente a replicação viral foi um avanço significativo na investigação.
Uma das principais descobertas foi a importância do ácido siálico, um tipo de açúcar presente nos anticorpos. A equipe observou que as pessoas que tiveram infecções mais leves apresentavam anticorpos com níveis mais elevados de ácido siálico. Quando testaram esta teoria em ratos, verificaram que esta característica protegia eficazmente os animais contra infecções graves, mesmo em doses letais do vírus.
Anticorpos
A publicação mostrou que o ácido siálico influenciou a interação de anticorpos com macrófagos alveolares — células do sistema imunológico localizadas nos pulmões. Essas estruturas desempenham um papel crucial no reconhecimento e eliminação de patógenos. Quando anticorpos ricos em ácido siálico se ligaram ao receptor CD209, foi induzida uma resposta anti-inflamatória, que aliviou os danos pulmonares.
Segundo Eduardo Medeiros, professor de Infectologia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e diretor técnico do Hospital São Paulo, a inflamação é muito importante para combater infecções e reparar tecidos que sofreram danos pela ação de um microrganismo, mas pode ser perigoso se for exacerbado e piorar o quadro clínico. “É como se o corpo perdesse o controle dos mecanismos de destruição do agente agressor. Vimos muito isso na Covid, um dos tratamentos para as formas mais graves com envolvimento pulmonar foi o uso de corticoides que reduzem a resposta inflamatória. os corticosteróides são inespecíficos e podem reduzir a capacidade das células de defesa de destruir o microrganismo agressor”.
O estudo revelou ainda que, em camundongos, a redução da inflamação melhorou a troca de oxigênio e dióxido de carbono, essenciais para a recuperação pulmonar após a infecção. A pesquisa também levantou questões sobre a possibilidade de usar apenas o “haste” do anticorpo – a parte não ligada ao patógeno – para tratar a inflamação, sem depender dos “chifres” que se ligam diretamente ao vírus. Anticorpos ricos em ácido siálico estão sendo estudados no tratamento de doenças autoimunes, que, assim como a gripe, envolvem inflamação. A equipa está a realizar estudos clínicos para avaliar se estes anticorpos podem prever a progressão da gripe em humanos.
Para os cientistas, a pesquisa poderá ter aplicações contra diversas outras doenças infecciosas e condições inflamatórias. Wang observou que a idade parece ser um factor importante na quantidade de ácido siálico nos anticorpos, o que pode explicar a maior vulnerabilidade dos idosos às doenças inflamatórias crónicas e a diversas condições associadas ao envelhecimento, como problemas cardíacos, Alzheimer e até cancro. .
Caminho promissor
Este estudo pode ter implicações práticas relevantes no futuro. Embora já saibamos que pessoas diferentes respondem de maneira diferente ao mesmo agente infeccioso, ainda temos um arsenal diagnóstico limitado para prever quem terá um desfecho mais ou menos grave. Atualmente confiamos fortemente em dados epidemiológicos, como a idade e a presença de outras doenças, para estimar o risco. A descoberta de diferenças na quantidade de ácido siálico presente nos anticorpos de determinados indivíduos e seu papel na resposta inflamatória do organismo abre novas possibilidades para decisões clínicas. Esta constatação poderá ser objeto de estudos futuros não só para o tratamento da gripe, mas também para outras doenças respiratórias infecciosas. Este é um caminho promissor para novas intervenções médicas, à semelhança do que já fazemos em certos casos com o uso de corticosteróides para controlar a inflamação.
Jéssica Fernandes Ramos, infectologista, membro das sociedades Brasileiras de Infectologia, Transplante de Medula Óssea e Hematologia e Hemoterapia
pan cred login
whatsapp download blue
bpc consignado
pague menos png
abara png
picpay baixar
consignado do auxílio brasil
empréstimo sem margem inss
inss credito
bpc loa