Este foi definitivamente um momento glorioso para Antonio Saboia. O ator, que acaba de completar 40 anos, está no elenco do aclamado filme Eu ainda estou aquiprodução brasileira assinada por Walter Salles que, no dia 1º de setembro, foi aplaudida de pé após sua exibição no Festival de Veneza. Por estar presente na Itália neste momento histórico para o cinema brasileiro, não pôde comparecer à festa de lançamento da novela. Mania por vocêrealizada três dias antes, no Rio de Janeiro, e comemorar mais uma conquista. A obra marca seu retorno, após 10 anos, ao horário nobre da Globo, quando fez a primeira fase do Em famíliade Manoel Carlos, em 2014. Agora, com papel de destaque, ainda que de curta duração.
No filme, para o qual foi convidado pelo diretor enquanto tomavam suco, Antonio interpreta o escritor Marcelo Rubens Paiva e contracena com Fernanda Torres e Fernanda Montenegro. “Quando descobri que chamaria Fernanda Montenegro de mãe, fiquei em êxtase”, confessa o ator, em entrevista exclusiva ao Correspondênciaainda da Europa.
Na novela de João Emanuel Carneiro, Saboia interpreta o marido de Mariana Ximenes e filho de Eliane Giardini, dois personagens do núcleo principal da nova trama das 21h, que estreou na última segunda-feira. “Meu objetivo era, sim, voltar a fazer novelas também, acredito que seja importante transitar entre cinema, TV e teatro. São formas de trabalhar completamente diferentes, e todas elas, à sua maneira, enriquecem a carreira do ator. experiência”, argumenta.
A sessão de aplausos vivida em Veneza não é novidade para Savoy – a criação do cinema. Em 2021, Deserto privadoO filme de Aly Muritiba protagonizado pelo ator, conquistou o prêmio do público na 78ª edição do festival, após ser aplaudido pelo público por mais de 10 minutos. O mesmo aconteceu com Noitibóde Kleber Mendonça Filho, da qual faz parte, mas em Cannes. “É maravilhoso ver a cultura brasileira receber esse reconhecimento”, diz o ator, que nasceu na França, filho de mãe franco-espanhola e pai brasileiro, e foi criado no Brasil, entre São Luís (MA) e Brasília ( D.F.).
Na capital do país, onde teve a oportunidade de gravar a série Felizes para sempre?dirigido por Fernando Meirelles e tendo como cenário o Plano Piloto, Antonio Saboia viveu os melhores anos de sua infância. Na entrevista a seguir, o ator comenta seus trabalhos recentes e revela os locais que costuma frequentar no Distrito Federal. “Além da cidade, há uma nostalgia do tempo”, revelou.
Entrevista / Antonio Saboia
Como surgiu essa oportunidade de interpretar Marcelo Rubens Paiva em Eu ainda estou aqui?
Deserto privado tinha acabado de ser lançado e ouvi rumores de que Walter Salles tinha gostado muito do filme. Eu sabia que ele estava em pré-produção de seu próximo longa, consegui pegar o e-mail dele e mandei uma mensagem para ele. Ele me respondeu no mesmo dia, me convidando para tomar um café na Livraria Argumento, no Leblon. Fui sem muita expectativa, mas no final da conversa ele me entregou um roteiro dizendo que gostaria que eu interpretasse o Marcelo. Ele me pediu para ler o roteiro e pensar no caso, mas, claro, concordei na hora!
Como era estar em uma produção Eu ainda estou aqui?
Trabalhar com Walter Salles era um sonho antigo. Fazia 12 anos que não voltava à ficção e foi uma sensação maravilhosa ser recebido com tanto carinho por ele. Quando descobri que chamaria Fernanda Montenegro de mãe, fiquei em êxtase.
E como foi estar ao lado de Fernanda Montenegro com tanta intimidade no palco?
Além do óbvio, que é o privilégio de trabalhar com a Fernanda Montenegro, foi um momento extremamente especial para mim. Pelo total comprometimento com a arte, pela humildade, pelo carinho com que cerca todos no set, e também porque, em uma cena de troca íntima entre mãe e filho, me perdi na personagem e me conectei com a minha. mãe, que perdi há 12 anos. Fernanda Montenegro me deu esse presente, de poder, por um momento, sentir minha própria mãe. Isso ficará para sempre.
Como você se sente agora que o filme marcou seu lugar na história do cinema mundial?
