Setor responsável por 4% do Produto Interno Bruto, com faturamento anual de quase R$ 250 bilhões em 2023, a indústria mineral defende um tratamento condizente com a importância que tem para a economia e a sustentabilidade brasileira. Existem, no entanto, obstáculos internos e externos à melhoria da mineração. A insegurança jurídica, as distorções fiscais e as falhas regulatórias impedem o país de se tornar mais competitivo num segmento estratégico para o desenvolvimento económico nacional, segundo representantes do sector.
Esse foi o panorama analisado ontem no seminário CB Debate: Segurança jurídica e competitividade da mineração brasileira, realizado pelo Correio Braziliense, em parceria com o Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram).
As dificuldades do sector mineiro envolvem questões regulatórias, fiscais e jurídicas. O presidente do Ibram, Raul Jungmann, alertou sobre o problema da burocracia para empresas do setor obterem licenças ambientais para exploração mineral. Ele também citou litígios no exterior relacionados a ações movidas por acidentes ambientais ocorridos no Brasil. Esses processos “poderão quebrar as empresas brasileiras do setor mineiro”, alertou.
O líder do Ibram também manifestou oposição à cobrança de imposto seletivo sobre a mineração, tema que está em pauta na regulamentação da reforma tributária no Congresso Nacional. Segundo ele, o Brasil vai na contramão da demanda global. “Enquanto o mundo inteiro procura minerais estratégicos, vamos colocar um imposto sobre o consumo no topo? É isso? Vamos colocar um imposto seletivo no exato momento em que a Agência Internacional de Energia diz que tínhamos 320 bilhões de dólares mercado no ano anterior e US$ 1 trilhão em 2030. Esse é o jogo?” ele perguntou.
Jungmann destacou que a agenda de reindustrialização do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) precisa olhar melhor para o setor mineral. “O Brasil não pode perder a oportunidade de colaborar consigo mesmo e com o mundo. Não há nova indústria brasileira sem minerais. Importamos 95% do nosso potássio e fósforo (usados em fertilizantes). (O país) é um gigante com pés de barro e precisamos ampliar a exploração de minerais estratégicos”, afirmou.
Avanços e desafios
Um dos palestrantes do evento, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes, abordou a evolução da exploração mineral, com o surgimento de novos desafios. “A exploração mineral deixou de ser uma mera utilização de um bem público para adquirir outras dimensões que representem um catalisador do desenvolvimento local e regional. No entanto, os estados depararam-se com outros elementos adicionais”, afirmou o reitor do Supremo Tribunal.
“Da mesma forma que evoluiu a segurança jurídica aplicável à exploração mineral, as questões relacionadas com a preservação ambiental, os direitos dos povos tradicionais e das comunidades locais adquiriram uma nova dimensão, representando interesses legítimos dignos de proteção jurídico-administrativa”, destacou.
Gilmar Mendes também mencionou o problema dos processos judiciais contra empresas brasileiras em tribunais de justiça no exterior. Este tema também é visto com preocupação por representantes do setor mineiro e especialistas em comércio exterior.
Competitividade
Do ponto de vista econômico, a insegurança jurídica é um dos problemas que contribuíram para a desindustrialização do país, na avaliação do diretor de Relações Institucionais da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Roberto Muniz. Ele defende medidas para evitar que o Brasil perca espaço na economia global. “Segurança Jurídica é a competitividade da mineração brasileira”, frisou, num trocadilho com o nome do evento.
Muniz reconheceu que houve avanços no marco legal da mineração, mas destacou que a burocracia ainda é um problema recorrente no setor. Uma das dificuldades é a morosidade das licenças ambientais, incentivando a ilegalidade e afastando investidores.
“A possibilidade de investimento privado também está cada dia mais difícil por causa dessa burocracia. Se não encontrarmos uma solução para isso, viveremos nessa insegurança jurídica”, disse Muniz.
Reduzir a carga tributária e garantir celeridade nos processos de licenciamento ambiental também são desafios do setor mineral, na avaliação do vice-presidente executivo de Assuntos Corporativos e Institucionais da mineradora Vale, Alexandre D’Ambrosio.
“A percepção no mundo é que não temos segurança jurídica no Brasil e, no caso da mineração, as duas questões que mais nos afetam são a tributação e, no nosso caso, o licenciamento ambiental”, considerou.
“A mineração responsável busca respeitar o meio ambiente. Somos referência no mundo em mineração de forma sustentável, mas temos muitas dificuldades para obter licenciamento. Levamos de 3 a 4 anos para obter licenciamento, temos dificuldade com Ibama e ANM ( Agência Nacional de Mineração), inclusive porque agentes e fiscais são criticados e correm o risco de serem processados pela emissão de licença”, acrescentou o executivo.
De Londres, a presidente do Conselho de Administração do Ibram, Ana Sanches, destacou em vídeo o potencial do Brasil na exploração de minerais essenciais para a transição energética. “Ao investir na agenda de energia limpa, podemos nos consolidar como um dos maiores fornecedores globais de minerais críticos e estratégicos. Trabalhamos para deixar um legado positivo de desenvolvimento social e tecnológico, contribuindo fortemente para a produção de energia limpa”, ela disse.
Na abertura do seminário, o presidente do Correio Braziliense, Guilherme Machado, destacou o interesse do veículo em estimular a reflexão sobre temas relevantes para a vida nacional. “Entendemos que é responsabilidade dos Diários Associados proporcionar um diálogo maduro, inteligente e propositivo entre a sociedade civil, os agentes económicos e os poderes constituídos”, destacou.
(Rosana Hessel, Rafaela Gonçalves, Fernanda Strickland, Luana Patriolino, Mayara Souto, Raphael Pati)
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