Candidata à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no DF, nas últimas eleições, a advogada Thaís Riedel critica a baixa participação das mulheres na presidência das secções. Atualmente são apenas cinco — em Santa Catarina, Bahia, Mato Grosso do Sul, São Paulo e Paraná — e nenhum deles, segundo Thaís Riedel, é negro. Mesmo assim, o advogado e professor, especialista em direito previdenciário, preferiu não liderar chapa este ano e busca outras formas de participação. Thaís diz que sofreu ataques de todos os tipos, com viés machista, e acredita que estavam sofrendo que um homem não enfrentaria. Pensativa, mas firme em seus posicionamentos, Thaís Riedel defende o devido processo legal e concorda com o pedido da OAB Nacional de explicações ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), a respeito da condução de processos envolvendo bolsonaristas. “É papel da OAB defender o Estado Democrático de Direito e a boa aplicação das leis, conforme artigo 44 do Estatuto da OAB, além de ser a legítima representante dos interesses dos advogados”, afirma.
Na sua visão como advogado e professor, você acredita que o ministro Alexandre de Moraes cometeu algum desvio de conduta ao misturar as funções do STF e do TSE?
Não tive acesso aos autos e não posso, portanto, comentar o caso concreto. É importante destacar que o ministro Alexandre de Moraes teve que desempenhar um papel importante à frente do TSE e do STF num momento em que o país sofria agudo conflito social. Entendo que há áreas nas quais ainda precisamos avançar para trazer novos paradigmas, adequados ao momento social que vivemos. O inquérito policial, por exemplo, é um instrumento que vem sendo debatido na academia e no Legislativo, espaços adequados para esta discussão. Os princípios fundamentais deste instituto, que pelas suas características é pré-processual e inquisitorial, ou seja, não tem partes e, portanto, não tem defesa, precisam ser respeitados e observados com atenção, para que haja o devido processo legal, que é a barreira intransponível do nosso processo civilizatório, seja respeitado. Garantir a separação entre acusador, vítima, defesa e juiz é essencial.
Você acha que a OAB Nacional agiu corretamente ao pedir esclarecimentos ao ministro Alexandre de Moraes?
Sem dúvida. É papel da OAB defender o Estado Democrático de Direito e a boa aplicação das leis, conforme art. 44 do Estatuto da OAB, além de ser o legítimo representante dos interesses dos advogados. A lisura do processo inquisitorial é fundamental e indispensável, tanto para a manutenção do Estado Democrático de Direito como para o pleno exercício do trabalho jurídico. Já existe uma súmula do próprio STF, 14, que garante o acesso ao processo inquisitorial por advogados. Tenho certeza que temos maturidade institucional, no Judiciário brasileiro, suficiente para entender que todos estamos cumprindo nossas funções legalmente estipuladas.
Na sua opinião, há excesso de poder do STF?
As competências do STF estão previstas constitucionalmente. O Tribunal tem as competências que o constituinte determinou. Nas sombras e nas lacunas jurídicas, devem ser observados os princípios constitucionais, incluindo a segurança jurídica e a dignidade humana. E há pequenas diferenças que entendo que estão sendo abordadas e precisam ser melhor discutidas com a sociedade em geral. Por exemplo, o Regimento Interno do STF é enquadrado como norma infraconstitucional e trazer ao debate o que isso significa é muito relevante. Não está acima de uma determinação legal, como no caso da autorização de declarações orais de advogados em recursos, nem acima do Estatuto da OAB, nem do Código Penal, nem da própria Constituição. Acho que é um momento oportuno para esse debate e para uma grande consulta nacional.
Faltam mulheres no comando das seções da OAB?
Sem dúvida. Há alguns anos, temos mais de 50% dos inscritos na Ordem. Em quase todos os estados somos maioria e só temos cinco mulheres presidentes de seção. E é importante nomeá-las, são as médicas Cláudia da Silva Prudêncio, em SC, Daniela Borges, na BA, Gisela Cardoso, no MS, Maria Patrícia Vanzolini, em SP e Marilena Indira Winter, no PR. Nenhum deles é negro. Mas é importante dizer que temos visto progressos. Nas últimas eleições já conseguimos que 50% dos candidatos que concorrem às eleições da OAB sejam mulheres e 30% sejam negros. O resultado, ainda tímido, já foi observado com a eleição dos cinco colegas, algumas outras candidatas chegaram em condições de concorrência. É um progresso, mas definitivamente precisamos de mais.
No DF, apenas uma mulher —por um mandato— presidiu a OAB. Nesta eleição, haverá disputa masculina. Por que você desistiu de correr?
Primeiramente preciso dizer que tenho muito orgulho da trajetória dessa campanha (2021). Foi uma jornada coletiva e linda. Foi um momento complicado para o país e para o mundo, estávamos no meio de uma pandemia e, mesmo assim, consegui, com segurança, passar por todos os trechos, conhecer muita gente e agregar valores que para mim são inegociáveis, como parceria, inclusão e fidelização. Em segundo lugar, ninguém é candidato por si mesmo. Faço parte de um grupo que tem uma visão do papel do direito como instrumento de transformação, tanto na vida dos advogados como na sociedade, e que isso exige uma prática jurídica mais plural e diversificada. E nesses três anos percebi que não preciso ser responsável pela seção para trabalhar para isso. Estar no Conselho Federal da Ordem, por exemplo, me dá a possibilidade de contribuir com temas relacionados ao direito em nível nacional e com mais assertividade em temas relevantes. E é preciso dizer que foi uma campanha linda da nossa parte, mas também foi uma campanha extremamente violenta, com insultos pessoais, invasão da minha vida privada, o que nunca aconteceria se fosse um candidato homem. O respeito e a disputa de ideias devem ser o foco de qualquer candidatura. É fundamental que a sociedade não aceite mais esse tipo de comportamento.
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