O hidrogênio verde (H2V) representa uma grande oportunidade para o Brasil se tornar referência, não só neste mercado, mas também em outras frentes da transição energética. Dotado de recursos naturais e de matriz predominantemente renovável, o país vem despertando o interesse de investidores estrangeiros, especialmente da Europa, destacaram especialistas no CB Debate de ontem. Contudo, há uma série de gargalos que precisam ser superados, incluindo a falta de infraestrutura, que encarece as operações locais, e a falta de investimento em pesquisa e mão de obra especializada.
Para o diretor de Planejamento do Banco do Nordeste do Brasil (BNB), Aldemir Freire, o mercado H2V traz grandes oportunidades para o Nordeste, pois reúne todas as condições para a produção de energia renovável, além de uma localização privilegiada e estratégica , mais perto da Europa. Ontem, no CB Debate, defendeu que o país precisa garantir que os frutos desta nova indústria tenham impacto social na região “e não deixar que a transição energética verde fique limitada ao grande capital”. Participou, ontem, do evento Hidrogênio Verde: o combustível do futuro, realizado pelo Instituto Cultura em Movimento, com patrocínio do Banco do Nordeste (BNB), Caixa Econômica Federal e governo federal; apoio da Federação das Indústrias do Distrito Federal (Fibra); e suporte de comunicação do Correio Braziliense.
O gerente do Instituto Nacional de Energia Limpa (Inel) Luiz Piauhylino Filho também destacou que o Brasil possui recursos naturais abundantes para liderar o mercado global de hidrogênio verde, contando com ventos, sol forte e hidrelétricas. “O país tem uma oportunidade gigantesca. É um novo momento que estamos vivendo agora. O Brasil precisa fazer o dever de casa, e tem que fazê-lo bem se quisermos aproveitar efetivamente essa oportunidade”, afirmou Piauhylino, em outro painel do CB Debate, ontem.
O especialista alertou que o investimento no hidrogénio é mesmo uma necessidade. Ele estima que 200 GW de projetos de energia renovável no Brasil só serão viáveis se forem destinados à produção de H2V. “Se quiserem servir a inteligência artificial que está a ser exigida, estes projetos não serão sustentáveis”, frisou.
Existem, no entanto, importantes estrangulamentos que o país terá de ultrapassar para colher os benefícios deste sector emergente. Em sua apresentação, Piauhylino demonstrou os desafios práticos. O primeiro é o custo. Cada megawatt (MW) (suficiente para abastecer mil casas) instalado de hidrogénio obtido por eletrólise, método mais utilizado na Europa, custa 2,5 milhões de euros. Além disso, cada quilograma de hidrogénio produzido requer 20 litros de água. Segundo Piauhylino, o Brasil planeja implantar 73 GW de energia renovável para produzir hidrogênio, o que significa cerca de R$ 292 bilhões, o que exigirá investimentos adicionais de R$ 195 bilhões em infraestrutura de transmissão. “Quem vai pagar esta conta?” ele perguntou.
O coordenador de projetos de hidrogênio verde (H2V) da Rede Brasileira de Certificação em Pesquisa e Inovação (RBCIP), Marcelo Fiche, chamou a atenção para outro gargalo: pesquisa e desenvolvimento. Lembrou que, na Alemanha, apenas um instituto de investigação recebe 190 mil milhões de euros só do governo, “além das contribuições do setor privado”. E, em Hamburgo, por exemplo, há seis mil carros movidos a hidrogênio, além de caminhões, trens e postos de gasolina espalhados pela cidade alemã.
Incentivo ao crédito de CO2
O quadro jurídico para o hidrogénio de baixo carbono no mês passado poderia encorajar a regulação do mercado de créditos de carbono. Para a presidente da Associação Brasileira de Crédito de Carbono e Metano (Ab Carbono), Rita Ferrão, o Brasil não pode perder o momento de entrar no mercado de Hidrogênio Verde (H2V), que começa a despontar como uma alternativa direcionada de energia limpa, e os benefícios de investir nesta onda vão além da sustentabilidade e do meio ambiente. Para isso, porém, é fundamental contar com políticas públicas.
“O mercado de carbono precisa sim de regulamentação, para que não aconteça o que vem acontecendo recentemente, com fraudes. Espero muito que o marco legal do hidrogênio acelere a regulação do mercado de carbono”, comentou Ferrão, ontem, no CB Debate, onde foi discutido o tema Hidrogênio Verde: o combustível do futuro. O evento foi realizado pelo Instituto Cultura em Movimento, com patrocínio do Banco do Nordeste (BNB), Caixa Econômica Federal e governo federal; apoio da Federação das Indústrias do Distrito Federal (Fibra); e suporte de comunicação do Correio Braziliense.
