No início do ano passado, Miguel de Mello Bueno, de apenas 7 anos, queixou-se de dores na perna após um dia intenso de brincadeiras na praia.
Estranhando a situação, a mãe Halana Karine de Mello, 29, levou o filho ao Pronto Atendimento, onde o menino estava medicado e liberado.
Algumas semanas depois, uma nova reclamação. Ao procurar um pediatra em Ponta Grossa (PR), cidade onde moram, Halana se tranquilizou e informou que as dores eram decorrentes da fase de crescimento do bebê. criança.
“As dores não eram frequentes. Aconteciam a cada 15 ou 20 dias, duravam um dia e passavam. Os exames de sangue estavam normais, então acreditei que fosse por crescimento”, lembra a mãe.
Porém, em maio, um episódio de dores intensas, que deixou Miguel impossibilitado de andar, fez com que a família procurasse atendimento hospitalar. O menino, além das dores nas pernas, também sentia dores nas costas e estava pálido.
“Ele chorou de dor. Os médicos decidiram interná-lo para fazer vários exames. No primeiro exame de sangue ele já apresentava alterações nas plaquetas”, lembra Halana.
Miguel foi diagnosticado com leucemia linfocítica aguda. Este tipo de câncer no sangue afeta os glóbulos brancos, que são as células de defesa do nosso corpo.
Levantamento do Instituto Nacional do Câncer (Inca) estima que serão registrados 11.540 casos de leucemia no país no triênio 2023 a 2025.
O câncer em crianças e adolescentes é raro e representa apenas 3% do total de novos casos esperados a cada ano no Brasil. Porém, a leucemia é o que mais acomete essa população, representando 25% a 35% de todos os tumores infantis.
“Nesta população, devido à fase de crescimento, as células se reproduzem muito rapidamente e durante essa reprodução pode ocorrer uma mutação celular na medula óssea”, explica Ana Paula Kuczynski, oncologista pediátrica do Hospital Pequeno Príncipe.
Existem mais de 12 tipos de leucemia, sendo as mais comuns a leucemia mieloide aguda (LMA) e a leucemia linfocítica aguda (LLA).
As chances de cura são diferentes para crianças e adultos. As leucemias linfóides agudas são as mais comuns em crianças e adolescentes e têm 85% a 90% de chance de cura.
Para crianças que possuem mieloide, as chances ficam entre 60% e 65%, pois esse tipo é considerado mais agressivo para esse grupo.
Outro fator relevante é que a leucemia representa a principal causa de morte por doenças entre crianças e adolescentes de um a 19 anos no país, cerca de 8% do total.
“Como as células do corpo das crianças se reproduzem mais rápido, isso também acontece com as células doentes, que também se reproduzem mais rápido que as dos adultos, fazendo com que a doença se espalhe rapidamente”, explica Viviane Sonaglio, pediatra líder do Centro de Referência em Tumores Pediátricos do ACCamargo Cancer Centro hospitalar.
Relativamente aos factores de risco, o cancro na infância não está relacionado com factores externos como condições ambientais, alimentares ou de estilo de vida, como acontece nos adultos.
Porém, algumas crianças têm predisposição genética para a doença, como aquelas com síndrome de Down, que têm até 25 vezes mais chances de serem acometidas pela leucemia, segundo especialistas ouvidos pela BBC News Brasil.
“Essa síndrome é conhecida como trissomia 21, que é uma alteração genética que ocorre durante a divisão celular fetal. O fato de uma criança já ter tido essa alteração celular aumenta as chances de haver uma nova alteração celular, aumentando as chances da doença”, completa Kuczynski.
Preste atenção a todos os sinais
A leucemia é uma doença que afeta a medula óssea, onde é produzido o sangue, por isso os sintomas mais comuns são palidez, anemia, fraqueza e cansaço. Como consequência, é comum o aparecimento de inchaços no pescoço, nas axilas e na barriga. Além de manchas roxas pelo corpo.
No entanto, nem sempre é esse o caso. Luísa Alves Spíndola, de 9 anos, foi diagnosticada com leucemia linfoblástica aguda em 2019. Segundo a mãe da menina, Vanessa Alves Spíndola, o primeiro sinal de que algo não estava bem com a filha foi a falta de apetite.
“Ela começou a perder o apetite e a suar muito durante a noite. Achamos estranho e levamos ela ao pediatra, que pediu exame de sangue. Os exames mostraram uma pequena alteração e o pediatra chegou a considerar que poderia ser um erro laboratorial. Repetimos o exame uma semana depois e a mudança já era muito maior. Foi aí que começamos a investigar a causa”, detalha a mãe.
Poucos dias após o diagnóstico, a criança foi encaminhada para tratamento quimioterápico. Os resultados foram positivos no primeiro mês e a doença começou a regredir.
Em 2021, Luísa finalizou as sessões de quimioterapia e atualmente só faz acompanhamento de rotina semestralmente.
“Ela tem uma vida normal, vai à escola e pratica esportes. Atribuímos sua rápida recuperação ao diagnóstico precoce, que evitou que o câncer tomasse maiores proporções e regredisse após as primeiras sessões de quimioterapia”, acrescenta Vanessa.
Para o diagnóstico precoce, pais e pediatras precisam estar atentos a qualquer sinal diferente no comportamento da criança. E não menospreze as reclamações dos pequenos.
“Uma criança que tem febre injustificada ou que começa a acordar à noite com dores, por exemplo, precisa ser investigada para saber a causa. Quando os sinais ficam mais evidentes, como palidez ou sangramento, é porque a doença está evoluindo”, explica a oncologista pediátrica Melissa Ferreira de Macedo, membro da Associação Brasileira de Linfoma e Leucemia (Abrale).
Para o diagnóstico, inicialmente é solicitado um hemograma onde pode ser analisada a redução das plaquetas e alterações nos glóbulos brancos. Na maioria dos casos, também é possível observar células leucêmicas no sangue do paciente durante o exame.
Caso sejam encontradas alterações, outros exames devem ser solicitados antes de fazer o diagnóstico. Um desses exames é o mielograma, que analisa a medula óssea.
Segundo o Inca, os principais sintomas da leucemia são:
- Febre por mais de sete dias sem causa aparente
- Dor no osso
- Aparecimento de manchas roxas na pele
- Palidez
- Cefaléia persistente e progressiva, principalmente noturna, que acorda a criança ou aparece ao se levantar pela manhã, acompanhada de vômitos ou sinais neurológicos.
- Leucocoria (reflexo branco na pupila do olho quando exposto à luz)
- Distúrbios visuais
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