É maravilhoso ver a cultura brasileira receber esse reconhecimento. O cinema brasileiro esteve muito bem representado em Veneza, com cinco filmes, sendo quatro dirigidos por mulheres. Alma do Deserto, de Mônica Taboada Tapia, que venceu o Leão Queer; Manas, de Mariana Brennand, que ganhou o prêmio de direção no Giornate; Petra Costa com o documentário Apocalipse nos Trópicos; e Moara Passoni com Minha mãe é vaca. Ganhamos o prêmio de Melhor Roteiro por Ainda estou aqui, o que evidencia ainda mais a importância de falar sobre a ditadura, principalmente num momento de fortalecimento da extrema direita.
Você atua em filmes e séries com forte viés político e já afirmou que gosta dessa função da arte. Isso é uma bandeira que você carrega? Você acredita que o corpo e a voz do artista são essencialmente políticos?
Acredito que, de certa forma, tudo é político e que algumas histórias precisam ser contadas. Mas não creio que devamos limitar-nos a contar apenas histórias politicamente engajadas ou edificantes. É importante contar todos os tipos de histórias, em todos os estilos, todos os gêneros.
A série Rotas do ódio revela uma realidade brasileira triste e revoltante. O que você acredita que o país precisa evoluir para sair desse mapa de violência contra quem é diferente?
Ainda temos um longo caminho a percorrer. É lindo ver algumas pessoas se esforçando para desconstruir ideias pré-concebidas e evoluir em direção a uma nova visão de mundo. Paralelamente, há uma revolta da extrema direita em todo o mundo, movida pelo medo deste movimento e pela possibilidade de perda de privilégios. Isto se mistura com uma crise econômica constante, questões endêmicas de corrupção e o clima de notícias falsas, fazendo com que muitas pessoas recorram ao que lhes é familiar, apegando-se ao tradicionalismo e a todas as suas questões estruturais que prejudicam a todos. O que não podemos fazer é voltar atrás; é necessário continuar progredindo. Parte dos avanços que alcançamos e que foram interrompidos em 2016 estão retomando seu curso.
Apesar de ter nascido na França, você também se considera maranhense…
Em relação à dupla nacionalidade, há uma tendência a simplificá-la de forma binária, o que faz parte de um mecanismo de imposição de identidade: você é uma coisa ou outra. No entanto, esta questão nem sempre é clara. Ouvi aqui a vida toda: “Você é francês, nasceu na França”, apesar de ter pai brasileiro e da minha história pessoal. Cheguei ao Brasil com 3 anos e foi aqui que me entendi como pessoa, tive minhas primeiras interações conscientes e minhas primeiras lembranças do mundo. Apesar de sempre me referir como franco-brasileiro ou, como dizia meu pai, como “franco-maranhense”, houve momentos em que rejeitei profundamente a França, pensando que precisava escolher entre os dois. Existe também uma curiosidade, um certo encantamento ou rejeição pelo que é diferente e exótico, que o leva a se tornar uma projeção das fantasias alheias. No Brasil, só faço Nordeste em projetos de amigos no Maranhão, onde passei parte da minha infância. No eixo Rio/São Paulo, sou chamado para jogar no Sulista, porque sou branco. Na França, eu sou o latino. Na verdade, somos a soma das nossas vivências, vivências e daquilo que nos fala de forma profunda.
Quais as maiores e melhores lembranças que você tem de Brasília? Onde você gosta de ir quando vem à cidade?
Fiquei entre Brasília e São Luís dos 3 aos 9 anos. Tive uma vida social muito agitada quando moramos em Brasília. Íamos todo fim de semana na casa dos nossos tios, tias e amigos. As crianças bagunçando, os adultos conversando e o choro como trilha sonora ao fundo. Lembro-me das idas à Água Mineral, dos pastéis e do caldo de cana, das locadoras onde passávamos horas escolhendo filmes. Além da cidade, há uma nostalgia da época. Quando vou a Brasília, costumo dar uma volta pelos quarteirões por onde passei, da Asa Sul à Asa Norte, passando pelo Guará. E aquele céu de Brasília, que é uma coisa linda! Da última vez fui passar a tarde na Água Mineral com meu irmão, foi uma viagem no tempo. Eu não voltava desde a infância.
Você tem um rosto com presença marcante em diversas produções cinematográficas. Agora, vai ao ar em uma novela das 21h. Era seu objetivo ocupar esse lugar também?
Fiquei muito feliz fazendo essa novela, estive com um grupo de pessoas muito queridas. E é um privilégio estar numa novela de João Emanuel Carneiro. Meu objetivo era, sim, voltar a fazer novelas também. Acredito que é importante transitar entre cinema, TV e teatro. São formas de trabalhar completamente diferentes e todas, à sua maneira, enriquecem a experiência do ator.
Em entrevista ao Correio, em 2018, você afirmou que queria participar de uma novela inteira. Ainda não foi desta vez, mas você acredita que esse convite acontecerá agora?
Olha, espero que sim, esperemos! (risada)
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