Em conferência anual do Banco Central (BC), ex-presidentes da autoridade monetária criticaram a política fiscal do governo Lula e manifestaram preocupação com o déficit nas contas públicas. A mesa, que teve como tema os 30 anos do Plano Real, tratou do recorrente aumento de despesas que dificultam o controle da inflação e obrigam os juros a permanecerem em patamar elevado.
Todos eles, que em 2022 apoiaram a candidatura do presidente Luíz Inácio Lula da Silva, destacaram que o problema dos rombos orçamentários existe desde o câmbio, em 1994, e continua até hoje. “É lamentável que não tenhamos conseguido resolver a questão tributária. Um dos grandes marcos foi a Lei de Responsabilidade Fiscal, uma lei pioneira, que foi minada ao longo do tempo por interpretações absurdas”, disse Gustavo Loyola, que assumiu o BC em 1995, ano seguinte ao lançamento do Real.
“O Brasil precisa de uma política fiscal que seja primária à política monetária, para controlar a inflação. É aqui que, de facto, estamos endividados e precisamos urgentemente de resolver esta questão”, acrescentou Loyola. O déficit nas contas do governo atingiu R$ 230,5 bilhões no ano passado, o segundo pior da série histórica iniciada em 1997, déficit agravado pelo pagamento de precatórios, adiados pelo governo Bolsonaro.
Pérsio Arida, que fez parte da equipa económica que desenhou e implementou o Real, afirmou que o tripé macroeconómico “hoje é manco”: “A nossa perna fiscal sofreu uma deterioração longa e contínua e as perspectivas não são boas”.
O plano que colocou em circulação a moeda até hoje conhecida pelos brasileiros, o real, surgiu como remédio para combater a hiperinflação, que chegou a 2.000% na década de 1980. O economista Pedro Malan, que além de presidir ao município também foi ministro das Finanças (1995-2003), destacou que a consolidação da vitória sobre o país não acabou.
“O objetivo de ancorar as expectativas de inflação exige um discurso coerente e a sociedade precisa saber que a intenção de estabilização é forte e que será perseguida com tenacidade. Essa reação foi fundamental no caso do Real e é fundamental para qualquer tentativa de crescimento com estabilização da economia”, destacou. Para ele, uma política fiscal vista como insustentável pode acabar tornando ineficaz o regime de metas de inflação.
Sufocamento financeiro
Também crítico da política fiscal, o atual presidente do BC, Roberto Campos Neto, desta vez evitou comentar o assunto e limitou-se a defender a autonomia. Segundo ele, o município sofre atualmente de “asfixia financeira e administrativa”, o que dificulta o seu trabalho. “Vejo isso como um grande problema, um dos grandes desafios. Se por um lado tivemos ganhos institucionais, alguns problemas crónicos não foram resolvidos”, destacou.
A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da autonomia financeira do BC tramita no Congresso Nacional.
Sob controle
Após o evento, questionado por jornalistas, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, avaliou que a inflação no país está “bastante controlada” e que será possível fazer a taxa convergir para a meta de 3% ao ano. “No Brasil, a inflação sempre esteve na casa dos dois dígitos. Não vamos ver isso acontecer, vamos trazer a inflação para a meta”, disse o chefe da equipe econômica, que se comprometeu com o controle fiscal.
“A inflação este ano será menor que a do ano passado. O do ano passado foi muito inferior ao do ano anterior, especialmente tendo em conta as distorções causadas pelo populismo da redução dos impostos sobre os combustíveis, que teve um efeito perverso nas contas públicas”, acrescentou.
Quanto ao cumprimento da meta de zerar o déficit primário, diante das suspeitas, o ministro manteve o compromisso de perseguir a meta fiscal. “A disciplina vai continuar. Continuaremos interagindo com o Judiciário, com o Legislativo, em torno desse pacto pelas contas públicas.
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