O executivo destacou que a produção de H2V terá que desenvolver uma métrica para calcular os créditos de carbono — já que os setores são indissociáveis. Para ela, há uma grande oportunidade econômica para o Brasil nesse setor. “Temos a possibilidade de ser o maior país produtor e exportador de hidrogénio verde. Dessa forma, trazemos recursos, indústrias e empregos. Precisamos saber aproveitar esse momento, sem perder o timing”, disse.
Ferrão defendeu que o combustível pode ajudar a diversificar a economia. Ela lembrou que há estimativas de que, até 2050, esse mercado poderá gerar cerca de US$ 1,4 trilhão em todo o mundo. Comparado a outros países, porém, o Brasil tem uma vantagem – a maior parte de sua matriz energética, cerca de 90%, já vem de fontes renováveis. “Precisamos de políticas públicas assertivas para levar isso adiante. Tudo vai entre empresa, governo e sociedade, gosto de chamar isso de tripé. Tal como acontece com a questão do ambiente, da economia e da sociedade. Não tem como eu chegar aqui e falar só de meio ambiente e ignorar a economia.”
Guerra é alavancagem
O interesse no Hidrogénio Verde (H2V) como combustível pode ter raízes na sustentabilidade, mas o mercado ganhou impulso nos últimos três anos impulsionado por uma preocupação mais visceral: a dependência dos países europeus do gás natural da Rússia, cujo fornecimento foi cortado ao longo dos anos. da guerra com a Ucrânia.
“Vimos, aqui, uma linha do tempo que menciona 2021, 2022 e 2023. Por que esse tema tem uma tração tão forte nesse período? Uma absoluta falta de energia na Europa, com o corte no fornecimento de gás para a Europa, que é absolutamente dependente da Rússia”, explicou, ontem, o presidente da Companhia Energética de Brasília (CEB), Edison Garcia, ao participar do CB Debate, realizado realizado pelo Instituto Cultura em Movimento, com patrocínio do Banco do Nordeste (BNB), Caixa Econômica Federal e governo federal; apoio da Federação das Indústrias do Distrito Federal (Fibra); e suporte de comunicação do Correio Braziliense.
Em 2022, após a invasão em grande escala da Ucrânia pela Rússia, a dependência do gás russo era de até 52% no caso da Alemanha, mas caiu para 17% em 2023. O fornecimento de combustível foi cortado pelo governo de Vladimir Putin em resposta. às sanções impostas após a invasão. Para superar a procura, os países europeus combinaram o armazenamento de gás natural, importado de outros países, e a diversificação da sua matriz.
Dados apresentados por Garcia mostram que o plano estratégico europeu prevê aumentar o uso de fontes renováveis na União Europeia (UE) de 5% para 60% até 2050. Para efeito de comparação, o Brasil já possui cerca de 90% de sua matriz renovável, puxada especialmente por hidrelétricas, mas com participação crescente de energia solar e eólica.
Precisamente por esta razão, o Brasil é um parceiro atraente para os europeus. Garcia provocou, no entanto, que o país precisa de fazer uma escolha importante face a esta oportunidade. “O Brasil é procurado. O Brasil é visto. Eu fazia parte do Conselho de Administração da Petrobras na época, quando falaram sobre o Brasil produzir hidrogênio verde e exportá-lo para a Europa. Mas vamos exportar ou a Europa virá aqui para produzir? Essa é uma das coisas que precisamos avaliar”, disse o CEO do CEB. Esteve na petrolífera entre 2022 e 2023.
Por sua vez, o gerente do Instituto Nacional de Energia Limpa (Inel) Luiz Piauhylino Filho destacou que a guerra entre Rússia e Ucrânia afetou até mesmo o modelo utilizado para produzir o combustível. A rota escolhida pela Europa desde 2018, segundo ele, é a eletrólise, processo que utiliza energia renovável para separar a água em oxigênio e hidrogênio.
“Se quisermos servir o mercado europeu, temos que produzir hidrogénio a partir da eletrólise e fazer um derivado, como o amoníaco, pois o hidrogénio não pode ser transportado em grande escala na forma gasosa ou líquida”, explicou Piauhylino. Como o gás é volátil e corrosivo, ainda não é possível transportá-lo em navios ou gasodutos. Contudo, o especialista reforçou que o Brasil possui diversas alternativas de produção de hidrogênio, como a partir da reforma do etanol, do biogás e da biomassa, o que aumenta o potencial do país neste mercado emergente.
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