O terceiro dia da Mostra Competitiva Nacional do 57º Festival de Brasília de Cinema Brasileiro começou com os curtas-metragens Dentro do marda pernambucana Lia Letícia, e Confluênciasda diretora e professora de audiovisual da UnB Dácia Ibiapina. Para encerrar a noite, a tela do Cine Brasília exibiu o longa mineiro Yõg Ãtak: Meu Pai, Kaiowádireção de Sueli Maxakali, Isael Maxakali, Roberto Romero e Luisa Lanna.
O curto Dentro do marde Lia Letícia, gira em torno do personagem Preto Sérgio e suas preocupações internas e externas com a vida. Presente no nome da produção, o mar também é cenário central do curta-metragem pernambucano.
A obra é essencialmente um documentário. Porém, ele trabalha a história de uma forma diferente e experimental. “Meu filme trata poeticamente da vida do personagem Preto Sérgio. Propomos visual e sonoramente algo diferente das narrativas documentais”, explica o diretor, que também é artista.
Lia comemora a possibilidade de um filme diferente ter espaço em um evento do porte do festival de Brasília. “É importante estar em um festival tão significativo para todo o Brasil, mas é uma janela crucial para podermos mostrar esses filmes que trazem um pouco do que é o cinema: a experimentação desde o início”, afirma o diretor. “É importante que o cinema proporcione novas linguagens ao público brasileiro”, destaca.
No dia em que completa um ano da morte de Antônio Bispo dos Santos, popularmente conhecido como Nêgo Bispo, a Mostra Competitiva Nacional exibe o curta-metragem de Brasília Confluênciasque tem como protagonista o filósofo, ativista e líder quilombola. A obra de Dácia apresenta modos de festejar e estilos de vida do quilombo Saco-Curtume, na zona rural de São João do Piauí.
Com título oriundo do conceito criado por Nêgo Bispo, Confluências permite ao espectador uma reflexão interna e coletiva baseada nos ensinamentos do protagonista, que compartilha conhecimentos, conceitos e experiências ancestrais. “Quem assiste ao filme tem acesso a essa figura, a esse mestre do conhecimento quilombola e ao seu pensamento”, afirma Dácia Ibiapina.
O diretor destaca ainda a importância do Festival de Cinema Brasileiro de Brasília como ação de promoção do audiovisual local e nacional, e como espaço de intercâmbio entre o público e os agentes culturais. “Só de chegar aqui já sentimos um clima de encontro, conversa, alegria, celebração. E isso é muito importante para a cidade”, destaca.
Escolhido para compor a categoria longa-metragem do terceiro dia da Mostra Competitiva Nacional, Yõgãtak: Meu Pai, Kaiowá See More acompanha a jornada da cineasta Sueli Maxakali em busca de seu pai desaparecido durante a ditadura militar, Luis Kaiowá. Paralelamente, o filme aborda as lutas enfrentadas pelos povos indígenas Tikmu’un e Kaiowá em defesa de territórios e modos de vida.
“Quando meu pai foi embora, eu tinha apenas 6 meses. Os policiais da ditadura obrigaram ele (o pai) a trabalhar e ele não recebeu nada por isso”, confessa o diretor do Yõgãtak: Meu Pai, Kaiowá See More. Depois que o pai de Sueli foi levado embora, ela não tinha dinheiro para ir até o patriarca, o que a obrigou a se comunicar com ele apenas por telefone.
Graças ao filme, a cineasta finalmente pôde rever o pai alugando, junto com outros parentes, uma van para filmar onde estava o protagonista. Para Sueli, o filme também serve como ferramenta para ajudar os indígenas na luta por suas terras ancestrais: “Estamos sob pressão, mas esperamos melhorar. Cada vez que vejo meu povo sendo assassinado é uma dor que carrego porque é meu sangue. É uma cicatriz que levarei para o resto da vida”, confessa, com lágrimas nos olhos.
“Foi uma luta para minha mãe. Ela cuidou de mim e da minha irmã. Ela (a mãe) trabalhava com enxada para cuidar da gente. E para nós (indígenas) a ditadura não acabou porque a violência contra nós ainda existe”, destaca. Através do marido, que é cineasta, Sueli começou a fazer experiências com a câmera, estudou e produziu algumas obras audiovisuais. Além de ser candidata de longa data à Mostra Competitiva Nacional do Festival de Brasília, a obra Esta terra é nossa foi exibido em eventos cinematográficos nos EUA e no México.
Emocionante e lotado
O terceiro dia da Mostra Competitiva Nacional lotou mais uma vez o Cine Brasília. As equipes de produção demonstraram alegria, gratidão e emoção ao compartilhar as histórias dos personagens. O público emocionou-se com os temas escolhidos e os aplausos foram a palavra de ordem do início ao fim.
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